Jornalistas foram impedidos de registrar o momento em que o deputado Glauber Braga (PSOL-RJ) foi retirado com violência pela Polícia Legislativa da cadeira da Presidência da Câmara nesta terça-feira (9), após determinação da Mesa para cortar o sinal da TV Câmara e esvaziar o plenário.
O episódio, sem precedentes, ocorreu no dia em que a Casa acelerou a pauta da dosimetria, que reduz penas do 8 de janeiro.
Glauber assumiu a cadeira às 15h30, acionou a campainha da Mesa e chamou parlamentares inscritos para se manifestarem, numa tentativa de ocupar simbolicamente a condução da sessão. Pouco depois, anunciou que não deixaria o posto enquanto o presidente insistisse em pautar sua cassação e a dosimetria.
A ordem para esvaziar o plenário foi dada em seguida pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB) .
Na ação, policiais legislativos puxaram o deputado pelos braços e pelas pernas. A deputada Célia Xakriabá (PSOL-MG) chegou a cair no tumulto, o terno de Glauber foi rasgado enquanto Sâmia Bomfim (PSOL-SP) tentava impedir a retirada.
“Eu gostaria que o Motta tivesse dado 1% do tratamento que tiveram os deputados que sequestraram a mesa da Câmara por 48 horas que estavam aliados a um deputado que está fora do país. Naquele momento não faltou negociação”, disse Glauber.
Segundo o deputado, a ocupação teve o objetivo de denunciar a ofensiva da Mesa contra mandatos de esquerda e a conivência da Presidência da Câmara com a permanência de Eduardo Bolsonaro no exercício do mandato, apesar de o parlamentar estar fora do país articulando sanções contra autoridades brasileiras.
“A minha presença na mesa diretora foi para mostrar que a gente não pode se render. Amanhã tem a votação da cassação. Eles podem até cassar o mandato, mas eles podem ter certeza que até o último minuto eu vou lutar não por mim e nem pelo mandato, mas para que eles não firam as liberdades democráticas. Nesse mesmo pacote, eles querem votar uma anistia como dosimetria, querem manter os direitos de um deputado [Eduardo Bolsonaro] que está fora do país”, afirmou.
Durante a violência contra Glauber acontecia, o acesso da imprensa ao plenário foi interrompido pela Polícia Legislativa logo após a ordem de esvaziamento, e o sinal da TV Câmara foi cortado às 17h34, impedindo a transmissão ao vivo do tumulto. Jornalistas, fotógrafos e cinegrafistas foram retirados sob empurrões, em um episódio que motivou notas de repúdio de entidades do setor e levantou questionamentos sobre censura e abuso de poder.
A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Distrito Federal (SJPDF) classificaram a decisão como “grave censura à imprensa” e denunciaram “agressões físicas” contra profissionais que tentavam registrar a retirada de Glauber. Para as entidades, a orientação partiu da própria Presidência da Câmara e representou violação direta ao direito à informação.
Associações como ANJ, Aner, Abert e Abraji também condenaram o cerceamento, afirmando que o corte do sinal e a expulsão da imprensa são “incompatíveis com o funcionamento democrático do Parlamento”.
A repórter Ana Flor, da GloboNews, relatou ter levado empurrões de seguranças e descreveu o momento como “uma cena que jamais presenciou em mais de 20 anos” cobrindo o Congresso.
“Eu estava do lado de fora enquanto a imprensa pedia para entrar. O plenário ficou fechado, os jornalistas foram retirados à força, o sinal foi cortado. É algo inaceitável para a história da Câmara e para a democracia brasileira”, afirmou ao vivo.
As cenas também provocaram reação imediata de parlamentares do campo progressista, que associaram a violência no plenário ao avanço de práticas autoritárias dentro da Casa. Para Orlando Silva (PCdoB-SP), o conjunto de episódios — do corte do sinal à remoção de Glauber — expôs um ambiente de “dois pesos e duas medidas” na atuação da Presidência da Câmara.
“A imprensa sendo impedida de exercer seu trabalho e parlamentares com restrições ao direito de circular livremente na Casa do Povo”, afirmou o deputado, lembrando que, em agosto, aliados de Jair Bolsonaro ocuparam a Mesa por quase dois dias sem que qualquer ação de força fosse acionada.
Renildo Calheiros (PCdoB-PE) também vinculou a truculência à deterioração das garantias democráticas no Parlamento. Ele disse ver “com apreensão” o que ocorreu no plenário e advertiu para o risco de naturalização de práticas autoritárias. “Defender a democracia é garantir liberdade de imprensa, respeito aos parlamentares e o pleno funcionamento das instituições. Seguimos atentos e firmes na defesa do Estado Democrático de Direito”, declarou.
Jandira Feghalli (PCdoB-RJ) classificou o episódio como parte de uma legislatura marcada pelo “desrespeito à Constituição brasileira” e criticou a tolerância seletiva da Mesa.
Segundo ela, a violência empregada contra Glauber e o cerceamento da imprensa contrastam com a complacência diante de parlamentares que “apoiam tortura, assassinato e ditadura”, em referência à ocupação da Mesa por extremistas em agosto.