O agressor que há dois anos tentou assassinar a ex-presidenta da Argentina Cristina Kirchner afirmou nesta quarta-feira que ter praticado “um ato de justiça”.
“A Dra. Kirchner é corrupta, rouba e prejudica a sociedade”, alegou perante o tribunal Fernando Sabag Montiel, de 37 anos, que em 1º de setembro de 2022 acionou o gatilho a poucos centímetros da cabeça da então vice-presidenta, sem que as balas saíssem.
O julgamento está centrado no agressor, em sua ex-namorada e no empregador de ambos como vendedores ambulantes, sem tratar de supostos autores intelectuais ou de um possível apoio financeiro, pistas que a ex-presidenta solicitou que sejam investigadas.
“A ideia era matar Cristina”
A sessão, que durou sete horas, terminou na tarde desta quarta, e a segunda ocorrerá na semana que vem.
O Tribunal Oral Federal 6 leu as acusações da autora e da promotoria, que citaram mensagens de texto trocadas pelos acusados.
Nelas, ficou evidente que os acusados conseguiram uma arma ilegal, que foi usada no ataque, tentaram alugar uma casa perto da residência da ex-presidenta e procuraram uma oportunidade para executá-la.
“Eles estavam plenamente conscientes do que estavam fazendo e de suas possíveis consequências”
Durante as audiências que ocorrerão semanalmente, cerca de 300 testemunhas serão ouvidas, incluindo a própria Kirchner, em um processo cuja estimativa de duração é de um ano.
Os acusados
O agressor resultou ser um vendedor de doces que naquela noite atacou Kirchner em frente à casa dela em Buenos Aires, misturado entre centenas de simpatizantes que foram apoiá-la quando estava sendo julgada por suposta fraude durante sua Presidência.
Sabag Montiel apertou o gatilho duas vezes sem que as balas saíssem e foi preso no local.
No julgamento, o agressor se mostrou calmo e disposto a se explicar em suas respostas, nas quais se definiu como “apolítico” e “cristão”.
“Apesar de ter tentado matar alguém, sem ser hipócrita, sou cristão”
Questionado sobre as motivações que o levaram a planejar e executar o ataque, respondeu que “os objetivos têm mais um tom pessoal do que um fim que possa beneficiar um setor político”.
Sua então namorada, Brenda Uliarte, que o acompanhou até as proximidades do local do incidente, foi presa dias depois, assim como Nicolás Carrizo, empregador de ambos como vendedores de doces e apontado como “idealizador”.
Sabag Montiel, que tem tatuagens com simbologia filonazista, mostrou uma personalidade “narcisista” e um discurso “extravagante”, segundo perícias.
Uliarte é acusada de ser a “coautora” e também foi apontada como incentivadora, enquanto Carrizo é acusado de ser cúmplice.
“Vou com a pistola para a casa de Cristina e vou dar um tiro nela”
Após o ataque fracassado, Carrizo se vangloriou de que seu “empregado” havia realizado o ataque. “Eu o aplaudo, ele esteve a um segundo de ser um herói nacional”.
Impacto político
Após o atentado, Kirchner recebeu mensagens de solidariedade de todo o mundo.
Também houve uma suspeita sobre a veracidade do ataque, posteriormente dissipada pelas perícias.
Em meio às condenações públicas, adversários políticos, como a atual ministra de Segurança, Patricia Bullrich, optaram pelo silêncio.
Seu ex-chefe de campanha e deputado Gerardo Milman é uma das pessoas que Kirchner pediu para investigar, depois de ele ter sido ouvido falando sobre o ataque antes que ocorresse. Uma perícia de seu telefone ainda está pendente.
O atentado “foi um antes e um depois, não porque tenha mudado a política, mas porque evidenciou claramente que a polarização permite, em certo setor, que não haja nenhum tipo de condenação quando o atacado é o outro”, disse à AFP Iván Schuliaquer, cientista político da Universidade Nacional de San Martín.