Em resposta às sanções dos EUA, empresas chinesas investem em chips próprios para manter a liderança em inteligência artificial


Em meio a uma escalada das restrições impostas pelos Estados Unidos sobre a exportação de chips avançados, grandes empresas tecnológicas chinesas estão acelerando esforços para substituir componentes importados por alternativas fabricadas dentro do país. O objetivo é manter o ritmo do desenvolvimento de inteligência artificial (IA) sem depender da gigante norte-americana Nvidia. Segundo informações apuradas junto ao setor, empresas como Alibaba, Tencent e Baidu já iniciaram testes com semicondutores locais, buscando atender à crescente demanda interna por soluções em IA.

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A mudança foi intensificada após o governo anterior dos EUA, liderado por Donald Trump, reforçar no mês passado as proibições à venda do chip H20 — versão adaptada pela Nvidia para cumprir exigências anteriores do governo Joe Biden.

Estoques se esgotam e pressão aumenta

Relatos de fontes próximas ao setor indicam que os estoques atuais de chips da Nvidia devem durar até o início de 2025. Como encomendas novas demoram entre três e seis meses para serem entregues, e não há garantia de que a empresa consiga lançar um modelo compatível com as novas regras de exportação, as empresas chinesas enfrentam uma corrida contra o tempo.

Shen Dou, responsável pelo grupo de IA em nuvem da Baidu, afirmou recentemente que a empresa conta com várias opções de chips para a etapa de inferência — fundamental para a aplicação prática de modelos de IA — capazes de substituir os da Nvidia.

“Acreditamos que, com o tempo, os chips desenvolvidos localmente, aliados a softwares cada vez mais eficientes, formarão uma base sólida para a inovação no ecossistema de IA da China”, destacou Shen.

Estratégias ajustadas para lidar com nova realidade

Nas últimas semanas, executivos das maiores empresas tecnológicas do país têm sinalizado mudanças em suas estratégias de fornecimento. Eddie Wu, CEO da Alibaba, mencionou que a companhia está “explorando ativamente soluções diversificadas para atender à crescente demanda dos clientes”. Já Martin Lau, presidente da Tencent, afirmou que a empresa está otimizando o uso de seus chips existentes e avaliando opções alternativas.

“Temos estoque suficiente de chips de alta performance para treinar nossos modelos por algumas gerações”, garantiu Lau, acrescentando que a Tencent pode recorrer a “outros processadores” para suprir a crescente necessidade de inferência impulsionada pela popularização da IA no país.

Huawei surge como principal alternativa, mas enfrenta obstáculos

Um instituto de estudos ligado ao Ministério da Segurança do Estado chinês ressaltou que, embora as sanções americanas sejam desafiadoras, elas também “estimularam uma onda de inovação independente em chips de IA de alto desempenho, com a série Ascend da Huawei como principal exemplo.”

De acordo com o China Institutes of Contemporary International Relations, entidades chinesas já estão adotando amplamente os chips da Huawei. Inicialmente, eram principalmente empresas estatais, como a China Mobile, e setores estratégicos como defesa, saúde e finanças. Agora, espera-se que outras gigantes da tecnologia passem a utilizar esses componentes. No entanto, muitas evitam falar publicamente sobre os testes com os chips Ascend, temendo represálias dos EUA, que alertaram que seu uso “em qualquer lugar do mundo” pode resultar em penalidades criminais.

Nvidia busca solução, mas enfrenta limitações técnicas

Analistas da GF Securities estimam que a Nvidia possa iniciar a produção de um novo chip compatível com as regras de exportação dos EUA a partir de julho. Porém, o componente, baseado na arquitetura Blackwell, não incluirá memória de alta largura de banda (HBM), peça essencial para o processamento rápido de grandes volumes de dados. Além disso, ainda não está claro se ele contará com a tecnologia NVLink, usada para conectar chips de forma ultrarrápida.

Durante uma conferência recente, Jensen Huang, CEO da Nvidia, admitiu que a empresa ainda não tem uma resposta definitiva para o mercado chinês: “No momento, não temos nada”, afirmou.

Migração traz custos elevados e complexidade técnica

O processo de transição para chips locais é complicado. Adaptar códigos desenvolvidos para a plataforma CUDA, da Nvidia, para o ambiente CANN, da Huawei, exige tempo e grande apoio de engenheiros. Um executivo de uma grande empresa estimou que essa migração poderia causar um atraso de cerca de três meses no desenvolvimento de projetos de IA.

Diante disso, muitas companhias estão optando por uma estratégia híbrida: continuar utilizando chips da Nvidia para o treinamento de modelos, enquanto adotam processadores locais para a inferência, área cuja demanda explodiu na China.

Enquanto a Huawei tenta expandir sua capacidade produtiva por meio de parceiros e da construção de uma nova fábrica, a oferta ainda não acompanha a alta procura. Outras empresas chinesas, como Cambricon e Hygon, também estão sendo testadas pelas grandes techs. Além disso, Baidu e Alibaba estão investindo no desenvolvimento próprio de chips, visando reduzir a dependência externa.

A disputa por autonomia tecnológica está transformando o cenário global de semicondutores. Enquanto a China acelera na busca por alternativas domésticas, empresas ocidentais observam com atenção os desdobramentos de uma guerra comercial que promete moldar o futuro da inteligência artificial no mundo inteiro.

Com informações de Financial Times*

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Last Update: 01/06/2025