O Tribunal de Contas da União (TCU) decidiu, em 19 de fevereiro, que presentes pessoais recebidos por presidentes e vice-presidentes não são patrimônio público. A decisão veio após recurso da Advocacia-Geral da União (AGU) e beneficia diretamente Jair Bolsonaro, que não precisará devolver as joias recebidas em viagem à Arábia Saudita e aos Emirados Árabes. O entendimento se estende a um relógio presenteado a Lula em 2005.

Bolsonaro celebrou a decisão como uma vitória pessoal. Em entrevista à Rádio 93 FM Gospel no último sábado (15/03), declarou: “Eles tentaram de tudo para me pegar. Há duas semanas, o Tribunal de Contas da União chegou à conclusão, sobre a questão das joias e presentes, que esses bens são dos ex-presidentes, independentemente de seus valores. Não sobra mais nada contra mim. Então, sobrou essa fumaça que é o golpe de Estado e tentaram de todas as maneiras dizer que eu teria programado um golpe em novembro e dezembro de 2022”.

A decisão do TCU, no entanto, reacendeu o debate sobre a apropriação de bens recebidos por chefes de Estado no exercício da função. Para o jurista Lenio Streck, a corte extrapolou suas atribuições, adotando uma postura arbitrária e sem amparo jurídico.

“Esse caso é interessante e bizarro. O TCU fazendo das suas. Não é um tribunal do Judiciário e age como se fosse. Primeiro diz que as joias têm um destino; depois muda de ideia. As alegações de que falta regulamentação não convencem. O TCU faz decisionismo. Decide como quer. Parece evidente que, em uma república, os presentes dados a um presidente sejam patrimônio do povo. Ninguém elege um presidente para que receba presentes pessoais.”

A investigação conduzida pela Polícia Federal, inclusive, revela um enredo mais complexo. O inquérito apura a venda ilegal de joias e esculturas, entregues a Bolsonaro por autoridades estrangeiras, no exterior. Segundo os investigadores, o ex-presidente autorizou diretamente as operações de venda e leilão dos itens, e há evidências materiais que corroboram as acusações.

Para Streck, o caso das joias é um sintoma da falta de regulamentação dos presentes doados ao Estado, deixando o tema à mercê do voluntarismo do TCU. “O caso das joias da Arábia Saudita para Bolsonaro é um bom ou mau exemplo de como o parlamento deveria legislar sobre isso e não deixar que a boa ou má vontade do TCU resolva o imbróglio. A questão é: um presidente receberia o presente se não fosse presidente? Parece que a resposta é: não. Logo, recebeu na qualidade e condição de Presidente. Deve ser assim. Deveria ser assim. Doa a quem doer.”

A refinaria Landulpho Alves

Vale lembrar que, em 2024, a Controladoria-Geral da União (CGU) apontou que a refinaria Landulpho Alves, da Petrobras, foi vendida a investidores árabes por um valor abaixo do mercado, negócio concretizado durante o governo Bolsonaro, em 2021. Durante esse período, houve um crescimento expressivo dos ganhos de países como a Arábia Saudita e os Emirados Árabes no setor energético, que praticamente triplicaram seu faturamento.

A venda da refinaria é apenas um dos pontos levantados sobre os negócios entre Bolsonaro e investidores árabes. Conforme detalhado pelo jornalista Luís Nassif, o contexto em que essa transação ocorreu levanta suspeitas sobre o favorecimento a grupos específicos e as relações do ex-presidente com empresários do Oriente Médio. Além do valor reduzido da refinaria, há indícios de um padrão mais amplo de articulação política e econômica que beneficiou aliados estratégicos em detrimento do interesse público.

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Last Update: 18/03/2025