Por Juliana Cardoso*
A situação da Cracolândia na cidade de São Paulo não pode mais ser tratada como questão de segurança pública ou apenas como preemente de uma intervenção urbanística. É, acima de tudo, uma questão de garantia de direitos humanos e de saúde pública.
Em 13 de maio, a Cracolândia — que há décadas é símbolo do abandono social e da falência das políticas públicas por abrigar grupos de usuários de drogas — amanheceu vazia, para surpresa quase geral.
Mas não se enganem: ela não desapareceu. Ela foi pulverizada. Os dependentes químicos, as pessoas em situação de vulnerabilidade social, foram espalhadas por diversos pontos da cidade e por outros municípios do estado.
Isso é fruto de uma política higienista, cruel, que quer tirar os pobres da paisagem urbana, quer apagar os vulneráveis da região central de São Paulo, como se eles fossem o grande problema urbano.
Mas, pergunto: onde estão essas pessoas agora? Com certeza, seguem sem moradia. Sem emprego. Sem tratamento clínico contínuo. Sem uma rede real e efetiva de assistência psicossocial.
Na prática, o que estamos vendo é um governo que escolhe esconder o problema em vez de enfrentá-lo.
Expulsam as pessoas dos territórios sem oferecer alternativas reais — como se, ao espalhar pela cidade, pudessem apagar também sua existência e seus direitos. Essa é a lógica perversa de um Estado que se recusa a colocar a vida no centro das políticas públicas.
Enquanto não houver moradia digna, postos de trabalho, serviço de cuidados, investimento efetivo em política de saúde mental, em CAPS (Centros de Atenção Psicossocial), em fortalecimento da Atenção Básica e em política de redução de danos, a cidade vai continuar produzindo novas pequenas ou grandes Cracolândias.
Porque a Cracolândia não é um lugar. É um sintoma. É o reflexo de um modelo de sociedade que prefere encarcerar, internar à força e reprimir, em vez de cuidar, acolher e garantir direitos.
Nosso mandato seguirá cobrando do governo do estado de São Paulo e da Prefeitura posturas comprometidas com a vida, com a dignidade, com a escuta das comunidades e com o fortalecimento do SUS e da política de assistência social.
*Juliana Cardoso, deputada federal do PT eleita por São Paulo para o mandato 2023/2026. Integra a Comissão de Saúde e a Comissão de Mulheres, além de ser 1ª vice-presidenta da Comissão dos Povos Originários e Amazônia.