Trump, tarifas e o desafio da China.
“A medida protecionista dos Estados Unidos é uma resposta tardia e desesperada”, afirmou Jeffrey Sachs ao comentar as tarifas impostas à China. No episódio do podcast “UN in China”, Sachs explicou que, enquanto os EUA perderam tempo, a China avançou em tecnologias essenciais como carros elétricos, energia renovável e inteligência artificial.
Para Sachs, a decisão do governo americano de aumentar tarifas contra produtos chineses é uma tentativa de frear um processo irreversível: “O protecionismo atual é o reconhecimento tardio de que os Estados Unidos ficaram para trás em várias áreas-chave da nova economia”.
O economista detalhou que, enquanto as indústrias automotiva e de energia limpa nos EUA e na Europa postergaram mudanças, a China investiu pesado em pesquisa, desenvolvimento e infraestrutura. “Volkswagen e Daimler-Benz passaram anos procrastinando. Na China, enquanto isso, centenas de fabricantes de veículos elétricos surgiram em competição intensa, criando líderes mundiais.”
Segundo Sachs, o protecionismo norte-americano não é apenas uma resposta econômica, mas também uma tentativa de travar um reposicionamento geopolítico: “Estamos agora em um mundo multipolar. China, Índia, Rússia e outros países emergentes desempenham papel de grande poder.”
Ele também defendeu que, diante das restrições impostas pelos EUA, a China deveria ampliar ainda mais a Iniciativa Cinturão e Rota (Belt and Road Initiative): “A capacidade produtiva chinesa em tecnologias verdes é um presente para o mundo. Dizer que há excesso de capacidade é ridículo. Precisamos de ainda mais capacidade para enfrentar a crise climática”.
Ucrânia, OTAN e o futuro dos BRICS
Sachs também comentou de forma crítica a guerra na Ucrânia e o papel da OTAN. Segundo ele, o conflito atual é fruto de um fracasso diplomático: “Estamos vendo guerras em toda parte, o que impede avanços no desenvolvimento sustentável e coloca em risco a sobrevivência humana.”
O economista lembrou que a expansão da OTAN para leste, ignorando alertas de diversos analistas, criou tensões desnecessárias com a Rússia. “Alguns políticos não entendem, outros fingem não entender: nunca houve situação tão perigosa para a humanidade como a atual, em termos de guerra e crise ambiental combinadas.”
Ao analisar a situação da Europa, Sachs disse que o continente está pagando o preço pela submissão às estratégias de Washington: “A Europa poderia ter sido uma ponte entre o Ocidente e o Oriente, mas se alinhou cegamente a políticas que não atendem seus próprios interesses de longo prazo.”
Sachs reforçou ainda que uma ordem internacional mais equilibrada é urgente e destacou o papel dos BRICS nessa construção: “Precisamos de uma multipolaridade cooperativa, não de um novo tipo de guerra fria.”
Sobre a inclusão de novos membros nos BRICS, como Arábia Saudita, Irã e possivelmente outros países africanos, Sachs disse que isso reflete o enfraquecimento da hegemonia ocidental: “O BRICS está se fortalecendo como um contraponto vital às abordagens unilaterais.”
Em todo o diálogo, Jeffrey Sachs se mostrou preocupado, mas também otimista de que a cooperação internacional, baseada no multilateralismo e em novos equilíbrios globais, possa ainda resgatar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.
“Se conseguirmos juntar a ética, a análise correta dos problemas e o financiamento adequado, poderemos resolver muitos dos desafios que hoje parecem impossíveis”, concluiu.