O ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, compareceu, nesta terça-feira (9), na condição de convidado, à reunião reunião da CPI do Crime Organizado, no Senado. Na ocasião, declarou que “o governo não se furta a enfrentar esse problema (da criminalidade), pelo contrário: está de peito aberto, disposto a compartilhar essa responsabilidade”.
No entanto, ressaltou que apesar da disposição e da atuação que o Executivo central vem tendo sob a presidência de Luiz Inácio Lula da Silva, é preciso que haja instrumentos legais que permitam ampliar essa participação, como propõe a PEC da Segurança Pública, enviada pelo governo ao Congresso em abril e que ainda não saiu da Câmara. “O governo federal vai assumir mais essa responsabilidade assim que o parlamento lhe der os instrumentos necessários”, salientou.
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Lewandowski também chamou atenção para o fato de que o enfrentamento à criminalidade “é uma responsabilidade de todos”, acrescentando que para além do papel do poder público, a sociedade e a iniciativa também precisam ajudar.
Ele citou como exemplo a atuação dos dirigentes partidários na filtragem de candidaturas que possam ter relação com o crime organizado, assim como o papel das empresas e instituições do sistema financeiro no sentido de barrar esse tipo de contaminação, que ficou bastante explícita em operações recentes da Polícia Federal (PF).
Fenômeno complexo
Ao iniciar sua fala, o ministro Ricardo Lewandowski salientou que “a criminalidade organizada se tornou um fenômeno extremamente complexo”, que “não é mais local, nem mesmo apenas nacional, mas sim global”.
Nesse ponto, Lewandowski fez questão de ressaltar que discorda da equiparação entre crime organizado e terrorismo, tese que a extrema direita vem tentando emplacar e que foi inserida na primeira versão do substitutivo do deputado bolsonarista Guilherme Derrite (PL-SP) ao PL Antifacção, apresentado pelo governo.
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O ministro também assinalou que o crime organizado está migrando da ilegalidade para a legalidade. “Este não é um fenômeno de agora, e nem do passado recente; isso vem ocorrendo paulatinamente. Ele está se infiltrando no setor de combustíveis, de coleta de lixo, da construção civil, no streaming, no fornecimento de internet e, inclusive, no setor político”, pontuou.
Ele relatou que nas eleições de 2024, “juntamente com o Tribunal Superior Eleitoral e a Polícia Federal, fizemos um esforço muito grande para evitar que o crime se infiltrasse nas eleições municipais. E fiz um apelo aos presidentes dos partidos, mostrando que somente a atitude repressiva e os cuidados da Justiça Eleitoral não são suficientes. Os presidentes dos partidos políticos têm a responsabilidade de fazer uma triagem (nas candidaturas)”.
Iniciativas
Lewandowski também defendeu que o combate ao crime organizado “exige uma visão abrangente e estrutural” e demanda um conjunto de iniciativas.
Ao tratar dessas medidas, afirmou que o governo federal tem ampliado acordos internacionais, especialmente com países fronteiriços. Somente neste ano, segundo o titular do MJSP, foram firmados 12.
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O ministro voltou a apontar a importância da PEC da Segurança Pública. “Nós a propusemos porque entendemos que, como esse é um fenômeno novo e distinto, precisamos de um combate nacional, federativo, unindo as diferentes forças federais e as polícias civis, militares, corpos de bombeiros e forças municipais. É preciso que todas se integrem, tenham um banco único de dados e promovam ações coordenadas nos moldes da Ficco (Força Integrada de Combate ao Crime Organizado), que tem trazido bons resultados”.
Tal estrutura funciona como uma força-tarefa permanente. Criada pelo MJSP, opera em diferentes estados com grupos integrados que reúnem policiais e agentes de órgãos estaduais e federais de segurança, combinando inteligência e ação ostensiva para sufocar financeiramente e operacionalmente o crime organizado.
O ministro elencou outras iniciativas neste sentido, como o já citado Projeto de Lei Antifacção — que foi aprovado na Câmara com mudanças criticadas pelo governo federal e está sendo alterado no Senado, onde deverá ser votado nesta quarta-feira (10) — e o programa Território Seguro.
Sobre este último, lembrou que um plano-piloto foi feito em Natal (RN). Nessa ação, explicou, “primeiro entraram as forças de segurança e mais de 150 pessoas foram presas — sem uma morte, sem um ferido. E agora vão entrar os serviços públicos, inclusive o judiciário, com equipes de mediação e conciliação”.
Ele também citou o programa Município Mais Seguro, que consiste em apoiar e fortalecer a gestão da segurança pública nos municípios, focando em ações de prevenção e enfrentamento da violência, especialmente em áreas vulneráveis. Para isso, vem também atuando na qualificação das guardas municipais.
Recursos humanos e financeiros
O ministro apontou que dentre os gargalos enfrentados hoje para que o país possa ampliar as operações contra o crime organizado estão a falta de recursos humanos e financeiros, algo que, salientou, é um problema antigo. Ao tratar da falta de efetivo, disse que hoje o governo conta com somente 13 mil agentes na PF, e aproximadamente o mesmo número na PRF.
Também enfatizou que “sem dinheiro, não se faz segurança pública”. Por isso, lembrou que uma das propostas do governo é constitucionalizar o Fundo Nacional de Segurança Pública (FNSP) e o Fundo de Políticas Penitenciárias (Funpen), “para que essas verbas sejam perenes e não contingenciáveis e que possam irrigar todo o sistema — não apenas as forças federais, mas, também, as locais”.
De acordo com o titular do MJSP, o FNSP contou, em 2022, com R$ 2 bilhões. “Em 2025, tivemos um aumento de meio bilhão e isso não é nada”, salientou. Ele acrescentou o Funpen — que cuida das cinco penitenciárias federais de alta segurança, 1,4 mil estabelecimentos prisionais diversos nos estados e mais de 700 mil presos (a terceira maior população prisional do mundo) — contou, em 2025, com apenas R$ 897 milhões.
Como fonte adicional de financiamento, o senador Alessandro Vieira, que também é relator do PL Antifacção, propôs o uso de uma Contribuição sobre Intervenção no Domínio Econômico (Cide) de 15%, recolhido das bets, iniciativa elogiada pelo ministro e que pode render R$ 30 milhões anuais, segundo o parlamentar.
Convocação e convite
Após ouvir o ministro, os senadores aprovaram a convocação do deputado estadual do Rio de Janeiro Rodrigo Bacellar (União Brasil). Preso pela Polícia Federal sob a alegação de ter vazado informações de operação sigilosa sobre o Comando Vermelho, o parlamentar teve sua prisão revogada ontem (8) pela Assembleia Legislativa.
O colegiado ainda deve ouvir o ministro da Defesa, José Mucio Monteiro Filho, e o diretor-geral da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Luiz Fernando Corrêa. A CPI funcionará até abril de 2026 e tem como objetivo investigar as organizações criminosas e propor alterações legislativas para combatê-las.