Por Luís Carlos da Silva
Agora já está claro para todos o grande equívoco cometido pelos que estavam propensos a acreditar que com a proclamação dos resultados da eleição presidencial da Venezuela o conflito entre as forças bolivarianas e seus opositores de extrema direita perderia intensidade e a vida política no país vizinho seguiria seu curso pelas vias normais.
No entanto, de nada adiantou que o Tribunal Superior de Justiça venezuelano auditasse os dados disponíveis do processo eleitoral antes de reconfirmar a vitória de Nicolás Maduro que o CNE (Conselho Nacional Eleitoral) já havia anunciado logo após o encerramento da votação.
Ocorre que aqueles que concordavam com a vitória de Maduro continuam concordando e, por sua vez, os que não aceitavam isso permanecem não aceitando.
A bem da verdade, nada de fato dependia do que as tão faladas atas eleitorais estampassem.
Com atas ou sem atas, a controvérsia se manteria acirrada, porque as causas que estão por trás do questionamento são de outra natureza.
Sendo assim, quais seriam os fatores que impulsam e sustentam toda essa celeuma em torno dos resultados das eleições venezuelanas?
Para encontrar as respostas vai ser preciso levar em conta a velha e conhecida luta de classes.
Neste caso específico, estamos falando de lutas sociais em um de seus níveis mais elevados: a luta de classes no contexto do imperialismo.
É que a confrontação com os interesses das potências imperialistas dá o tom na disputa em torno da Venezuela do momento.
Por isso, é impossível abordar a questão venezuelana sem levar em conta o papel do imperialismo na mesma.
A partir da chegada de Hugo Chávez ao comando do Estado da Venezuela em 1999, o país se tornou um dos alvos preferenciais da política agressiva dos Estados Unidos, com vista a isolá-la do restante da América Latina e, no momento oportuno, desfechar sobre a mesma o tradicional bote aniquilador que costumam aplicar a seus desafetos com menores recursos de defesa.
Portanto, pouco tempo após sua chegada à presidência de seu país, o governo de Hugo Chávez foi vítima de um violento golpe empresarial-militar que o removeu do cargo, colocou-o numa prisão e partiu para um ataque generalizado contra tudo e todos que estivessem associados com o governante deposto.
Porém, em vista do nível de consciência e organização que as bases populares venezuelanas tinham atingido naqueles dois anos e pouco de governo chavista, o povo venezuelano saiu em massa às ruas e pôs fim à farra dos golpistas, restituindo o legítimo governante a seu posto de direito.
Desde então, a Venezuela nunca mais teve nenhum espaço de tempo para levar adiante seu processo de reconstrução nacional em conformidade com as necessidades de sua maioria popular.
Toda a fúria do imperialismo e de seus colaboracionistas internos vem sendo desfechada contra a administração chavista, sem lhe conceder sequer um momento de pausa.
As medidas de agressão mais sórdidas imagináveis foram e são praticadas com vistas a infernizar a vida do povo venezuelano com a expectativa de, com isso, forçá-lo a se revoltar contra seus próprios governantes.
Essa pressão asfixiante se acentuou muito após o falecimento do líder natural do bolivarianismo, Hugo Chávez, e sua substituição no comando do processo por Nicolás Maduro.
A Venezuela passou a sofrer ataques terroristas por parte de grupos delinquenciais a serviço da extrema direita (causadores das conhecidas guarimbas) combinadas com ferrenhas medidas de bloqueio externo para impedir a normalização da vida no país.
Como, mesmo assim, os colaboracionistas internos não conseguiam derrotar o chavismo pelas vias institucionais legais, o imperialismo veio em seu socorro e nomeou um de seus serviçais, Juan Guaidó, como presidente paralelo, em contraposição ao que estava constitucionalmente em exercício.
Precisamos recordar que o governo nazista-bolsonarista do Brasil naquele momento também reconheceu o fantoche Juan Guaidó como o representante legal da Venezuela e passou a seus asseclas o controle da embaixada da Venezuela no Brasil.
Durante este processo de usurpação do poder de representação da Venezuela no exterior, o imperialismo confiscou todas as reservas financeiras venezuelanas no exterior e as entregou para os larápios da quadrilha Juan Guaidó-María Corina Machado, as quais foram, oportunamente, desviadas para sustentar a vida dos quadrilheiros e sua entourage.
Além disso, as autoridades estadunidenses também confiscaram a principal subsidiária da empresa petrolífera venezuelana (CITGO) e a transferiram para o usufruto da quadrilha.
Se juntarmos o criminoso bloqueio visando inviabilizar a vida econômica do país agredido com o roubo descarado de seus recursos para entregá-los aos agentes imperialistas de nacionalidade venezuelana, vamos poder entender como tem sido difícil para o governo bolivariano enfrentar os graves problemas de carência e falta de perspectivas existentes.
A fim de angariar apoio público para sua agressão, o imperialismo recorre amplamente a seu arcabouço midiático e digital.
Em consequência, os povos dos países vizinhos são bombardeados 24 horas por dia com notícias falsas e injúrias contra o processo revolucionário em curso na Venezuela e seus dirigentes.
Devido à quase inexistência de difusão informativa contraposta à do imperialismo, é compreensível que exista nos países latino-americanos vizinhos significativas parcelas de suas populações contaminadas pelas campanhas difamatórias deslanchadas de modo intenso e constante por meio das rádios, televisoras e redes sociais digitais (Whatsapp, Twitter, Facebook, Instagram, etc.) que o imperialismo tem a sua disposição.
Em vista disto, qualquer um que não leve em consideração que os graves problemas da Venezuela se devem em primeiro lugar à atuação criminosa das forças imperialistas estará, na verdade, sendo conivente com o imperialismo.
Mas, se o alguém em questão se apresentar como partícipe do campo popular, de esquerda, então, a coisa deve ser vista como muito mais pavorosa.
É que simplesmente não dá para ser parte do campo popular e de esquerda e não ver no imperialismo a grande desgraça que aflige os povos periféricos do capitalismo.
A luta contra o imperialismo é o que caracteriza a luta de classes a nível internacional nesta fase da história em que estamos.
Aqueles que se mostram reticentes em apoiar a legítima resistência que as forças bolivarianas da Venezuela antepõem às agressões do imperialismo devem ser vistos como cúmplices do imperialismo. E assim deverão ser marcados pela história.
*Luís Carlos da Silva é economista formado pela UFRJ; mestre em linguística também pela UFRJ.
*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.
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