Ações para Transmissão de Patrimônio

por Luís Carlos da Silva

Historicamente, o mercado de capitais brasileiro sempre foi caracterizado por uma estrutura de capital concentrada, com famílias ou pequenos grupos detendo o controle das empresas. A partir da década de 1960, políticas governamentais incentivaram a abertura de capital, visando direcionar a poupança privada para o mercado de valores mobiliários.

Mesmo com a entrada de novos investidores, os acionistas fundadores mantiveram, em grande parte, o controle das companhias. Em 1996, em média, 74% do capital votante de 203 das 325 companhias analisadas estavam concentrados nas mãos de um único acionista.

Esses controladores acumulavam os benefícios privados. A abertura de capital não necessariamente resultou em uma diluição do poder dos controladores, mas apenas em uma diversificação das fontes de capital e em maior liquidez para os acionistas preexistentes.

A transmissão de patrimônio por meio de ações tem sido uma estratégia comum. A detenção de ações de empresas sob controle familiar facilita sua preservação e sucessão patrimonial ao longo das gerações.

No entanto, a concentração acionária não raramente leva a disputas familiares e problemas na governança corporativa. Ocorre quando há divergências sobre a continuidade dos seus negócios.

Além disso, a tributação sobre heranças, mesmo em ações, é regida pelo Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD). As alíquotas e isenções variam conforme a legislação estadual, impactando a estratégia de sucessão e a preservação do patrimônio familiar.

Até meados da década de 1960, o mercado era pouco relevante na economia do país. Fatores como a alta inflação, a precária organização das bolsas, o monopólio dos corretores públicos, a falta de legislação adequada e os ônus da Lei da Usura (limite de 12% aa para os juros) inibiam o desenvolvimento do mercado financeiro.

A partir de 1964, o governo militar implementou reformas para reestruturar o mercado de capitais. O Programa de Ação Econômica do Governo (PAEG) visava à estabilização e ao desenvolvimento da economia com foco no aperfeiçoamento do sistema financeiro.

Foram promulgadas leis para incentivar investimentos no mercado, criar o Sistema Financeiro de Habitação, introduzir o conceito de Sociedade de Capital Aberto e estruturar o sistema financeiro nacional. Apesar das reformas, a cultura de investimentos em renda variável era incipiente, com a população preferindo investimentos em imóveis e moedas estrangeiras.

A partir dos anos 2000, o mercado passou por um processo de modernização, com a criação de segmentos de listagem diferenciados na BM&FBovespa (Nível 1, Nível 2 e Novo Mercado) e a intensificação da participação de investidores institucionais e estrangeiros. A CVM ganhou maior autonomia e foram implementadas iniciativas de educação financeira.

A cultura de investimentos no Brasil ainda é marcada pela preferência por investimentos em renda fixa e no mercado imobiliário. Reflete a histórica instabilidade cambial, inflacionária e nos juros. Há falta de confiança em ações.

Essa tendência é atribuída a diversos fatores, entre as quais, a experiência de décadas de alta inflação geradora de uma aversão ao risco e uma busca por investimentos de proteção contra a perda do poder de compra. A complexidade do mercado de ações e a falta de acesso à informação desencorajavam as Pessoas Físicas a investir em renda variável no Brasil.

No entanto, nas últimas décadas, algumas mudanças importantes têm ocorrido, indicando uma evolução gradual da cultura de investimento. A ascensão da classe média e o aumento da renda disponível impulsionaram a demanda por produtos de investimento mais especulativos.

A internet e as novas tecnologias facilitam o acesso à informação sobre o mercado financeiro, enquanto iniciativas de Educação Financeira têm contribuído para aumentar o conhecimento da população sobre investimentos. A estabilidade econômica, alcançada nas últimas décadas com o controle da inflação, reduz a aversão ao risco e abre espaço para investimentos em renda variável.

Fernando Nogueira da Costa – Professor Titular do IE-UNICAMP. Baixe seus livros digitais em “Obras (Quase) Completas”: http://fernandonogueiracosta.wordpress.com/ E-mail: [email protected]

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Last Update: 26/12/2024