Legado nefasto de Campos Neto segue intacto no Banco Central

Por Jeferson Miola, em seu blog

Os comunicados e as atas do Banco Central/BC com Gabriel Galípolo não destoam do conteúdo e da forma das explicações divulgadas sob a presidência de Roberto Campos Neto a respeito da política monetária contracionista. O legado nefasto do bolsonarista segue intacto no Banco Central.

A atual diretoria do BC continua fundamentando suas decisões na pesquisa Focus sobre as expectativas futuras e os desejos imediatos do rentismo.

E continua fiel ao pensamento único pró-juros altos, deliberando favoravelmente com a unanimidade de todos os diretores, sem nenhuma dissonância.

Quando os diretores indicados por Lula eram minoria na direção do BC, o argumento para a posição unânime a favor do aumento dos juros era o da necessidade de pragmatismo, pois a divergência seria derrotada pela maioria bolsonarista; e, com isso, o sensível mercado ficaria irado com o governo caso seus nomeados ousassem questionar os dogmas rentistas.

Depois, quando os diretores indicados por Lula formaram maioria no Copom, passou a ser repetido o mantra de que não pode se dar cavalo-de-pau num transatlântico.

E, como a atual diretoria reforçou os pilares da política monetária de Campos Neto e até agora ainda não sinalizou disposição em iniciar nem mesmo uma transição lenta, gradual e segura da queda de juros, o pretexto do transatlântico adquiriu a força de uma lei férrea.

Nas três reuniões do Copom de janeiro, março e maio deste ano já sem Roberto Campos Neto e sob a presidência do Galípolo, a taxa de juros escalou dos 12,25% deixados pelo presidente nomeado por Guedes/Bolsonaro, para 14,75% com Galípolo – aumento de 2,5% da SELIC.

A última vez que a taxa de juros alcançou patamar maior que este no Brasil foi há quase 20 anos, em 2006.

A culpa por isso foi toda descarregada no Campos Neto, o sabotador bolsonarista que teria armado uma armadilha para o governo na reunião de dezembro de 2024. Note-se que na ocasião nenhum diretor indicado por Lula, absolutamente nenhum, nem mesmo Galípolo, se insurgiu para denunciar a suposta “armadilha”. Em nome da unanimidade, claro, e do medo do mercado.

Todos diretores votaram a favor da sinalização absurda de aumento de 1% nas duas reuniões subsequentes, invadindo o mandato da nova direção, que se iniciaria em 1º de janeiro deste ano, e subscreveram os termos do comunicado e da ata daquela reunião.

Enquanto autoridades do governo, políticos e renomados economistas consideraram a atitude de Campos Neto como um ato explícito de sabotagem, nenhum diretor fez uma única objeção, nem mesmo para denunciar a ilegitimidade desta postura, que na prática representou a continuidade da política nefasta que se supunha pertencente a um mandato encerrado, mas que a vida se encarregou de mostrar que segue vigente ainda hoje.

Durante um evento do banco Goldman Sachs nesta segunda-feira, 19/5, Galípolo colocou fim às dúvidas e expectativas que se tinha sobre mudanças desta política. Ele disse que “faz sentido a gente permanecer com estes juros num patamar restritivo e com tempo mais prolongado”.

A partir dessa declaração de Galípolo, soam insustentáveis [ou falsas] as explicações que evocam o pragmatismo para não dissentir, o transatlântico para não mudar e a armadilha do sabotador Campos Neto como justificativa para a continuidade dos juros altos.

Quando esteve no Brasil para seminário do BNDES em março de 2023, o Nobel de Economia Joseph Stiglitz disse que “a taxa de juros do Brasil é chocante. Uma taxa de 13,75%, ou 8% real, é o tipo de taxa de juros que vai matar qualquer economia. É impressionante que o Brasil tenha sobrevivido a isso, que seria uma pena de morte”.

O que Stiglitz diria hoje, quando os juros reais no Brasil com Galípolo passaram à casa dos 10%, dos maiores do mundo?

Sergio Zimerman, CEO da empresa Petz, entende que “a SELIC atual tem muito mais cheiro de veneno do que remédio. Uma taxa de 14,75% coloca o Brasil em um patamar de juros reais de 10% ao ano. E 10% ao ano são um convite para você não fazer absolutamente nada com o dinheiro: não investir em empresa, não investir na Bolsa, não correr riscos, apenas deixar o dinheiro aplicado. É esterilizar um país. Tenho severas dificuldades em entender o porquê de uma taxa de juros dessa magnitude”, declarou [FSP, 20/5].

A continuidade dos juros altos e ainda por um tempo mais prolongado causará para o governo Lula os mesmos efeitos destrutivos que teve aquilo que se dizia ser um ato de sabotagem de Roberto Campos Neto. Com o agravante de que estamos a um ano e meio da eleição de 2026.

*Este artigo não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

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Last Update: 20/05/2025