
Por Wesley Lima e Anthony Luíz
Para a Página do MST
Entre os dias 17 e 20 de julho, a Escola Nacional Florestan Fernandes (ENFF), localizada em Guararema (SP), ficou um pouco mais colorida com a realização do IV Seminário LGBTI+ da Via Campesina Brasil.
A atividade reuniu militantes de diversos movimentos e organizações populares do Brasil e da América Latina, com o objetivo de desenvolver um conjunto de sínteses políticas e projetar ações que vão nortear a Via Campesina na construção das lutas no atual contexto político e econômico.
Durante quatro dias, foram desenvolvidos debates sobre “Corpo-Território na Diversidade Sexual e de Gênero”, “Desafios e Perspectivas na Construção de Políticas Públicas”, “Ancestralidade e Bem Viver”, “O Feminismo Camponês e Popular” e “Agro-hidro-minérionegócio frente as lutas populares”. Além disso, houve espaços de autocuidado e de fomento à auto-organização da população LGBTI+, buscando ampliar a visibilidade das experiências e desafios enfrentados pelos sujeitos LGBTI+ no campo, nas águas e nas florestas.

Para Luana Oliveira, integrante do Coletivo LGBTI+ Sem Terra, a programação do Seminário foi construída levando em consideração os principais temas debatidos pelos movimentos e organizações da Via Campesina no Brasil, olhando sempre para a realidade brasileira e continental, sem perder de vista, os desafios “organizativos e conjunturais posicionados no campo da luta política”.
“Saímos do Seminário com um saldo muito positivo, com tarefas e perspectivas do debate da auto-organização das LGBTI+ nos movimentos e organizações sociais que constroem a Via Campesina hoje no Brasil. Conseguimos qualificar alguns debates extremamente importantes na atualidade, como a dimensão da crise ambiental, a construção da Soberania Alimentar e da agroecologia” e continua, “entendemos que temas tão estratégicos para nossas organizações hoje, só ganham materialidade se assumirem a diversidade como uma frente importante”.
Autocuidado e território
Os espaços de autocuidado ocuparam com centralidade a programação do Seminário. De acordo com a coordenação política e pedagógica da atividade, esses momentos foram atos políticos e de resistência fundamentais para as pessoas LGBTI+, especialmente em um momento em que frequentemente essas identidades são marginalizadas e violentadas.
As atividades de autocuidado trabalharam com momentos de alongamento, rodas de conversa, dinâmicas corporais, exercícios de respiração, massagens, entre outras.
Maria de Quadros, do Movimento de Mulheres Camponesas (MMC), explica que o autocuidado é uma ferramenta de fortalecimento coletivo. “Ao se reconhecer como digno de cuidado, o sujeito LGBTQIA+ rompe com discursos que o desumanizam e inspira outras pessoas da comunidade a fazerem o mesmo”, analisa. Segundo Quadros “criar redes de apoio, promover espaços seguros e acolhedores, compartilhar vivências e saberes sobre saúde e bem-estar são formas de transformar o autocuidado em cuidado coletivo”.

Desafios e perspectivas
Entre as diversas tarefas e desafios apresentados durante esta edição do Seminário, se destacam: a necessidade de elaboração em torno da diversidade sexual e de gênero frente a conjuntura política; a auto-organização das LGBTI+ nos movimentos e organizações da Via Campesina Brasil; o enfrentamento das violências e construção de territórios livres e seguros para a vivência das sexualidades; e o fortalecimento das lutas populares diante do avanço do agro-hidro-minérionegócio nos territórios do campo, das águas e das florestas.
Para Cony Oviedo, da Coordenação Latino-americana de Organizações do Campo (CLOC-Via Campesina), os desafios são complexos, profundos e nos possibilita seguir construindo ações radicais e coletivas de enfrentamento das violências contra os corpos e territórios em luta.
“O capitalismo, o patriarcado e o colonialismo são sistemas de opressão que se materializam na exploração dos nossos territórios-corpo, dos nossos territórios-terra e dos nossos bens comuns. O avanço do extrativismo, como do agronegócio, da mineração e do hidronegócio, segue construindo uma ofensiva sem precedentes contra os movimentos e organizações sociais que lutam por dignidade e direitos no campo, nas águas e nas florestas”, aponta.

Ela destaca ainda que é preciso pensar a forma como “nos relacionamos, enquanto LGBTI+, dentro dos nossos movimentos e organizações populares”, para fortalecer a luta por Soberania Alimentar, a agroecologia, a formação política, a economia feminista e a construção de novas formas de organização.
No encerramento, os participantes do evento se comprometeram com o fortalecimento da auto-organização das LGBTI+ em seus respectivos movimentos e projetaram a realização do 5º Seminário, em 2026.




Via Campesina
A Via Campesina é uma organização internacional que contribui no alinhamento de um conjunto de lutas com camponesas, trabalhadores agrícolas, mulheres rurais e comunidades indígenas e negras da Ásia, África, América e Europa, da qual o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) faz parte.
Uma das principais ações estratégicas da Via Campesina é a defesa da soberania alimentar, como o direito dos povos de decidir sobre sua própria política agrícola e alimentar. Isto inclui: prioridade para uma produção de alimentos saudáveis, de boa qualidade e culturalmente apropriados, para o mercado interno. É fundamental, portanto, manter um sistema de produção camponês diversificado (biodiversidade, respeito à capacidade produtiva das terras, valor cultural, preservação dos bens naturais).
No Brasil, essas lutas ganham corpo nas estratégias de vários movimentos e organizações sociais, como o MST, e outras organizações tais quais: Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Comissão Pastoral da Terra (CPT), Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), Movimento de Mulheres Camponeses (MMC), Pastoral da Juventude Rural (PJR), Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ), entre outras organizações populares.
*Editado por Pamela Oliveira.