Uma decisão do Tribunal de Justiça do Tocantins censurou o site de notícias Diário do Centro do Mundo (DCM), do jornalista Kiko Nogueira, nesta quarta-feira (04), retirando-o do ar, a pedido da deputada estadual Janad Valcari (PL-TO). “A decisão é autoritária e equivocada”, manifestou o advogado Marco Aurélio de Carvalho, fundador da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD) e do Grupo Prerrogativas (Prerrô), ao GGN.
A deputada do PL acionou a Justiça após o jornal divulgar, em notícia no ano passado, que a parlamentar faturou R$ 23 milhões em esquema envolvendo Prefeituras por negócios envolvendo a banda Barões da Pisadinha, da qual ela era empresária. Valcari disputa hoje a Prefeitura de Tocantins e o caso tramita em segredo de Justiça.
Ao GGN, o jornalista Kiko Nogueira lamentou o ato de perseguição e informou que a mesma notícia foi divulgada, posteriormente, por outros dois veículos de comunicação – o Uol e o Globo – que não sofreram represália ou censura de conteúdo.
A derrubada do site ocorreu, ainda, sem o jornal ser informado de que estava sendo alvo de uma ação ou intimado a prestar esclarecimentos.
A equipe de defesa do jornalista, comandada pelo advogado Francisco Ramos, explicou que eles tiveram acesso aos autos somente após a derrubada do site e que a ação estava em segredo de Justiça, sem a prévia e obrigatória comunicação à parte.
“Nós tivemos que pedir nossa habilitação [de advogados parte da ação], tivemos que falar no balcão virtual [do Tribunal], ligar na Vara, mandar email, para que eles [a Justiça] nos dessem acesso aos autos e, finalmente, conseguimos”, narrou a defesa, sobre as dificuldades da própria parte ré de acessar os autos.
“É uma decisão absurda que foi dada em sede de cognição sumária, sem ser dado a oportunidade de a gente se manifestar sobre isso, sobre esse pedido e que viola, justamente, julgamentos do STF [Supremo Tribunal Federal]. Nós vamos seguir com um pedido de reconsideração para o juízo de primeiro grau, distribuir um agravo de instrumento para o segundo grau e também vamos distribuir uma reclamação”, disse a defesa.
A decisão da juíza Edssandra Barbosa da Silva Lourenço citava “tentativas infrutíferas” de contato com o DCM para intimar a prestar esclarecimentos sobre a ação e, assim, suposta “impossibilidade técnica” de pedir ao jornal a retirada da reportagem que trazia a denúncia.
Mas um pedido dos advogados do DCM à Justiça de Tocatins indica que o jornal não havia sido acionado a nenhum processo. Ao solicitar o certificado do sistema processual, aonde deveria constar os processos que envolvem o site, o Tribunal de Justiça emitiu a comprovação de que “não constam” autos contra o veículo. O certificado, contudo, não garante registro de ações sigilosas.
Ao GGN, o advogado especialista em Direito Público, Marco Aurélio de Carvalho, fundador e coordenador do Prerrô, afirmou que a decisão de derrubada do site de notícias “preocupa, e muito”. “A decisão em questão é autoritária e equivocada. Ainda que houvesse motivos para a censura da matéria sobre a deputada, a juíza jamais poderia ter tirado do ar o site do DCM.”
Marco Aurélio lembrou que o período de eleições municipais pode ensejar violações como essa e chamou a atenção para que casos assim sejam impedidos: “Preocupa-nos, e muito, que situações como esta venham a se repetir em um futuro próximo, em especial por estarmos próximos das eleições municipais. Espero que a juíza reconsidere, por conta própria, esta decisão”, disse.
Em nota, Associação Brasileira de Mídia Digital (ABMD) repudiou a decisão da juíza Edssandra Barbosa da Silva Lourenço, do TJ-TO. “A ABMD considera a decisão uma afronta à liberdade de imprensa e ao jornalismo. A medida é ainda mais grave porque o veículo sequer foi notificado e teve acesso à decisão.”
De acordo com a entidade, o ato é uma “censura ao veículo, utilizando-se do sistema de justiça”. “Não podemos tolerar que o judiciário seja utilizado para calar o jornalismo como em períodos sombrios da nossa história”, escreveu a ABMD.
O jornalista Kiko Nogueira informou que o DCM irá recorrer, também, ao Supremo Tribunal Federal.