Líderes árabes aprovaram nesta terça-feira (4) um plano de reconstrução de Gaza no valor de US$ 53 bilhões, rejeitando a proposta do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de expulsar os palestinos do território e transformá-lo em um destino turístico, uma riviera no Oriente Médio.
A decisão foi tomada em uma cúpula de emergência realizada no Cairo, com a participação de representantes do Egito, Catar, Emirados Árabes Unidos e Arábia Saudita, além do secretário-geral da ONU, António Guterres.
O plano prevê a reconstrução da Faixa de Gaza em três fases até 2030, garantindo que a população palestina permaneça no território e que a governança passe temporariamente a um comitê de tecnocratas antes da transição para a Autoridade Palestina.
A proposta árabe busca oferecer uma solução diplomática e estruturada para a devastação causada pela guerra e ocorre em um momento de escalada de tensão, após declarações de Trump ameaçando diretamente os palestinos.
Em publicação na rede Truth Social, o presidente dos EUA afirmou que, caso os reféns israelenses mantidos pelo Hamas não sejam libertados, os habitantes de Gaza estariam “mortos” e pagariam um “inferno” pela decisão.
O ultimato ocorre no momento em que os Estados Unidos mantêm negociações diretas com o Hamas para dar continuidade ao cessar-fogo, rompendo com a política tradicional de Washington de não dialogar com o grupo palestino. Em resposta, o Hamas afirmou que as ameaças dificultam as negociações e reforçam a posição israelense de evitar a implementação da segunda fase do cessar-fogo.
O plano árabe aprovado prevê três etapas de reconstrução. A primeira fase, com duração de seis meses, prevê a remoção de destroços e explosivos não detonados. Estima-se que Gaza tenha mais de 50 milhões de toneladas de escombros acumulados após os bombardeios israelenses. A segunda etapa, que se estenderá por vários anos, será voltada à reconstrução de infraestrutura essencial, incluindo moradias, escolas e hospitais.
A terceira fase prevê a criação de um porto comercial, um aeroporto e zonas industriais, com a perspectiva de conclusão até 2030. O plano propõe ainda um comitê interino de tecnocratas para administrar Gaza temporariamente, preparando a transição para a Autoridade Palestina.
A principal questão não resolvida no plano árabe diz respeito à segurança e ao papel do Hamas. A proposta evita detalhar como seria o desarmamento do grupo palestino, uma exigência de Israel e dos Estados Unidos.
Embora alguns países árabes defendam a dissolução da ala militar do Hamas, não há um mecanismo estabelecido para isso. Netanyahu já declarou que não permitirá a volta da Autoridade Palestina ao controle de Gaza e insiste que o território continue sob segurança israelense.
O Egito e seus aliados querem envolver a ONU e potências europeias no processo de mediação, mas a falta de consenso sobre o desarmamento do Hamas pode enfraquecer as negociações.
A posição da Casa Branca se tornou um dos principais fatores de instabilidade no cenário diplomático. A recente mudança de postura dos EUA, ao negociar diretamente com o Hamas pela libertação de reféns americanos, contrasta com a retórica agressiva de Trump, que, além de ameaçar os palestinos, prometeu fornecer a Israel “tudo o que for necessário” para encerrar o conflito.
O governo israelense, por sua vez, endureceu sua posição ao bloquear a entrada de ajuda humanitária em Gaza, descumprindo termos do cessar-fogo e aumentando os temores de um novo colapso das negociações.
A crise humanitária na Faixa de Gaza se agrava com o uso da fome como arma de guerra. A ONU e diversos países europeus denunciaram a decisão israelense de suspender a entrada de alimentos e medicamentos no território palestino, aumentando o risco de catástrofe humanitária.
O acordo de trégua, mediado pelo Catar, Egito e Estados Unidos, previa que as negociações para a segunda fase do cessar-fogo deveriam ter sido iniciadas há mais de um mês. No entanto, Israel insiste em prorrogar a primeira etapa, exigindo a desmilitarização completa de Gaza e a libertação de todos os reféns antes de qualquer discussão sobre um cessar-fogo permanente.
O Hamas, por outro lado, reivindica o cumprimento da segunda fase do acordo, que prevê um cessar-fogo definitivo e a retirada total das tropas israelenses do território palestino.
Diante do impasse, a próxima etapa será uma conferência internacional organizada pelo Egito e pela ONU para arrecadar fundos para a reconstrução de Gaza. O financiamento, porém, ainda não está garantido.
As ricas monarquias do Golfo, como Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, demonstram hesitação em investir bilhões de dólares sem garantias de que a região não será destruída novamente em um novo conflito. O Egito sugeriu que a União Europeia também participe do financiamento da reconstrução, mas ainda não há compromissos concretos.
Enquanto os países árabes tentam encontrar uma solução diplomática para Gaza, Trump aposta no discurso da força e da intimidação. O futuro do território dependerá do avanço das negociações internacionais ou da radicalização da política israelense, impulsionada pelo apoio incondicional da Casa Branca. Sem consenso sobre segurança, governança e desmilitarização, a população palestina segue entre o bloqueio humanitário imposto por Israel e as ameaças de uma escalada militar liderada pelos Estados Unidos.