Índia e Paquistão deram vazão às suas rixas históricas e avançaram rumo a um conflito aberto, com o país governado por Narendra Modi lançando ataques contra o vizinho nesta semana. A medida, segundo Nova Déli, foi uma retaliação a um ataque supostamente terrorista promovido pelo Paquistão. Até agora, quase 40 pessoas já morreram, a população da Caxemira se vê encurralada pelo corte no fornecimento de itens básicos, e o mundo volta a se alarmar pelo risco de uma guerra entre duas potências nucleares.

Os dois países do sul asiático têm motivos bem próprios para o conflito. Desde que foram separados pelo fim da colonização britânica, ainda no final da década de 1940, os momentos de calmaria entre os dois foram raros. Ambos duelam – ora com maior, ora com menor intensidade – por território. 

Mas esses motivos locais não são os únicos que explicam totalmente o conflito e, principalmente, o estado atual da relação entre os países. Inseridos em uma ordem internacional cada vez mais multifacetada, marcada por instabilidade geopolítica e por episódios cada vez mais recorrentes de conflito armado, Índia e Paquistão são, também, um reflexo da disputa global entre Estados Unidos e Rússia. 

A desarmonia é uma constante, mas o que, de fato, mudou nos últimos anos na região foi o rascunho das relações militares. Em outros termos, a Índia foi deixando de ser um gigante tradicionalmente neutro e passou a servir como ponta de lança dos Estados Unidos – seja por proximidade militar, seja por interesse comercial. O Paquistão, por sua vez, simpatiza com o poderio econômico e militar da China, e vem trocando os americanos pelos chineses na compra de artefatos militares.

Foi Pequim que forneceu cerca de 80% das armas do Paquistão nos últimos quatro anos, segundo o Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo. O percentual é mais que o dobro do registrado na década de 2000, quando o fornecimento não passava dos 40%.

Índia x Paquistão, mais um ringue de disputa entre Washington e Pequim

A China e o Paquistão se reconheceram mutuamente em 1951. Era um mundo marcado pela criação recente da República Popular da China (1949) e pela independência paquistanesa (1947). Mas poucas vezes estiveram tão próximos como agora. 

Já a Índia, segundo o mesmo instituto, foi ampliando a sua compra de armas a países como Estados Unidos, França e Israel, que, hoje em dia, fornecem mais da metade das armas para o país com a maior população do mundo. Há vinte anos, quase metade das armas mais importantes da Índia tinha como origem a Rússia. 

No campo comercial, Estados Unidos e Índia anunciaram, no final de abril, que chegaram aos termos finais para um acordo comercial. Essa é uma forma de evitar as tarifas anunciadas pelo presidente Donald Trump no final do mês passado. J.D. Vance, o vice-presidente dos EUA, chegou a dizer que o “futuro do século XXI será determinado pela parceria entre EUA e Índia”. Se os dois países não trabalharem juntos, segundo Vance, “o século XXI será um período sombrio para o mundo”. 

Ainda não foram divulgados os detalhes do acordo, mas Vance sinalizou que EUA e Índia devem coproduzir “muitos equipamentos de defesa”, fazendo com que o sul asiático permaneça seguro “contra qualquer potência hostil”. Um recado direto à China. 

Pequim, por sua vez, tem um interesse estratégico em manter a sua dominância na região. E esse domínio, para ser plenamente exercido, passa por evitar um crescimento demasiado rápido da Índia. Exemplo disso é o caso do uso de energia limpa. 

A China é a principal produtora regional de painéis solares e baterias de veículos. Mas a Índia, que precisa abastecer com energia sua incomparável população de 1,4 bilhão de habitantes, é um cliente rebelde dos chineses. Ainda fortemente dependente de carvão, a Índia depende da compra de módulos solares chineses, ao mesmo tempo que faz as contas para produzi-los de forma autônoma. É assim que o governo Modi se vê obrigado a conceder subsídios para que as empresas locais produzam células solares e baterias, ao passo que tenta restringir produtos estrangeiros em projetos de energia.

Mas a China teme o avanço indiano não apenas na arena comercial: o gigante asiático também divide com a fronteira da Caxemira com a Índia e o Paquistão. Pequim controla Aksai Chin e o Vale Shaksgam, no noroeste da região. A primeira área é fundamental para conectar por terra o Tibete e Xinjiang, regiões autônomas chinesas. 

Pelo ângulo chinês, a estabilidade na Caxemira também é importante pelo fato que a região abriga o Corredor Econômico China-Paquistão, uma das joias da Rota da Seda chinesa. Um eventual descontrole do conflito na região teria, assim, consequências estratégicas, financeiras e militares. 

Pequim, ao menos no discurso, pede moderação. Mas é mais crítica em relação à Índia do que ao Paquistão. “Consideramos lamentável a ação militar lançada pela índia nesta manhã e pedimos contenção a ambas as partes”, disse nesta quarta-feira 7 o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, Lin Jia. Dizendo ser contrário a todas as formas de terrorismo, o governo chinês pontuou que “manter a estabilidade regional é do interesse comum de todos”.

Trump, por sua vez, lançou mão do seu desejo de mediar os conflitos do mundo atual, dizendo hoje que quer ver “isso parar”. “Se eu puder fazer alguma coisa para ajudar, estarei lá.”

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Last Update: 07/05/2025