Em meio à crescente cobiça do governo Donald Trump por recursos naturais brasileiros, o governo Lula prepara um “supermapeamento” geológico para identificar as regiões com maior potencial de minerais estratégicos no País, num movimento que combina planejamento técnico e defesa de soberania.
A iniciativa, conduzida pelo Serviço Geológico do Brasil (SGB), prevê uma varredura minuciosa em áreas prioritárias, com prazo de até 120 dias para apresentação ao ministério de Minas e Energia (MME) de um plano que detalhe onde e como serão feitos levantamentos geológicos, geofísicos e geoquímicos.
Internamente, o projeto é tratado como “supermapeamento” e busca preencher a lacuna histórica de informações sobre o subsolo brasileiro — apenas 30% do potencial mineral do país, aproximadamente, foi mapeado até hoje.
A medida integra a política nacional para minerais críticos, que está em fase final de elaboração e foi batizada de Mineração para Energia Limpa (MEL).
A proposta pretende ampliar o mapeamento geológico, facilitar o financiamento de novos projetos, autorizar a emissão de debêntures incentivadas para a produção e aumentar a participação de pequenas empresas no setor.
Entre os recursos estratégicos estão lítio, cobre, grafita, silício, terras-raras, nióbio e vanádio, insumos essenciais para setores como energia renovável, mobilidade elétrica, defesa e tecnologia de ponta.
Apesar de deter algumas das maiores reservas globais, o Brasil ainda tem participação modesta na produção mundial: 26,4% das reservas de grafita, mas apenas 4,56% da produção global; 19% das reservas de terras raras, mas 0,02% da produção.
O cenário internacional adiciona pressão à estratégia brasileira. Em julho, o encarregado de negócios da Embaixada dos EUA no Brasil, Gabriel Escobar, procurou representantes do setor mineral para manifestar o interesse de Washington no acesso a esses recursos estratégicos.
O gesto coincidiu com a decisão do governo de Donald Trump de impor uma sobretaxa de 50% aos produtos brasileiros, medida que entrou em vigor em agosto e acendeu o alerta sobre a possibilidade de uso dos minerais como moeda de troca em negociações comerciais.
Em situações anteriores, a imprensa norte-americana chegou a atribuir o fim de tarifas impostas pelos EUA à concessão, pelo Brasil, de acesso a reservas de terras raras.
Para especialistas, a chave é transformar o potencial geológico em vantagem geopolítica e industrial. Ao Brasil 247, o engenheiro de minas Jorge Boeira, da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), defende que não se trata apenas de vender minério bruto, mas de negociar inserção qualificada em setores de ponta da economia global, com contrapartidas como transferência de tecnologia, investimentos em beneficiamento e manufatura local, e parcerias em inovação.
Ao preparar o “supermapeamento” e a nova política nacional, o governo Lula aposta em romper o ciclo histórico de exportação de bens primários com pouco valor agregado, usando a geologia como instrumento estratégico para o desenvolvimento.