Embora o tarifaço imposto por Donald Trump não tenha recaído sobre todos os produtos exportados pelo Brasil aos Estados Unidos — abarcando cerca de 36% do total —, os setores atingidos tiveram impacto considerável em suas contas. A instabilidade do presidente estadunidense e a arbitrariedade de seus atos deixam o terreno ainda mais incerto, de maneira que não se sabe se ele recuará também em relação a esses itens, como fez com outros países.

Por ora, muitos empresários têm buscado remanejar seus negócios e dado férias coletivas, além de haver demissões ainda pontuais, opções que acabam prejudicando a classe trabalhadora.

Para evitar o pior, o governo Lula lançou uma série de medidas na semana passada — enviadas para a aprovação do Congresso — com o objetivo de ajudar o setor produtivo. A principal foi o crédito de R$ 30 bilhões, a serem concedidos para certos setores, sob a condição de que os empregos sejam mantidos.

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Além disso, nesta sexta-feira (22), o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) lançou uma linha de crédito adicional de R$ 10 bilhões focada nas empresas afetadas pela alíquotas menores do que 50%. Entre os setores beneficiados estão os de suco de laranja, peças de aeronaves, petróleo e derivados e fertilizantes.

Tais medidas criam condições melhores para empresários e trabalhadores, mas o futuro das exportações brasileiras ainda é uma incógnita que depende não de fatores técnicos claros, mas dos humores e interesses do republicano, que não tem prezado pelo bom senso.

“Com relação aos impactos do tarifaço, primeiro é bom lembrar que, como tem sido costumeiro, Trump voltou atrás em vários aspectos, tanto porque o governo brasileiro se posicionou de maneira muito incisiva, deixando claro que não ia aceitar os termos da negociação que Trump propunha — que afinal, em última instância, seria uma intervenção no Supremo —, deixando claro que poderia tomar medidas de represália caso o governo dos EUA insistisse nessas condições”, avalia Marcelo Manzano, professor do Instituto de Economia da Unicamp.

Além disso, ele acrescenta que o governo Trump também teve de ceder devido à pressão dos empresários americanos estadunidenses de vários setores que seriam fortemente prejudicados pelas tarifas, além da própria população. Ele cita como exemplo os casos do suco de laranja e da Embraer. “Esta empresa tem uma subsidiária nos Estados Unidos que gera uma quantidade importante de empregos, atendendo o mercado americano de aeronaves de menor porte. Então, as medidas de Trump fariam mal ao Brasil, mas também aos Estados Unidos”.

Ainda que a tarifa tenha deixado de incidir sobre boa parte das exportações, Manzano salienta que os setores que continuam sobretaxados impactam na economia e no mercado de trabalho por serem de maior valor agregado. É o caso, por exemplo, das indústrias de móveis, motores, máquinas e peças que servem de componentes para outras indústrias. “Ou seja, apesar de as tarifas maiores atingirem poucos setores, são setores importantes, não exatamente por serem grandes, mas por serem estratégicos e terem melhores empregos”, argumenta.

Por isso, salienta, “nesses segmentos já temos notícias de empresas fechando, ou dando férias coletivas. Claro que justamente para mitigar esse problema é que o governo está se propondo a socorrer as empresas”.

Manzano considera bastante positivas as iniciativas anunciadas pelo governo Lula, em especial os créditos e as isenções, bem como as compras governamentais. “A possibilidade de o governo usar recursos para adquirir produtos — desde alimentícios até móveis e equipamentos — é muito importante. O governo tem sinalizado que essa será uma política principalmente para as empresas médias e de menor porte”.

Ele ressalta, no entanto, a necessidade de que esse conjunto de medidas venha associado à garantia da manutenção dos empregos. “Esperamos que não ocorra o que aconteceu com a política de desoneração tributária adotada em 2013, quando mesmo tendo isenções, muitas empresas acabaram demitindo — e, pior, não apenas não mantiveram os empregos como, ainda, demitiram mais do que contrataram nos anos seguintes”.

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Last Update: 22/08/2025