O juiz eleitoral Magno Gomes de Oliveira cassou o mandato de Braguinha (PSB), prefeito de Santa Quitéria, no interior do Ceará, por suposta ajuda da facção criminosa Comando Vermelho durante as eleições do ano passado. A sentença, assinada na quarta-feira 7, também tem como alvo o vice-prefeito Gardel Padeiro (PP).
Segundo as investigações, a organização atuaria com doação de entorpecentes a potenciais eleitores em troca de votos, além de ameaças a adversários políticos e seus apoiadores em locais sob domínio do CV. Há indícios de que o método também tenha sido utilizado nas eleições de 2020, quando Braguinha foi eleito para o seu primeiro mandato na cidade.
No mês passado, a Justiça Eleitoral do Ceará mandou abrir ação penal contra os mandatos e afastá-los dos seus cargos. Eles não haviam assumido o comando da cidade no início do ano em razão de uma ordem judicial e desde janeiro Santa Quitéria tem sido gerida pelo presidente da Câmara de Vereadores, Joel Barroso, também do PSB e filho de Braguinha.
O processo em questão partiu do Ministério Público estadual, que apontou abuso de poder político e econômico nas práticas do prefeito eleito e seu vice durante a campanha de 2024. A denúncia incluía depoimentos de adversários do pessebista, entre eles Tomas Figueiredo (MDB), que ficou em segundo lugar na disputa pela prefeitura.
O emedebista relatou, por exemplo, que teve dificuldades de realizar seus eventos e de visitar eleitores, além das ameaças feitas por membros da facção aos seus auxiliares desde o início da campanha. Também há menção a pichações feitas por integrantes do CV com veto explícito a Tomas Figueiredo: “Quem apoiar o Tomás vai entrar no problema com o CV”, apontou os promotores do MP à Justiça.
As manifestações teriam sido ordenadas por Paulinho Maluco, líder da organização na cidade. Ele também teria participado de atos de campanha realizados por Braguinha e determinado o disparo de ameaças de expulsão e ataques incendiários a apoiadores do candidato emedebista em mensagens no WhatsApp e ligações telefônicas, segundo conversas interceptadas pela Polícia Federal.
Reeleger o prefeito, argumentou o órgão, seria útil para os interesses do Comando Vermelho, uma vez que o pessebista é “aliado de pessoas envolvidas com a organização criminosa e até mantém alguma delas nos quadros da administração pública, razão por que resulta notória a movimentação do crime organizado para se expandir cada vez mais e deixar de ser apenas o poder paralelo”.
Sustentou a denúncia do MP: “A organização criminosa adotou a estratégia de demonstrar claramente ser contra o Tomás e prejudicar a candidatura deste, mas não deixar transparecer o apoio ao candidato José Braga Barrozo [Braguinha], a fim de, obviamente, não levantar suspeitas, nem prejudicar o candidato que eles pretendiam beneficiar”.
Até a Justiça Eleitoral teria sido alvo da ação da facção, segundo o documento. Em depoimento aos investigadores, um servidor do Cartório Eleitoral da cidade relatou ter recebido, em meados de setembro, um telefonema com ameaças de morte aos funcionários do local caso não cessassem as decisões contra os “manos” do CV.
Para o juiz do caso, os elementos colhidos ao longo da apuração são graves porque, mediante abuso de poder político e econômico, tentou-se colocar a população em uma “espécie de cativeiro” para impedi-la de escolher livremente os seus candidatos. Uma vez destituída uma população de tais liberdades, completou, “ter-se-á o soterramento do Estado Democrático de Direito“.
“Nada pode ser tão grave quanto negar ao eleitor a liberdade de sufragar os nomes dos candidatos que escolher, segundo seus valores pessoais, e segundo as ideias e propostas apresentadas durante os atos de campanha, e se estes atos de campanha tiverem sido ilicitamente obstruídos, ainda maior será o grau de culpabilidade daquele que contribuiu para que frutificasse o projeto espúrio”, escreveu. Cabe recurso da decisão.