Nem bem amanhecia o ano de 2025 e a improvável luta contra a jornada 6×1 se afirmava na agenda política nacional. Através da deputada Erika Hilton (PSOL-SP), em diálogo com o vereador e fundador do movimento Vida Além do Trabalho, Rick Azevedo (PSOL-RJ), ela tomou forma institucional na PEC 08/2025, aprovada na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, agora em dezembro. O país onde, há décadas, a ordem foi flexibilizar e tirar direitos dos trabalhadores, assiste a força desta maioria social raiar de novo na política brasileira.
É preciso dar atenção a isso: a emergência de uma pauta disruptiva e sua conexão com o PSOL. Na atual conjuntura adversa, dificilmente os partidos mais aderentes ao possibilismo podem pautar o Brasil com agendas que conectam uma questão imediata com uma perspectiva emancipatória. Simbolicamente, no 1º de maio, Lula defendeu pela primeira vez o fim da jornada 6×1, quando já estava na rua o Plebiscito Popular Nacional que trazia o tema entre suas questões.
Este pronunciamento de Lula, aderindo a uma pressão social de fora pra dentro, pode ser considerado também um marco na reorientação política do governo. Naquele momento, encurralado pelo Congresso Inimigo do Povo, o governo estava nas cordas. A partir dali, assumiu uma postura de defesa dos interesses populares mais nítida, saindo apenas da resistência democrática para uma luta mais aberta contra a desigualdade, taxando os ricos e isentando os trabalhadores. Os ataques de Trump e a reação a eles também contribuíram para esse encaixe. Certamente, para a realização desse giro a influência do PSOL não foi decisiva, mas, com certeza, a movimentação de Lula criou um efeito legitimatório sobre a linha política que o PSOL vem defendendo para a conjuntura há anos.
Diante da reação do “Centrão” a esta relocalização do governo Lula, o PSOL emergiu como uma força pulsante, já assumindo maior protagonismo, especialmente através da atuação de sua líder, Talíria Petrone (PSOL-RJ). Sua votação unânime contra a PEC da Blindagem, por exemplo, conectou o partido com a avalanche de indignação que tomou o Brasil e desaguaram nos atos de 21 de setembro. Reforçando mais uma tese partidária, qual seja, a de que o governo cresce quando governa à quente, que a mobilização de ruas é parte fundamental da luta política nacional contra a extrema-direita, e os atos de 14 de dezembro fecham o ano apontando neste sentido.
É difícil dissociar a indicação de Guilherme Boulos (PSOL-SP) desse giro de orientação do governo. Vindo do MTST, assumindo um papel protagonista nas jornadas de junho de 2013 e aderindo ao PSOL em 2017, Boulos está sendo tratado abertamente pelo governo como um braço na conexão do governo com os movimentos e demandas populares de uma forma mais à quente. Embora a desistência da candidatura a deputado federal desacumule na luta do partido na busca da superação da cláusula de barreira, sua entrada no Ministério não dilui a autonomia do PSOL, mas coloca um novo desafio ao partido como mediador ativo entre governo, movimentos e conflito social.
Tudo isso, já seria o suficiente para fazer de 2025 um ano importante na trajetória do PSOL. Mas a soma de mais um aspecto o torna extradiordinário: a adesão de Manuela D`ávila e seus companheiros. Conecta o partido a duas dinâmicas absolutamente estratégicas. A luta das mulheres e o Movimento Mulheres em Lutas (MEL) que tornaram Manuela uma das maiores lideranças feministas do país e a possibilidade de um caminho migratório para os socialistas que compõem o campo progressista e apostam em uma alternativa anticapitalista para o Brasil.
O movimento de mulheres e a audiência política feminina são uma potência nacional evidente, emergem da luta contra a violência sexual, os feminicídios, os salários mais baixos, a exclusão de postos de comando e decisão e do fato de sustentarem todo o trabalho não pago do cuidado com lares, crianças, idosos e pessoas com deficiência, sem qualquer reconhecimento. São 6 milhões de mulheres a mais do que os homens no Brasil. Não precisa falar muito mais. Manuela liderou um movimento que se propôs a representar essa maioria social. A força mobilizadora do feminismo ficou muito nítida no diálogo entre Manu e Cíntia Chagas, influenciadora conservadora, vítima de violência de gênero. O feminismo demonstra assim capacidade de disputa ampla na sociedade, possibilitando deslocamentos sociais e políticos em direção ao campo progressista.
A segunda dinâmica, a de abertura de uma rota migratória política em direção ao PSOL, deriva da longa trajetória de Manu na UJS e no PCdoB. Os acertos nos momentos decisivos na história recente da direção majoritária do PSOL, aproximaram o partido do campo progressista. Na medida em que ele cresce institucionalmente sem perder suas fronteiras políticas, militantes e ideológicas, oferece um abrigo para os setores mais à esquerda neste campo. Faz isso sem uma estratégia de confrontação, mas de colaboração sem adesão. Os próximos anos validarão ou não esta hipótese, dependerá de abertura política, generosidade organizativa e capacidade do PSOL de crescer ao mesmo tempo que se reafirmar como opção estratégica.
2025 ainda não acabou, nos reservou depois da filiação da Manu, a derrota da cassação de Glauber Braga (PSOL-RJ) e mais uma grande convocação de manifestações contra o Congresso Inimigo do Povo. No ano que comemora 20 anos, o PSOL dá passos importantes para se consolidar de vez como ferramenta e possibilidade de poder. Como instrumento útil para as maiorias sociais fazerem valer seus direitos. As eleições de 2026 serão um teste importante para verificar e validar ou não estas tendências. A capacidade de manter as ruas e lutas aquecidas são fundamentais para esta consolidação nacional do PSOL. O ano que termina indicou a rota, o que se inicia a colocará à prova.