Lula no G7

por Maria Luiza Falcão

A convite do governo do Canadá que sediará a cúpula do G7 de 2025, Lula viajou na manhã desta segunda (16) com destino a Kananaskis, na província de Alberta.

O mundo está à beira de um colapso ambiental, mergulhado em tensões geopolíticas graves e tentando — como pode — garantir energia, alimentos e estabilidade. Nesse tabuleiro global, o presidente Lula não é apenas um convidado de honra na reunião do G7. É peça estratégica.

O G7 é composto pelas sete maiores economias avançadas do mundo ocidental – com exceção do Japão -, representando cerca de 46 % do PIB global. São elas:

  • Canadá (país anfitrião)
  • Estados Unidos
  • Reino Unido
  • França
  • Alemanha
  • Itália
  • Japão
  • União Europeia como observadora/integrante permanente,

“democracias ditas liberais” industrializadas e detentoras de alto PIB per capita.

Não fazem parte do G7 nem China nem Rússia.

A Rússia chegou a participar do grupo, formando o G8 entre 1997 e 2014. Foi expulsa em 2014 após a anexação da Crimeia, considerada ilegal pelo direito internacional.  As ações militares e a ruptura com os princípios de soberania e diplomacia pacífica motivaram sua exclusão. Desde então, o G8 voltou a ser G7 e o relacionamento com a Rússia deteriorou-se ainda mais após a invasão da Ucrânia em fevereiro de 2022.

Apesar de ser a segunda maior economia do mundo, a China nunca integrou o G7 por vários motivos alegados pelos membros do seleto grupo:

  1. Sistema político autoritário: O G7 se define também “por valores democráticos e direitos humanos”, e acreditam que a China não compartilha.
  2. Diferenças estratégicas e ideológicas: O país é visto como rival sistêmico, especialmente pelos EUA e UE.
  3. Modelo de desenvolvimento distinto: A China ainda era uma economia em desenvolvimento quando o G7 foi criado em 1975. Seu crescimento rápido ocorreu após a consolidação do grupo.
  4. Choques geopolíticos recentes: Tensões comerciais, questões de direitos humanos (como Hong Kong, Xinjiang) e disputas no Indo-Pacífico dificultam uma aproximação.

Nesse contexto, China e Rússia optaram por blocos alternativos como o BRICS (com Brasil, Índia e África do Sul), que propõem uma ordem multipolar e maior representação do Sul Global. Hoje o G20 é o grupo que efetivamente reúne todas as grandes economias (inclusive China e Rússia), servindo como um espaço mais plural que o G7.

Criado em 1975 o G7 completa este ano 50 anos.

Lula vai à cúpula

Além do Brasil foram convidados para a cúpula de Kananaskis líderes da África do Sul, Austrália, Coreia do Sul, Emirados Árabes Unidos, Índia, México e dirigentes de organismos internacionais: ONU, Banco Mundial, Comissão Europeia e Conselho da União Europeia. 

A reunião do G7 que acontece a partir de hoje (17) tem na pauta temas pesados e controversos: guerras no Oriente Médio entre Israel e Palestina que se converteu em um genocídio horrendo na faixa de Gaza, de Israel contra o Irã com beneplácito dos EUA, entre Rússia e Ucrânia/OTAN/EUA; inteligência artificial; energia limpa e minerais críticos. Só isso já seria o bastante. Mas há mais em jogo.

O mundo quer soluções — e o Brasil tem o que dizer

Lula chega ao encontro com duas credenciais que pesam: preside os BRICS em 2025 e será o anfitrião da COP30, a conferência do clima mais importante da década, marcada para novembro em Belém. Isso dá ao Brasil uma voz que ninguém pode ignorar.

Enquanto as potências buscam alternativas ao petróleo e formas de conter o aquecimento global, o Brasil aparece como um dos poucos países com ativos reais para uma transição energética justa: sol, vento, biomassa, matriz energética limpa e uma das maiores florestas do planeta.  Lula deve usar o palco do G7 para vender o “passaporte verde” do país.

 Ele vai cobrar dos países ricos compromissos financeiros concretos para a preservação da Amazônia e dos biomas tropicais. Não dá mais para viver de promessas enquanto os extremos climáticos se tornam o novo normal.

Lula, o “equilibrista” geopolítico

Mas não é só de clima que vive a diplomacia. A presença de Lula simboliza uma tentativa de costurar pontes num mundo em frangalhos. Enquanto Europa e Estados Unidos endurecem o tom contra a Rússia e se rearmam diante da China, Lula aposta em um diálogo multilateral mais equilibrado — e o faz com autoridade de quem já se reuniu com Putin, Xi Jinping, Macron e Zelensky no mesmo ano.

Essa postura — que desagrada os falcões de ambos os lados — devolve ao Brasil uma posição de relevância que havia sido apagada nos últimos anos. O país volta a ser ouvido. E, num mundo que parece surdo à diplomacia, isso é muito.

Preparando o caminho para o BRICS e a COP30

O G7 é só a primeira parada. No mês seguinte, Lula será anfitrião da cúpula dos BRICS, no Rio de Janeiro. Em novembro, abre as portas da Amazônia para o planeta discutir o futuro climático.

Ou seja: o Brasil está no centro do tabuleiro global. O G7 serve como palco de lançamento dessa agenda. Se Lula souber aproveitar o momento — e tudo indica que saberá — o país pode sair da posição de coadjuvante para a de articulador-chave de uma nova ordem mundial: mais verde, menos armada e mais cooperativa.

No fundo, é disso que o mundo precisa. E é isso que Lula leva na mala.

Maria Luiza Falcão Silva é economista (UFBa), MSc pela Universidade de Wisconsin – Madison; PhD pela Universidade de Heriot-Watt, Escócia. É pesquisadora nas áreas de economia internacional, economia monetária e financeira e desenvolvimento. É membro da ABED. Integra o Grupo Brasil-China de Economia das Mudanças do Clima (GBCMC) do Neasia/UnB. É autora de Modern Exchange-Rate Regimes, Stabilisation Programmes and Co-ordination of Macroeconomic Policies: Recent experiences of selected developing Latin American economies, Ashgate, England/USA. 

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Last Update: 17/06/2025