A violência e os acidentes seguem sendo os maiores algozes da juventude brasileira, sobretudo a negra. E, embora a maioria dos óbitos atinja os homens, as mulheres sofrem severamente com as agressões. Na comparação com o restante da população, esses recortes refletem os segmentos mais expostos de nossa população.

Esse quadro está retratado em informe epidemiológico feito por pesquisadores da Agenda Jovem Fiocruz (AJF) e da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (EPSJV/Fiocruz), tendo como base as notificações médico-hospitalares do Sistema Único de Saúde (SUS) e as estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) relativas a 2022 e 2023.

De acordo com o levantamento, 65% dos óbitos registrados entre os jovens resultam de causas externas. Na população brasileira em geral, esse tipo de morte corresponde a 10%.

Com isso, fica claro que os jovens sofrem maior risco de perder a vida pela violência ou por acidentes. Na população total, a taxa de mortalidade por causas externas é de 149,7 casos por 100 mil habitantes, enquanto entre os mais jovens é de 185,5/100 mil. O risco é ainda maior para a faixa de 20 a 24 anos, em que a proporção salta para 218,2/100 mil.

O estudo aponta também para os diferentes tipos de violência que mudam conforme a faixa etária. “No final da adolescência (15 a 19 anos), os jovens sofrem mais violência em geral, especialmente violência física, e são mais vitimados em conflitos com pessoas de outras gerações. No período intermediário (20 a 24 anos), quando estão entrando na força de trabalho e deixando a tutela de outros adultos, há o maior risco de morte violenta. Conforme os jovens se consolidam na vida adulta (25 a 29 anos), a violência contra a mulher e a violência psicológica se tornam mais acentuadas”, explica.

Gênero e raça

Analisando o recorte de gênero, os pesquisadores mostram que os tipos de violência que levam ao óbito atingem mais os homens jovens, em especial aqueles entre 20 e 24 anos, de maneira que a taxa de mortalidade de homens é oito vezes maior do que a das mulheres na juventude. Por outro lado, as violências notificadas no SUS atingem mais as jovens mulheres, em especial na faixa de 15 a 19 anos.

Entre os homens jovens, mais da metade (50,6%) das mortes por causas externas decorrem de agressão — na população geral, o percentual é de 32%. Já as mulheres são as maiores vítimas das violências notificadas no SUS. Entre as dez primeiras causas de morte por agressão contra as mulheres, quase 35% ocorreram em casa. Para os homens jovens, este mesmo dado é de 10%. Tiro por arma de fogo e cortes causados por objetos penetrantes são as principais causas de morte das mulheres jovens.

“As maiores vítimas das violências notificadas pelo SUS são as mulheres, tanto em termos proporcionais como na taxa de incidência, no país e em todas as UFs (Unidades Federativas), tanto na população jovem como em geral. Mas, a desproporção é maior entre as mais jovens. Mulheres constituem 71% dos casos de violência notificadas pelo SUS no Brasil. Entre jovens, a taxa de incidência de violências é o dobro para mulheres (595/100mil habitantes) quando comparada com a dos homens (221,6/100 mil habitantes)”, afirma o boletim.

O recorte racial também é um demarcador importante e explicita, segundo o estudo, que “na juventude, a desigualdade racial é mais acentuada”. No conjunto das mortes externas, 73% das vítimas eram pretos e pardos — embora também alta, essa proporção cai na população em geral, ficando em 60%.

Segundo a pesquisa, jovens negros e indígenas têm maior risco de morrer por violências e acidentes, numa relação de 227,5 casos por 100 mil habitantes e 177,9/100 mil respectivamente. “Isso representa praticamente o dobro das taxas dos jovens brancos e amarelos”, diz o estudo. Esse jovens ainda representam 54% das vítimas de violências notificadas pelo SUS no segmento da juventude.

Outro dado é que boa parte da violência e dos óbitos nessa faixa envolve armas de fogo e motocicletas. No primeiro caso, foram registrados mais de 24 mil ocorrências. Já em 53% dos acidentes fatais, a maioria com homens, o principal meio de transporte foi a motocicleta. E, do ponto de vista regional, o maior risco de morte violenta entre os jovens está no Nordeste e no Norte.

No estudo, Diogo Santos, do Instituto Fogo Cruzado chama atenção para o “aumento das armas de fogo na mão de civis, no Brasil, a partir dos decretos do governo Bolsonaro” nesse cenário de alto grau de violência. Ele lembra que as armas “estão mais baratas no mercado paralelo” e que hoje “há mais armas nas mãos de civis do que nas forças policiais do Brasil”.

Outro ponto que ele destaca é a expansão dos grupos armados no Brasil e a sua atuação especialmente nas regiões Norte e Nordeste. “Por exemplo: o Porto do Cabo, em Pernambuco, é um porto de escoamento de drogas; outro é a rota do Solimões, que passa por boa parte da Região Norte para entrada de drogas. É nesses lugares, onde a droga troca de mão, que a violência mais acontece. Esse caldeirão é nacional, esse problema não se combate mais apenas dentro dos estados separadamente; precisa de um enfrentamento nacional”.

Crime organizado

O enfrentamento do crime organizado em âmbito nacional tem sido uma das principais preocupações da sociedade — medida em pesquisas recentes — e do governo Lula, que lançou duas grandes propostas para lidar com o problema.

A primeira delas foi a PEC da Segurança Pública, que trata de mudanças constitucionais para equacionar questões mais estruturantes e administrativas da atuação dos órgãos de segurança pública, bem como possibilitar a maior participação federal no combate a essas organizações. Após passar, em julho, pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, a proposta está agora em uma comissão especial.

Já o projeto de lei contra as organizações criminosas, que tem sido chamado de “Plano Real da Segurança”, está sendo finalizado pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública. Seu foco central está nas penas aplicadas, na criação da modalidade da organização criminosa qualificada com penas mais pesadas, além de agravantes, entre outros aspectos.

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Last Update: 27/08/2025