O aumento dos preços dos alimentos tem impactado significativamente o orçamento das famílias brasileiras, com efeitos mais intensos para aqueles com menor poder aquisitivo.

De acordo com um estudo exclusivo do economista André Braz, da Fundação Getulio Vargas (FGV), os preços de itens essenciais têm absorvido uma fatia crescente da renda familiar, especialmente entre os brasileiros que ganham até 1,5 salário mínimo.

Em 2018, a fatia do orçamento destinada à alimentação por famílias de baixa renda era de 18,44%. Atualmente, esse valor alcança 22,61%, mesmo com o reajuste do salário mínimo para R$ 1.518.

O estudo aponta que, desde 2020, o setor de alimentação residencial acumula um aumento de 55,87%, bem superior à inflação de 33,46% registrada pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) no mesmo período.

O economista André Braz explica que a alta dos preços de itens básicos compromete cada vez mais o orçamento das famílias. “Como é um consumo de itens básicos, você pode até substituir itens da alimentação, mas não deixa de comprar. A despesa vai comprometendo parte cada vez maior do orçamento”, afirmou.

A inflação dos alimentos tem sido um dos fatores que contribuíram para a queda na popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O professor Luiz Roberto Cunha, da PUC-Rio, observa que, apesar de uma desaceleração na alta dos preços, o impacto da inflação sobre a população continua significativo.

“Alimentação subiu muito desde 2020, tem ficado acima da inflação. Mesmo se parar de subir, está num patamar alto. Qualquer alta tem peso maior no bolso do consumidor. A carne deve subir menos este ano, 6%, mas depois de já ter aumentado 20% no ano passado”, disse Cunha.

Além disso, a economista Maria Andreia Parente, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), destaca que a elevação do preço dos alimentos tem um impacto desproporcional nas famílias de baixa renda.

Para aquelas com uma renda mensal de até R$ 2.202,02, o peso dos alimentos no orçamento pode chegar a 29%. Esse aumento acentuado nos preços de produtos essenciais como carne, frango, leite, ovos e pão afeta diretamente os mais pobres, tornando a situação ainda mais desafiadora para esses grupos.

Embora o impacto seja menor para famílias de maior poder aquisitivo, o aumento no custo de vida também afeta esse segmento.

Para as famílias com renda superior a 30 salários mínimos, o percentual do orçamento destinado à alimentação aumentou de 9,23% em 2018 para 11,32% atualmente. Em termos absolutos, o aumento de preços atinge a população em sua totalidade.

Os fatores que impulsionaram esse cenário incluem a desvalorização do real frente ao dólar, que se apreciou em 27% em 2022, e as condições climáticas extremas associadas aos fenômenos El Niño e La Niña. Esses fatores afetaram a produção de alimentos essenciais, como o café, que subiu 50,35%, e a carne, que teve um aumento de 20%. André Braz descreve essa situação como uma “tempestade perfeita”, com múltiplas variáveis impactando o mercado.

Os fenômenos climáticos têm se tornado mais frequentes, o que dificulta o controle da inflação dos alimentos.

“Normalmente, boa parte desses aumentos acumulados na carne, no leite, em verduras, legumes e frutas teriam sido devolvidos. Mas não é o que está acontecendo”, comentou Braz.

Isso representa um desafio adicional para o Banco Central, já que a inflação alimentícia é menos sensível à alta das taxas de juros, limitando a eficácia da política monetária.

A retomada de estoques reguladores, como o milho, foi uma das medidas adotadas pelo governo para tentar aliviar os impactos da inflação. No entanto, especialistas como o professor Cunha afirmam que essa medida tem efeitos limitados, especialmente para a carne, que não pode ser regularizada com estoques.

No campo da pesquisa, a Embrapa, em parceria com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), está investindo em sementes de milho com maior tolerância a condições climáticas adversas, como seca, calor excessivo e alagamentos.

Segundo Juliana Yassitepe, pesquisadora da Embrapa Agricultura Digital, os fenômenos climáticos extremos, como geadas em Goiás, aumentam a dificuldade de prever e combater pragas, agravando a situação.

Diante desse cenário, o impacto da inflação alimentar sobre as finanças domésticas se torna uma preocupação central para as famílias brasileiras.

A combinação de variáveis econômicas e climáticas exige ações coordenadas tanto do governo quanto do setor produtivo para minimizar os efeitos negativos dessa realidade.

A adoção de políticas públicas eficazes será essencial para garantir a estabilidade econômica e a segurança alimentar, especialmente para as camadas mais vulneráveis da população.

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Last Update: 24/02/2025