A prévia da inflação oficial no Brasil, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo 15 (IPCA-15), trouxe um alívio parcial ao retornar ao teto da margem de tolerância estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) em janeiro de 2025. No acumulado de 12 meses, o indicador desacelerou de 4,71% em dezembro para 4,50%, conforme dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nesta sexta-feira (24). Apesar disso, o resultado mensal de 0,11% superou as expectativas do mercado, que projetava leve deflação devido ao alívio pontual nas contas de luz com o desconto do bônus de Itaipu.
Embora o retorno ao teto da meta seja positivo, analistas apontam que os números do IPCA-15 em janeiro trazem sinais preocupantes. O “núcleo da inflação” — indicador que exclui itens voláteis como alimentos e combustíveis — teve alta de 0,67%, a maior desde fevereiro de 2023. No acumulado em 12 meses, o núcleo chegou a 4,43%, reforçando a preocupação com uma inflação de demanda, corroborada pelo comportamento da inflação de serviços.
Alimentos pressionam a inflação
Dos nove grupos de produtos e serviços pesquisados pelo IBGE, oito apresentaram alta em janeiro. O grupo alimentação e bebidas liderou as variações, com aumento de 1,06%, contribuindo com 0,23 ponto percentual para o IPCA-15. Entre os produtos, o tomate registrou elevação de 17,12%, enquanto o café moído subiu 7,07%. Esses itens, essenciais no orçamento das famílias, seguem como os principais vilões da inflação.
A pressão inflacionária sobre alimentos levou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a convocar uma reunião com ministros para discutir medidas que possam conter os preços dos gêneros alimentícios. Entre as estratégias cogitadas estão o fortalecimento da produção local e possíveis subsídios para cadeias específicas de alimentos.
Projeções de mercado e desafios para o BC
Apesar da trégua momentânea, o mercado financeiro manteve um tom pessimista em relação ao cumprimento da meta de inflação em 2025. De acordo com o Boletim Focus divulgado pelo Banco Central (BC) na última segunda-feira (20), a estimativa para o índice oficial de preços ao fim de 2025 subiu para 5,08%, marcando a 14ª semana consecutiva de revisões para cima.
Entre os fatores que pressionam a inflação estão a valorização do dólar e o aquecimento da atividade econômica, impulsionado por medidas fiscais de estímulo. Para analistas, o aumento das projeções indica um cenário mais desafiador para o BC, que passa a operar sob o novo regime de metas contínuas.
Novo regime de metas contínuas
Em 2025, o Banco Central começa a perseguir a meta de inflação de maneira contínua, abandonando o modelo de ano-calendário (janeiro a dezembro). Pelo novo sistema, a meta é considerada descumprida caso o índice acumulado em 12 meses permaneça fora do intervalo de tolerância (1,5% a 4,5%) por seis meses consecutivos.
Esse modelo traz maior flexibilidade ao monitoramento da inflação, mas também pode elevar a pressão sobre o BC para comunicar de forma clara suas ações. Em dezembro de 2024, o índice oficial fechou em 4,83%, acima do teto da meta, e a continuidade de fatores inflacionários pode dificultar o cumprimento do novo regime.
Perspectivas para a política monetária
A próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), marcada para a próxima quarta-feira, será essencial para definir os rumos da taxa Selic. Em dezembro, o Copom já havia sinalizado novas elevações, com a possibilidade de ajustes de 1 ponto percentual em janeiro e março.
Embora o resultado do IPCA-15 não altere significativamente as expectativas do mercado, a alta do núcleo da inflação e a persistência de pressões de demanda podem servir de argumento a uma atuação mais contundente do BC, que ignora as pressões do governo para ceder ao mercado financeiro altas taxas de juros.
O retorno do IPCA-15 ao teto da meta de inflação é um sinal positivo, mas não suficiente para dissipar as preocupações com a dinâmica de preços no Brasil. A combinação de pressões sobre alimentos, alta do núcleo da inflação e projeções de mercado mais elevadas aponta para um ano de desafios para o Banco Central e para a gestão econômica do governo. A capacidade de articulação entre política monetária e fiscal será fundamental para garantir o controle da inflação e o retorno à estabilidade econômica.