Em entrevista ao The New York Times, seis antigos e atuais oficiais militares de Israel afirmaram ser necessário um cessar-fogo para trazer os 120 reféns sob poder do Hamas na Faixa de Gaza, na contramão do que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu tem defendido. As declarações dadas ao jornal americano escancaram as diferenças de pensamento sobre a guerra entre o governo Netanyahu e o Estado-Maior das Forças Armadas israelenses.
Quatro dos seis oficiais falaram sob condição de anonimato, mas concordando com a posição de Eyal Hulata, um ex-conselheiro da Segurança Nacional, que afirmou ao NYT temer uma “guerra eterna” de Netanyahu.
De acordo com Hulata, o temor dos militares se deve a indisponibilidade do líder da extrema-direita israelense em se comprometer em transferir o controle de Gaza para líderes palestinos alternativos.
A pauta já foi tema de atrito entre o premiê e o ministro da Defesa, Yoav Gallant, que vem do partido Likud, o mesmo de Netanyahu. O primeiro-ministro chegou a ficar furioso com declarações de Gallant e disse não estar pronto “para substituir o Hamas por um ‘Fatahstão’”, num trocadilho irônico com o Fatah, a principal corrente que compõe a Autoridade Palestina.
Para Hulata, além do retorno dos reféns, o cessar-fogo teria poder de dissuadir uma guerra maior com o Hezbollah, o movimento xiita libanês que tem estado envolvido em uma luta de baixa intensidade com Israel desde outubro.
“Os militares apoiam plenamente um acordo de reféns e um cessar-fogo”, afirmou Eyal Hulata. “Eles acreditam que podem sempre voltar atrás e enfrentar o Hamas militarmente no futuro”, disse.
“[Os militares] compreendem que uma pausa em Gaza torna mais provável a desescalada no Líbano. E eles têm menos munições, menos peças de reposição, menos energia do que tinham antes, por isso também pensam que uma pausa em Gaza nos dá mais tempo para nos prepararmos para o caso de explodir uma guerra maior com o Hezbollah”, afirmou o ex-conselheiro da Segurança Nacional.
Conhecida coletivamente como o Fórum do Estado-Maior, a liderança militar de Israel é formada por cerca de 30 generais seniores, incluindo o chefe do Estado-Maior, o tenente-general Herzi Halevi; os comandantes do exército, da força aérea e da marinha; e o chefe da inteligência militar.
Os generais consideram que as Forças Armadas de Israel estão subequipadas para novos combates após a mais longa guerra de Israel em décadas.
O distanciamento entre a cúpula militar e os desejos de Netanyahu tem ficado mais evidente nas últimas semanas.
Até pouco tempo, os militares defendiam publicamente que era possível alcançar simultaneamente os dois principais objetivos de guerra do governo: derrotar o Hamas e resgatar os reféns sequestrados pelo Hamas e seus aliados durante o ataque de 7 de outubro a Israel. Agora, o alto comando militar concluiu que os dois objetivos são incompatíveis entre si, vários meses após os generais começarem a ter dúvidas.
Recentemente, o principal porta-voz das Forças Armadas de Israel, o contra-almirante Daniel Hagari, contrariou Netanyahu e seus asseclas de extrema direita ao afirmar que é impossível destruir o Hamas.
“Aqueles que pensam que podemos fazer com que o Hamas desapareça estão enganados”, disse Hagari em 19 de junho, em meio as negociações avançadas para um cessar-fogo.
“O Hamas é uma ideia. O Hamas é um partido político. Está enraizado no coração das pessoas”, completou.
Sugerir o contrário, advertiu Hagari em uma crítica velada a Netanyahu, era “atirar areia nos olhos do público”.
“O que podemos fazer é criar outra coisa, algo que o substitua, algo que faça a população saber que outra pessoa está distribuindo comida, outra pessoa está prestando serviços públicos. Quem é esse alguém, o que é essa coisa, isso cabe aos responsáveis políticos decidirem”, afirmou.