Indignante, inconsequente e inaceitável!

por Leonardo Santos

O governador do Rio de Janeiro desferiu um forte golpe na sociedade fluminense. É a sensação que fica de sua entrevista concedida pelo governador do estado do Rio de Janeiro, Luís Carlos Castro, ao Jornal O Globo, na edição de domingo, 22/12/2024. Nela o mandatário estadual afirma não ter responsabilidade alguma com a segurança pública. Com a desfaçatez habitual atribui ao prefeito municipal e ao governo federal responsabilidades pelo grave momento vivenciado no estado. É gritante, por exemplo, o aumento de mais de 50% de roubos de veículos e de cargas, além de outros delitos. Mas o problema, para ele, se combate apenas nas fronteiras. Em um festival de esquivas, dignas de um gorila em uma loja de porcelanas, preocupa-se muito mais em proferir conteúdos autoritários do que dialogar com a população apresentando iniciativas palpáveis para a matéria.

O governador em seu delírio escorregadiço, também fez sobrar para o Poder Judiciário.  A busca por mitigar torturas através das audiências de custódia, por exemplo, é interpretada como uma ameaça à sua noção de ordem pública. A ADPF 635 é outra medida criticada. Segundo seu ponto de vista, há uma relação entre a redução da letalidade policial no Rio e o aumento da criminalidade. “Não é que a polícia precise matar mais, ela precisa poder fazer o trabalho dela”, diz ele, assumindo que a consequência acaba sendo aumentar a letalidade. Mas ele jura que não é o objetivo, muito embora avalie os governadores de São Paulo e de Goiás positivamente, diante do aumento da letalidade policial em seus respectivos estados. Uma indecência para com o discernimento e paciência alheios.

Inconsequentemente, o governador (?) assume com todas as letras que seu repertório de ações na área de segurança pública é restrito. Seu horizonte mira apenas nas operações policiais em favelas. Este último, aliás, qualificado como “o trabalho” da Polícia. Trabalho este que, assume Castro, aumenta a letalidade policial. Letalidade esta, como sabemos, que atinge jovens pretos e pardos, entre 15 e 29 anos, moradores de periferias. Estes últimos, segundo os dados comutados pelo Atlas da Violência, configuram o público preferencial desta mesma letalidade. Para as cucuias, portanto, foram enviados todos os esforços e gastos com equipamentos, tecnologias e capacitação de agentes para implementar iniciativas de inteligência policial para prevenção ou resolução de crimes.

A entrevista do sr. Luís Carlos Castro, no que concerne a temática da segurança pública no Rio de Janeiro, é inaceitável. Que ele queira seguir bajulando o ex-presidente e fazer oposição ao atual, isso é um problema dele. O nosso problema é que seus 43 mil policiais que, segundo afirma, recebem o terceiro melhor salário do país estão à deriva. Que o digam pessoas que perdem seus bens e se sentem abandonados por estas forças. Sob a batuta deste senhor, estão perdendo a disputa pela manutenção da ordem pública. Enquanto vemos a segurança pública afundando, são mantidas secretarias de policiais isoladas em si mesmo, sem menor menção de unificar esforços. A Secretaria de Segurança Pública, recriada há pouca, segue operando no vazio. Com orçamento reduzido e com um secretário sem autoridade no campo, parece estar fadada a ser mais um entre os vários cabides de emprego que aquece o apetite voraz base de apoio do governador.

Não me parece haver contradição entre fazer oposição e não negligenciar eventuais apoios que o governo federal, ou mesmo prefeituras que não se alinhem ao seu espectro político, possam e devam dar. Afinal, é com inteligência e perspicácia que se deve governar. Mas, infelizmente, estes parecem ser dimensões que faltam, em muito, ao modelo de gestão em operação no estado do Rio de Janeiro há algum tempo. Em especial, no que concerne a segurança pública.  

Leonardo Santos – Antropólogo e Professor do Depto de Segurança Pública/UFF

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Last Update: 23/12/2024