O presidente Lula (PT) sancionou com vetos nesta quinta-feira 16, em cerimônia no Palácio do Planalto, o principal projeto de regulamentação da reforma tributária. A proposta, que altera tributos sobre consumo e serviços, será implementada gradualmente até 2033.
O Congresso Nacional aprovou e promulgou a PEC no primeiro ano da gestão petista. Ao longo de 2024, deputados e senadores se debruçaram sobre a regulamentação, detalhando medidas previstas no texto inicial, a exemplo do cashback (devolução de tributos para pessoas de baixa renda), do Imposto Seletivo (o chamado “imposto do pecado”) e da cesta básica nacional.
Em seu discurso, Lula afirmou que a sanção representa um marco para o País e lembrou que a “democracia é a melhor forma de governança”. Além disso, agradeceu pelo empenho dos congressistas na discussão da proposta e disse ser preciso não ter medo de combater as fake news, um dia após o governo recuar em uma portaria da Receita Federal sobre fiscalização de transações.
“Não temos que ter medo de enfrentar a mentira. Não temos que ter medo de enfrentar essas pessoas travestidas de políticos que tentaram dar um golpe. Não temos que ter medo dessas pessoas que fazem fake news“, defendeu o petista. “Se a gente perder o sistema democrático, a gente está correndo risco no mundo inteiro.”
Na prática, a reforma tributária adota no Brasil um sistema de tributos utilizado em diversos países, baseado em um Imposto sobre Valor Agregado. O IVA unifica tributos e facilita a tributação — com ele não ocorre cumulatividade de impostos.
No caso brasileiro esse imposto será dual, com a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal, que unificará os atuais PIS, Cofins e IPI; e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), uma junção do ICMS estadual e do ISS municipal. Há ainda o Imposto Seletivo, aplicado para desestimular o consumo de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.
Em 2025, não haverá recolhimento dos novos tributos. Será uma etapa de experimentação na qual as notas fiscais indicarão uma alíquota-teste da CBS e do IBS, mas sem cobranças. O regime passará por uma transição gradual a partir de 2026, até começar valer integralmente em 2033.
A alíquota-teste possibilitará a adaptação de contribuintes e governos ao novo sistema de “split payment“, mecanismo de pagamento no qual a tributação é dividida em diferentes partes, de forma automática e instantânea.
No caso das empresas, segundo a Secretaria Extraordinária para a Reforma Tributária, será preciso emitir o documento fiscal com o valor da CBS (com alíquota de 0,9%) e do IBS (com alíquota de 0,1%). Contudo, esses tributos não precisarão ser recolhidos. O governo quer apenas testar se o sistema de cobrança funciona.
Ao discursar na abertura da cerimônia, o secretário extraordinário da reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, afirmou que as mudanças representam uma “revolução no sistema tributário brasileiro”. “Estamos falando no aumento da renda, em um prazo de 10 a 15 anos, aumento da renda maior de 10% além do que cresceria o PIB de todos brasileiros, por conta dessa reforma tributária aprovada.”
Para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), é a reforma “possível de ser feita”. “Enquanto há muitas pessoas fazendo discurso e tendo engajamento através de premissas falsas da desinformação e da inverdade, há pessoas trabalhando para que este País possa superar suas dificuldades, com a sanção da dívida dos estados, da reforma tributária.”
O Ministério da Fazenda ainda precisa aprovar o projeto de lei que cria o Comitê Gestor do IBS. Ficam pendentes também o envio de outras propostas que tratam do tema, a definição das alíquotas do Imposto Seletivo e a regulamentação dos fundos criados pela reforma.
A pasta comandada por Fernando Haddad (PT) também deve elaborar normas para disciplinar o IBS e a CBS. O ministro disse a jornalistas na quarta-feira que os vetos de Lula são “técnicos”, não alteram o mérito do que foi decidido pelos parlamentares e têm como foco evitar a judicialização com interpretações dúbias no texto aprovado pelo Congresso.
Haddad, em discurso no evento desta quinta, afirmou que a reforma será o maior legado do terceiro mandato do petista. “Só tem seis países com um sistema tributário pior que o brasileiro. Não é possível avançar na economia sem essa reforma”, disse. “É uma honra ter servido até aqui ao seu governo. Toda a Esplanada se conduziu no mesmo rumo, tornar essa reforma real.”
O Congresso Nacional ainda poderá derrubar os vetos de Lula, em uma sessão conjunta de deputados e senadores.
Entre outraos pontos, o texto sancionado prevê uma lista de cesta básica com 26 itens de alimentação com isenção total de imposto sobre consumo. Entre eles, arroz, feijão, farinhas, café, mate, sal, açúcar, carnes e queijos. O projeto ainda traz uma lista de produtos com alíquota reduzida em 60%, a exemplo de frutas, sucos naturais, crustáceos e mel.
No caso de imóveis, haverá a alíquota reduzida para o setor imobiliário em 50%. Lula manteve um trecho que beneficia uma empresa de refino de petróleo na Zona Franca de Manaus. A previsão foi acrescida pelo relator no Senado, Eduardo Braga (MDB-AM), e o relator na Câmara, Reginaldo Lopes (PT-MG), manteve o benefício.