Nessa quinta-feira (15), o assessor especial do Ministério das Relações Exteriores, Luís Eduardo Amorim, participou de uma audiência no Senado Federal sobre as eleições venezuelanas. Ele, que esteve presente pessoalmente em Caracas, afirmou que o governo não reconhecerá a eleição até a entrega das atas. O próprio presidente Luís Inácio Lula da Silva, por sua vez, entrevistado pela emissora venezuelana teleSUR, também afirmou que o Brasil ainda não reconhece a vitória de Nicolás Maduro. É uma capitulação enorme diante da pressão do imperialismo.
Luís Eduardo Amorim afirmou que:
“Já está muito clara a impaciência do presidente Lula com relação à demora das atas. Isso é evidentemente uma preocupação. Estamos chegando a um ponto em que é preciso sentir uma evolução real. Tenho dito isso e repetido. O presidente Lula já disse. O Brasil não reconhecerá um presidente que não esteja fundado nas atas”.
A polêmica das atas foi criada pela oposição fascista venezuelana que queria questionar o resultado das eleições no país. O fato é que as atas eleitorais já foram entregues ao órgão competente, o Tribunal Superior de Justiça. O representante do partido de Maduro, o PSUV, afirmou que “aqui [na Venezuela] se dão os resultados. Se eu tenho algum problema com um resultado, apresento minhas atas para demonstrar a prova”. Isso foi uma crítica direta à oposição, que não entregou as atas ao TSJ. Mas se o PSUV já entrou as atas, o que estaria cobrando Luís Eduardo Amorim? O que acontece é que Conselho Nacional Eleitoral (CNE) sempre publicou os dados por mesa de votação, o que ainda não ocorreu. Então Amorim estaria cobrando que o CNE, um órgão independente da presidência, divulgue um documento. Ou seja, não faz o mínimo sentido cobrar Maduro.
Humberto Costa, da ala direita do PT, aproveitou a deixa para fortalecer a campanha de intervenção na Venezuela:
“Não se trata de estabelecer qualquer tipo de ultimato. Mas o Brasil tem que ter a previsão do que vai acontecer. Até quando vamos aguardar a entrega dessas atas? E se elas não forem entregues? Quais serão as consequências? Vamos abrir um debate para a construção de algum tipo de entendimento político?”
Para Costa, o Itamaraty deveria tomar uma posição mais definida. Ou seja, não bastaria não reconhecer o resultado eleitoral, a diplomacia brasileira deveria ser ainda mais agressiva com Maduro! Uma posição que, como é óbvio, fortaleceria a ofensiva golpista contra a Venezuela.
Outro comentário de um direitista do PT foi o de Randolfe Rodrigues. Ele afirmou que o governo Maduro é “um regime de exceção” e disse que as instituições democráticas no país “foram rompidas”. Disse ele:
“Sejam malditas todas as ditaduras, de direita ou de esquerda. Encher ministérios de militares sem critério e entregar empresas estatais para alguns militares é condenável na Venezuela e aqui. Prometer violência caso seja retirado do poder é condenável na Venezuela e aqui. Não aceitar derrota em caso de eleição é condenável na Venezuela e aqui”.
Essa é mais uma posição reacionária que está ganhando força devido à falta do posicionamento claro de Lula reconhecendo a vitória de Maduro. Randolfe quer traçar um paralelo entre Maduro e o bolsonarismo no Brasil, como se fosse ambos movimentos ditatoriais. É a política da direita tradicional, do partido democrata, que nunca beneficiou os trabalhadores.
Vacilação abre caminho para o golpismo
Infelizmente não foi apenas Luís Eduardo Amorim que tomou a decisão de não reconhecer a vitória de Nicolás Maduro. O próprio presidente Lula se pronunciou sobre o caso em uma entrevista à teleSUR. Ao ser perguntado se o governo reconhecia a eleição de Maduro, ele disse que “ainda não”. E ainda afirmou que Maduro “sabe que está devendo uma explicação para a sociedade brasileira e para o mundo”. Aqui está o grande erro do presidente brasileiro: Maduro não precisa explicar nada para ninguém fora da Venezuela.
O órgão competente do governo venezuelano, o CNE, já afirmou que Nicolas Maduro venceu as eleições. Os demais países do mundo então devem aceitar os resultados – caso contrário, é uma ingerência externa na política venezuelana. Alguns países fizeram o correto, reconheceram a vitória de Maduro imediatamente. Foi o caso da Rússia, da China, do Irã, de Nicarágua, Cuba, Honduras, Bolívia dentre outros.
Anormal foi o comportamento dos EUA que não só não reconheceu Maduro, como que afirmou que a oposição foi vitoriosa. Neste caso, não houve embasamento nenhum, apenas a vontade de que os aliados do imperialismo tivessem vencido as eleições na Venezuela. Essa posição dos EUA, dos seus lacaios latino-americanos como Milei, e de países da Europa é uma posição de intervenção, uma posição golpista.
Lula, a Colômbia e o México tentaram trilhar uma terceira via, mas ela não existe. Ao não se reconhecer a vitória eleitoral de Maduro se cria uma dúvida sobre a credibilidade das eleições e, portanto, sobre a legitimidade do regime político. Criar essa dúvida joga água no moinho do golpe de Estado. O Brasil, sendo o país mais importante da América do Sul, nunca poderia ter feito isso. É uma ajuda gigantesca para o imperialismo norte-americano em sua campanha contra Maduro.
Lula ainda completou sua fala sugerindo a Maduro “fazer um governo de coalizão, convoca a oposição. Muita gente que está no meu governo não votou em mim e eu trouxe todo mundo para participar do governo […]” e ainda cogitou “até convocar novas eleições, estabelecer um critério de participação de todos os candidatos, criar um comitê eleitoral suprapartidário, que participe todo mundo, e deixar que entrem olheiros do mundo inteiro para ver as eleições”. Aqui fica claro porque a posição do governo brasileiro abre um flanco para o golpe de Estado. A oposição que supostamente poderia fazer um governo de coalização é uma extrema direita financiada pelos EUA. É um grupo que está à direita do bolsonarismo, que já tentou derrubar o governo diversas vezes, que trabalhou em ditaduras militares da América Latina. E Maduro está à esquerda de Lula. Como se formaria um governo com um grupo à direita de Bolsonaro e outro à esquerda de Lula? É obvio que isso criaria uma desestabilização gigantesca.
Chamar novas eleições, por sua vez, é capitular diante da pressão do imperialismo que afirmou que as eleições foram uma fraude. Segundo os órgãos competentes da Venezuela, tudo correu bem. Desse modo, nem o Brasil, nem nenhum país tem o direito de sugerir alterações nas eleições, muito menos desconsiderar o pleito que aconteceu. Nunca na história do governo Lula houve esse posicionamento de não se respeitar um resultado eleitoral. Isso só está acontecendo agora porque a pressão do imperialismo sobre o Brasil é gigantesca.
O governo brasileiro não assumiu uma posição golpista como fazem outros setores da esquerda. Lula tenta ser centrista em suas declarações. Ela afirma, por exemplo, que: “não é fácil e não é bom que um presidente da República de um país fique dando palpite sobre a política de um presidente de outro país”. Mas a verdade é que nesse momento a posição centrista de Lula, de Petro da Colômbia e de AMLO do México está apenas fortalecendo a campanha golpista da Venezuela. Maduro está ameaçado de ser derrubado por uma extrema direita financiada pelos EUA. É obrigação de toda a esquerda latino-americana defendê-lo da mesma forma que Maduro defendeu Dilma até o fim.