O Kremlin criticou nesta quinta-feira (6) as declarações do presidente francês Emmanuel Macron sobre o fortalecimento militar da Europa e o papel da dissuasão nuclear da França. O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, classificou o discurso de Macron como “extremamente confrontador” e afirmou que o líder francês não demonstra interesse pela paz.
“Pelo contrário, pelo que foi dito, pode-se concluir que a França está mais preocupada com a guerra, com a continuidade da guerra”, declarou Peskov.
O governo russo reagiu após Macron afirmar que a Rússia representa uma ameaça direta ao continente europeu e sugerir que a França poderia expandir seu “guarda-chuva nuclear” para proteger aliados na região.
“A Rússia é, no momento em que lhes falo e para os anos futuros, uma ameaça para a França e para a Europa”, disse o presidente francês em pronunciamento à nação na quarta-feira (5). Ele também defendeu o envio de tropas europeias à Ucrânia para garantir o cumprimento de um eventual cessar-fogo.
“Isso talvez passe pelo envio de forças europeias. Elas não iriam lutar hoje, nem para a linha de frente, mas estariam ali, ao contrário, uma vez que a paz fosse assinada, para garantir seu total respeito”, ameaçou o francês.
Moscou rejeitou a proposta e alertou que qualquer movimentação de tropas estrangeiras na Ucrânia seria considerada uma escalada militar inaceitável. O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergei Lavrov, afirmou que Macron está agindo como seus antecessores históricos, mas de forma menos direta.
“Diferentemente de seus predecessores, que também quiseram lutar contra a Rússia—Napoleão, Hitler—o senhor Macron não age com muita elegância, pois ao menos eles foram diretos: ‘Precisamos conquistar a Rússia, precisamos derrotá-la’”, disse o chanceler russo.
A resposta russa também incluiu ataques pessoais ao presidente francês. O ex-presidente Dmitry Medvedev ironizou a fala de Macron e afirmou que sua liderança na França não terá impacto duradouro.
“Micron, por si só, não representa uma grande ameaça. Ele desaparecerá para sempre no máximo até 14 de maio de 2027. E não fará falta”, disse.
A porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Maria Zakharova, sugeriu que Macron deveria medir melhor seu poder militar antes de anunciar novas diretrizes. Em nota oficial, a chancelaria russa declarou que “Paris agora ambiciona se tornar o ‘patrono nuclear’ de toda a Europa, quase como uma substituição ao guarda-chuva nuclear americano. É desnecessário dizer que isso não tornará a França nem seus aliados mais seguros.”
A escalada entre Paris e Moscou ocorre em meio à fragmentação do bloco ocidental e à mudança na política externa dos Estados Unidos após a volta de Donald Trump à Casa Branca.
O governo norte-americano reduziu significativamente o apoio militar à Ucrânia e iniciou negociações diretas com o Kremlin, excluindo os aliados europeus das tratativas sobre o conflito.
O cenário se tornou evidente quandoTrump sugeriu que o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, aceitasse ceder territórios à Rússia para encerrar a guerra. A reaproximação entre Washington e Moscou ampliou o isolamento da União Europeia, que agora busca redefinir sua estratégia de defesa.
Diante dessa nova conjuntura, Macron tem pressionado por uma maior independência militar da Europa. “O futuro da Europa não deve ser decidido em Washington ou Moscou”, declarou. O presidente francês também defendeu um aumento do orçamento militar e a reindustrialização do setor bélico europeu, argumentando que “temos o exército mais eficiente da Europa” e que a França, por possuir capacidades nucleares próprias, deve liderar a defesa regional.
A militarização europeia e a reconfiguração das alianças ocidentais expõem as contradições dentro do próprio bloco imperialista. Enquanto Washington se afasta do conflito, Paris tenta se afirmar como liderança militar, mas enfrenta resistência interna dentro da União Europeia e forte oposição de Moscou.
A resposta do Kremlin à proposta francesa reforça o novo cenário de disputa por influência no continente, com a segurança europeia cada vez mais subordinada a um impasse entre Paris, Washington e Moscou.