O encontro entre Lula e Macron, nesta quinta-feira (5), em Paris, marcou o início da viagem oficial do presidente brasileiro à França. A visita marca uma reaproximação entre os dois países, após um período de desentendimentos provocados durante o governo Bolsonaro. O momento foi escolhido a dedo: 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, reforçando o alinhamento na pauta climática e na proteção da Amazônia.
“Esta visita de Estado é a primeira que um mandatário brasileiro faz à França em 13 anos”, lembrou Lula. “Algumas vertentes do relacionamento bilateral enfraqueceram-se nesse período, como o diálogo político e o comércio”.
A retomada das relações teve início com o telefonema de Macron a Lula, logo após a eleição do brasileiro, em 2022. Em 2024, o presidente francês fez uma visita oficial ao Brasil. Agora, com mais de 20 novos acordos bilaterais assinados nesta quinta-feira, Lula pode afirmar: “Minha presença aqui em Paris consolida essa reaproximação”.
Em suas redes sociais, ambos os presidentes celebraram o encontro. Enquanto Lula afirmou sua “gratidão a acolhida do presidente e do povo francês”, Macron, em português, agradeceu o brasileiro “pela sua visita e pela sua amizade”.
É uma grande honra representar, mais uma vez, o Brasil em uma Visita de Estado à França.
Recebo com gratidão a acolhida do presidente @EmmanuelMacron e do povo francês.
Brasil e França compartilham laços históricos e valores que nos unem: a defesa da democracia, o respeito ao… pic.twitter.com/24ZhZjPM9f
— Lula (@LulaOficial) June 5, 2025
Caro @LulaOficial, obrigado pela sua visita e pela sua amizade. De Brasília a Paris, de Belém a Nice, o Brasil e a França atuam juntos pelos povos e pelo planeta com uma mesma visão: o futuro se constrói juntos. pic.twitter.com/DTxcv8bFGS
— Emmanuel Macron (@EmmanuelMacron) June 5, 2025
Mercosul
Em seu discurso à imprensa, ao lado de Macron, Lula tratou de diversos pontos em comum entre os dois países. Um deles foi o acordo com o Mercosul.
“Quero lhe comunicar que não deixarei a presidência do Mercosul sem concluir o acordo com a União Europeia”, declarou. “Portanto, meu caro, abra o seu coração para a possibilidade de fazer esse acordo com o nosso querido Mercosul. Essa é a melhor resposta que nossas regiões podem dar diante do cenário de incertezas criado pelo retorno do unilateralismo e do protecionismo tarifário.”
Atento, Macron defendeu a criação de protocolos adicionais para proteger os agricultores franceses. “Temos que melhorar, aprimorar o acordo, trabalhar para termos cláusulas de salvaguarda”, disse. O brasileiro rebateu, afirmando que “não está difícil fazer o acordo”, e disse que irá colocar fazendeiros dos dois países para conversar.
Lula também lamentou a retração das trocas comerciais entre Brasil e França: “Não é possível que os valores registrados em 2024, 9 bilhões de dólares, sejam inferiores aos observados em 2012″. E reforçou a importância do encontro empresarial agendado para sexta-feira (6). Segundo ele, a reunião “é um passo para corrigir isso, atrair mais investimentos e integrar cadeias produtivas”.
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Defesa, ciência e soberania
Lula ressaltou a cooperação das duas nações em projetos de alta complexidade tecnológica e estratégica. “O Brasil desenvolveu com a França importantes projetos bilaterais em áreas de ponta, como o Satélite Geoestacionário de Comunicações e o supercomputador Santos Dumont”, destacou o presidente.
Essa parceria encampa o Prosub, o Programa de Desenvolvimento de Submarinos, que até a próxima década terá lançado 5 dessas embarcações no Brasil, uma deles nuclear. “É a maior iniciativa de cooperação em defesa já empreendida por nosso país”, lembrou. “Seu legado é o de garantir a soberania brasileira sobre nosso vasto espaço marítimo além de construir um dos estaleiros mais modernos no mundo em Itaguaí, no Rio de Janeiro.”
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Relação amazônica
A relação amazônica – lembrando que a Guiana Francesa é um departamento francês ultramarino – entre os dois países também foi destacada. “Como vizinhos que compartilham extensa fronteira amazônica, apostamos nos benefícios da integração”, ressaltou Lula. Essa aposta culminou na reativação do Centro Franco-Brasileiro da Biodiversidade Amazônica, que financiará pesquisas conjuntas já a partir de 2025.
A cooperação inclui ainda segurança e proteção ambiental. “Integrar também implica coordenar esforços para combater o tráfico, o garimpo ilegal e o desmatamento. Esse é o espírito do Acordo assinado hoje pela Polícia Federal e sua contraparte francesa”, completou o brasileiro.
Macron lembrou que Brasil e França são “dois países amazônicos”, que possuem a mesma visão sobre a floresta. “Compartilhamos a ideia de um mundo aberto em relação ao clima e ao comércio. Vamos lutar contra a mineração ilegal e contra o tráfico de seres humanos”, afirmou.
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COP30 e clima
No campo climático, Brasil e França também voltam a caminhar juntos. “Defender o regime multilateral do clima é outra prioridade compartilhada”, destacou Lula, ressaltando a relevância da COP30, que será realizada em Belém em novembro, marcando os dez anos do Acordo de Paris.
O presidente brasileiro reiterou o compromisso com metas ambiciosas para a redução das emissões de CO2. “Até novembro, todos os países deverão apresentar suas novas Contribuições Nacionalmente Determinadas, com metas de redução de emissões de carbono até 2035. O Brasil está comprometido com a redução entre 59% e 67% de emissões, abrangendo todos os gases de efeito estufa e todos os setores da economia”.
E aproveitou para advertir sobre a urgência de um grande financiamento para as ações: “Sem mobilizar 1,3 trilhão de dólares para o enfrentamento da mudança do clima, corremos o risco de criar um apartheid climático.”
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Palestina, ONU e combate à fome
Durante sua fala, Lula defendeu a criação de um estado Palestino e o imediato fim do massacre conduzido por Israel em Gaza. “Não é possível a gente aceitar uma guerra que não existe e, sim, um genocídio premeditado […] Porque, a Israel, ao povo judeu, também não interessa essa guerra. Interessa a paz.”. E lembrou que “como disse o presidente Macron recentemente, reconhecer o estado palestino é um dever moral e uma exigência política. O Brasil foi um dos primeiros países na América Latina a fazê-lo.”
O presidente brasileiro também criticou a paralisia do sistema multilateral diante das recentes crises mundiais. “As Nações Unidas completam 80 anos padecendo de grave déficit de legitimidade e eficácia”, declarou. Para ele, a reforma do Conselho de Segurança da organização é inadiável.
Encerrando sua fala, Lula destacou sua proposta da Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza, apresentada na reunião do G20, no Rio de Janeiro, em 2024. E lembrou que, por meio da iniciativa, deseja “inverter essa lógica [de guerra e desigualdade] e voltar a colocar a vida humana no centro da agenda internacional”.
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Em comum, os dois presidentes apresentaram ao mundo uma parceria que vai além dos tratados comerciais, respaldada por mais de 200 anos de relações diplomáticas entre as duas nações. Como bem frisou Lula, “essa construção conjunta passa pelo aprofundamento dos laços e do intercâmbio entre nossas sociedades”.
Da Redação