Uma operação conjunta do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e do Ministério Público do Trabalho (MPT) resultou no resgate de pelo menos 563 trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão em Porto Alegre do Norte, no Mato Grosso. O caso foi revelado nesta quinta-feira 7 e envolve a TAO Construtora, responsável pela construção de uma usina de etanol na região.
A força-tarefa teve início em 20 de julho, após denúncias de más condições de trabalho no canteiro de obras localizado na zona rural do município. A situação se agravou com um incêndio que destruiu parte dos alojamentos e evidenciou a precariedade a que os operários estavam expostos.
Segundo os fiscais, o fogo teria sido provocado por trabalhadores em protesto contra falhas constantes no fornecimento de água potável e energia elétrica. A crise hídrica, agravada pela interrupção no funcionamento dos poços artesianos, levou os operários a tomarem banho com canecas e enfrentar longas filas para usar banheiros sujos.
Condições precárias
Durante a inspeção, as autoridades encontraram dormitórios com apenas 12 m², onde até quatro pessoas dividiam o espaço, sem ventilação nem climatização. A maioria dormia em colchões velhos com apenas um lençol fino, sem travesseiros ou roupas de cama adequadas. Em alguns casos, trabalhadores chegaram a dormir no chão, sob mesas, por falta de camas.
Após o incêndio, os alojamentos masculino e feminino foram destruídos, assim como parte da padaria e a guarita do local. Os caminhões-pipa passaram a buscar água do Rio Tapirapé, mas o líquido oferecido era turvo e impróprio para consumo.
Muitos dos trabalhadores foram realocados para casas e hotéis a cerca de 30 km da obra, mas as condições continuaram precárias. Alguns dormiam no chão, em colchões improvisados, sem estrutura para guardar seus pertences. Parte dos operários perdeu tudo o que possuía no incêndio e precisou ser levada para um ginásio de esportes em cidade vizinha.
O canteiro de obras também apresentava riscos à saúde e segurança. Os operários atuavam em ambientes insalubres, com acúmulo de poeira, sem ventilação e refeitórios inadequados. Foram identificados casos de lesões nos pés e mãos, além de doenças de pele, todas relacionadas à manipulação de produtos sem os equipamentos de proteção exigidos.
Relatos colhidos pelos auditores indicam jornadas exaustivas, com turnos que chegavam a 22 horas seguidas, sem folgas semanais. As horas extras prometidas não eram formalizadas e os pagamentos ocorriam “por fora”, em dinheiro ou cheques, o que configura sonegação fiscal.
A denúncia
O Ministério Público do Trabalho negocia com a empresa um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que prevê pagamento das rescisões, indenizações por dano moral, reembolso das despesas com deslocamento e alimentação, além de uma compensação de 1 mil reais para cada trabalhador pelos bens perdidos no incêndio. Também deverão ser pagos salários “por fora”, férias, 13º salário, FGTS e outras verbas previstas por lei.
O Código Penal brasileiro define como trabalho análogo à escravidão situações em que há submissão a jornadas exaustivas, condições degradantes ou restrição de liberdade por dívidas com o empregador. A TAO Construtora ainda não se manifestou sobre o caso.