Determinado a avançar na marcha da guerra comercial contra a China e outros atores da geopolítica, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou importantes marcos no processo de subida das tarifas de importação para o seu país, nesta quinta-feira 27.
As tarifas de 25% sobre produtos do Canadá e México, por exemplo, que já tinham sido anunciadas pelo republicano, agora têm data para entrar em vigor: a próxima terça-feira, 4 março, conforme informou o republicano nesta quinta. A data, aliás, não servirá apenas para inaugurar o aumento nos custos das importações canadenses e mexicanas para os EUA, já que, segundo Trump, a China também passará a ser taxada com uma tarifa adicional de 10% nesse mesmo dia.
Trump, ao justificar o movimento, usou o argumento de que o contrabando de drogas ilícitas para os EUA, a exemplo do fentanil, estaria em “níveis inaceitáveis”. O aumento nos impostos de importação, na visão de Trump, pode fazer com que os países passem a reprimir o tráfico.
“Não podemos permitir que essa praga continue prejudicando os EUA e, portanto, até que pare ou seja seriamente limitada, as tarifas propostas, programadas para entrar em vigor em 4 de março, de fato, entrarão em vigor, conforme planejado”, publicou o republicano nas redes sociais. “Da mesma forma, a China será cobrada uma tarifa adicional de 10% nessa data”, complementou.
Os casos de México e Canadá
As tarifas sobre produtos dos países vizinhos aos EUA deveriam já ter entrado em vigor, mas um acordo entre o governo Trump e as gestões de Justin Trudeau (Canadá) e Claudia Sheinbaum (México) adiou o início da vigência da norma.
Do ponto de vista canadense, o próprio Trudeau chegou a confirmar que prometeu ao governo norte-americano dar maior cooperação em assuntos fronteiriços, visando o adiamento. “Tarifas serão pausadas por ao menos trinta dias, enquanto trabalhamos juntos”, sinalizou o canadense na ocasião.
O México também passaria a experimentar novas tarifas há um mês, mas Sheinbaum acordou com Trump em reforçar a fronteira mexicana com os EUA. O governo mexicano aumentou em 10 mil o número de membros da Guarda Nacional para tentar impedir o fluxo de imigrantes ilegais para os EUA.
Horizonte de preços altos?
O isolacionismo comercial promovido por Trump – que, nesta semana, também anunciou novas tarifas para produtos feitos por países da União Europeia (UE) – leva economistas a se perguntarem se os EUA poderão enfrentar um pico inflacionário. O motivo principal para o risco é o fato de que os importadores, tendo (agora) que lidar com taxas mais altas de importação, passem a repassar os custos aos consumidores.
Esse cenário, inclusive, já foi captado pelo Federal Reserve (Fed), o Banco Central norte-americano. No final de janeiro, a entidade monetária decidiu interromper o ciclo de queda na taxa básica de juros vigente nos EUA – atualmente, entre 4,25% e 4,50% ao ano -, dizendo-se preocupado com “os efeitos das possíveis mudanças na política comercial de imigração” promovidas pelo republicano.
Nos doze meses de 2024, o centro da inflação dos EUA esteve em 2,8%. O número é baixo e vinha em queda, principalmente depois que os norte-americanos enfrentaram anos pós-pandêmicos de preços altos. O Fed deseja baixar o índice para 2%, mas se mostrou cauteloso sobre o cenário pouco favorável neste início de novo governo Trump.
Há, ainda, um outro ingrediente nessa receita econômica: a expectativa sobre uma inflação mais alta ou mais baixa mexe com o dia a dia de trabalhadores, consumidores e empresas. Segundo um levantamento recente da Universidade Michigan, que entrevistou consumidores dos EUA, a projeção de inflação para cinco anos à frente subiu para 3,5%. Esse é o maior patamar desde 1995.
Do ponto de vista de quem consome, esperar que o futuro seja marcado por inflação pode alterar comportamentos. Diante da espera de que o custo de vida seja mais alto, trabalhadores se veem estimulados a cobrar aumentos e empresas se preparam para subir os preços. Em outros termos, a expectativa sobre a inflação pode, por ela mesma, influenciar na inflação.
De todo modo, esses são cenários especulativos e somente o próprio desenrolar da economia norte-americana sob o governo Trump mostrará, na prática, quais serão os reais efeitos da guerra comercial no custo de vida dos EUA.
O caso da China
O aumento das tarifas a produtos chineses vem gerando efeitos que já podiam ser sentidos antes mesmo da volta de Trump ao poder. Em dezembro de 2024, por exemplo, as empresas norte-americanas começaram a se antecipar aos prometidos anúncios do republicano e aumentaram os seus estoques de produtos chineses.
Com isso – e sem desconsiderar o papel de outros países importadores de produtos chineses -, a China teve um superávit mensal recorde de 104 bilhões de dólares em dezembro. Em relação ao ano de 2024 inteiro, a China teve o maior superávit de uma balança comercial já registrado, com um saldo notório de 1 trilhão de dólares. Os dados são da Administração Geral de Alfândegas da China. O número supera o recorde anterior, que era da própria China, de 838 bilhões de dólares em 2022.
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Xi Jinping, presidente chinês – Foto: Noel Celis / AFP
Logo após o novo anúncio de Trump, o ministro do Comércio da China, Weng Wentao, disse que Pequim faz “firme oposição” às tarifas de 10%. Segundo o governo chinês, o argumento do republicano sobre importação de drogas não se justifica.
A despeito de reconhecer “divergências no comércio entre os dois países”, o representante chinês destacou que os desafios devem ser resolvidos “por meio de diálogos e negociações equitativas”.
Esses desafios, aliás, não pesam apenas para os EUA, mas também estão na conta da China. Ao longo da última década, a China enfrenta os benefícios e os contratempos de sair da posição majoritariamente importadora para liderar as exportações para o mundo. Exemplo disso é o mercado automotivo, no qual os chineses, atualmente, lideram com folga as exportações.
Com um superávit cada vez mais alto em produtos produzidos pela indústria – representando cerca de 10% de toda a economia chinesa, segundo dados das alfândegas -, a China até vence o jogo das vendas, mas também passa a estar mais suscetível a tarifas impostas por outros países, a exemplo daquelas anunciadas por Trump.