Engracia Mendoza Caba tinha apenas nove anos quando tudo aconteceu, mas traz “bem doído” quando no dia 16 de fevereiro de 1982 os soldados guatemaltecos baixaram dos helicópteros atirando e deram vida à palavra “genocídio”. Bem treinados, mataram seu pai com um “tiro vindo do alto”. O balaço destroçou a cabeça e cobriu o corpo do senhor de sangue: “Escondida a seu lado, vi que ali ele ficou. Minha irmã foi enforcada dentro de casa e teve as duas filhas executadas. A maior estava no meio das cinzas. A bebê tinha apenas 40 dias e foi encontrada sem a cabeça, que havia sido cortada. Estava numa bacia, devorada pelos cachorros”.
Este é um dos inúmeros depoimentos colhidos pelo jornalista Leonardo Wexell Severo, redator internacional do jornal Hora do Povo e colaborador do Portal Vermelho, que integram o livro “Guatemala e Palestina sob o tacão genocida de Israel – Uma história silenciada pela mídia hegemônica”, que será lançado no dia 12 de setembro.
São 126 páginas de artigos e reportagens colhidas no calor dos acontecimentos – na Faixa de Gaza e na Cisjordânia durante a Segunda Intifada palestina em novembro de 2000 – e em 2015 com o agravamento do cerco israelense; e na Guatemala, em 2013 – sob o desgoverno macabro do general Otto Pérez Molina -, e em 2024 – acompanhando o julgamento do ex-chefe do Estado Maior das Forças Armadas, Benedicto Lucas Garcia, que chegou a ser condenado a 2.860 anos de prisão, explicitando a política de terrorismo de Estado levada a cabo por Israel nos dois países.
“É uma prática que se repete em função dos interesses dos Estados Unidos, seja no Oriente Média ou na América Latina, e por isso o descarado apoio político, econômico e militar dos seus sucessivos governos”, denuncia Severo, frisando que “imperialismo e sionismo são duas faces da mesma moeda”.
Na Guatemala, entre 1960 e 1996 foram, oficialmente, mais de 200 mil mortos e 45 mil desaparecidos – cinco mil deles crianças, recorda o autor. “O sionismo chegou para ficar naquele país nos anos 70 com abundantes recursos, armamentos e cerca de 300 assessores. Desde militares a técnicos de ‘interrogatório’ que ajudaram a treinar facínoras, a prender, torturar e a barbarizar opositores, gente extremamente preconceituosa, racista e agressiva, disposta a impor sua verdade a qualquer custo”, descreve.
Conforme Severo, há abundantes testemunhos e farta literatura citados no livro comprovando o grau de degeneração e psicopatia dos sionistas: “um sobrevivente guatemalteco relatou que esteve no seu interrogatório um israelense, e que o deslocaram a um centro de detenção localizado numa sinagoga. Foi encontrado um arquivo paralelo de inteligência em que aparecem documentos e manuais israelenses, escritos em hebraico. As descrições são assombrosas”.
Trump e Netanyahu planejam um resort sob o cemitério de Gaza
Na avaliação do autor, “o que Trump e Netanyahu estão fazendo é apenas tornar sua política de ‘cerco e aniquilamento’ ainda mais evidente ao querer transformar Gaza num luxuoso resort à beira do Mediterrâneo”. “Por isso despejam bombas e mísseis em civis desarmados, enquanto matam a população de fome, destroem hospitais, impedem a chegada de medicamentos e assassinam jornalistas para impedir o acesso à informação”, acrescenta.
Severo ressalta que desde 7 de outubro de 2023, de uma população de 2,2 milhões de pessoas, temos cerca de 63 mil mortos, 12 mil desaparecidos sob os escombros e mais de 156 mil feridos, muitos deles gravemente. “Somente na última segunda-feira (25) tivemos mais cinco jornalistas da imprensa internacional assassinados no ataque a um hospital. Isso sem falar nos civis que estão sendo massacrados diariamente nos territórios ocupados da Cisjordânia. Com o livro procuro contribuir para resgatar a história e estimular a que as pessoas se mobilizem contra os nazi-israelenses, que como o governo Lula está fazendo, deve ser feito aqui e agora”, enfatiza.
“Guerra sendo travada contra a memória e a soberania dos povos”
“Há uma guerra sendo travada contra a memória, contra a soberania dos povos, contra o direito à autodeterminação. E essa guerra é midiática, cultural, simbólica. Por isso, livros como este são ferramentas de luta. São munição para os que não aceitam viver ajoelhados. São também um chamado à consciência: ou escolhemos o lado dos que resistem, ou seremos cúmplices dos que massacram. Leonardo escolheu o lado certo. E neste livro, nos convida a fazer o mesmo”, aponta o escritor Paulo Cannabrava Filho, editor do Diálogos do Sul Global, integrante da primeira equipe da Prensa Latina e da revista Cadernos do Terceiro Mundo.
O livro conta com apresentação de Raúl Nájera, pesquisador do Escritório de Direitos Humanos da Arquidiocese da Guatemala – que dá continuidade ao trabalho do bispo Juan José Gerardi, assassinado em 1998 dois dias após apresentar o relatório “Nunca Mais”, apresentando provas dos crimes cometidos contra os civis; do jornalista Nathaniel Braia, que se negou a combater os árabes e foi preso na batalha do Yom Kipur (1973) e autor do “O Apartheid de Israel”; de Ualid Rabah, presidente da Federação Árabe Palestina do Brasil (Fepal) e Júlio Coj, da União Sindical de Trabalhadores da Guatemala e representante na Organização Internacional do Trabalho (OIT). A capa do livro estampa um mural que se encontra no cemitério de San Juan Comalapa, na Guatemala, tem uma caricatura cedida solidariamente pelo jornalista e autor de quadrinhos Gilberto Maringoni, além de fotos que denunciam a situação de escárnio em ambos os países.
Serviço
O que: Lançamento do livro-reportagem “Guatemala e Palestina sob o tacão genocida de Israel – Uma história silenciada pela mídia hegemônica”, de Leonardo Wexell Severo – Editora Papiro
Quando: 12 de setembro
Onde: Livraria Drummond – Avenida Paulista, 2073/Conjunto Nacional.
Horário: 19h30
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(BL)