Enquanto os principais meios de comunicação latino-americanos reforçam a versão de um autogolpe perpetrado pelo agora ex-comandante do Exército boliviano, João José Zúñiga, a mando do atual presidente, Luís Arce, a ministra da Presidência, Maria Nela Prada, negou “contundentemente”. Prada afirmou que tal suposição seria “irresponsável” e convocou os bolivianos de todos os espectros políticos a unir forças e consolidar a democracia no país. “Temos de trabalhar onde quer que nos encontremos, para além das diferenças políticas, a história nos pede para união em todos os espaços possíveis para que coisas como as que vivemos ontem não se repitam.”
Detido após uma frustrada tentativa de golpe de Estado, João José Zúñiga declarou aos meios de comunicação que a operação teria sido feita a pedido do atual presidente boliviano, Luís Arce. “Pegamos os blindados segunda, não… domingo pela noite e os blindados começam a descer.”
Ele afirmou ter escutado de Arce, sob o argumento de que esta semana seria crítica e que algo deveria ser feito para levantar sua popularidade.
“Foi uma ação política e não militar”
Assim, definiu os acontecimentos no Palácio Quemado da última quarta-feira (26) o membro da reserva e analista de segurança da defesa Jorge Santiesteban. Em seu chamado para que a instituição não fosse culpada, Santiesteban afirmou que “o presidente não tinha opções a não ser organizar este tipo de teatro” e que Zúñiga “é um militar sem liderança nem capacidades para conduzir as Forças Armadas”.
Em pouco tempo, a defesa desse argumento passou a circular entre os opositores de Arce e a mídia latina passou a considerar a possibilidade de autogolpe. Em entrevista à radio chilena ADN, Jorge Canelas, ex-cônsul do Chile na Bolívia, definiu o ocorrido como um “motim personalizado de caráter político”, embora afirme condenar e rechaçar a iniciativa. “Não se pode dizer ao certo se foi um golpe de estado ou uma intentona de golpe de estado ou se classificamos como uma mal montada operação personalizada de um chefe militar destituído”, disse o ex-cônsul.
Horas mais tarde, a ministra da Presidência da Bolívia anunciou que o golpe do general Zúñiga havia fracassado por não receber reforços de Viacha e das Força Aérea Boliviana como esperava.
Por outro lado, a senadora pelo Movimento Ao Socialismo (MAS), Ana María Castillo, mostrou à imprensa uma foto do ex-general João José Zúñiga com o sobrinho do presidente Evo Morales, Adhemar Wilcarani Morales, em Oruro, no último fim de semana. Castillo considera que legisladores da oposição e partidários de Evo Morales também são responsáveis pela tentativa de golpe.
Zúñiga passou a noite na Polícia de FELCC (Força Especial de Luta Contra o Crime) de La Paz e manteve-se em silêncio durante a apresentação ao fiscal, informou o vice-ministro do Regime Interior da Polícia, Jhonny Aguilera. O vice-ministro assegurou que a tentativa de golpe foi planejada por quatro unidades militares de La Paz, Colorados de Bolívia, Oruro e Santa Cruz.
A ordem de prisão emitido pela Fiscalía acusava o ex-comandante do Exército boliviano de delitos de terrorismo e levantamento armado contra a segurança e soberania do Estado. Outras 17 pessoas foram apreendidos pela tentativa de golpe, podendo enfrentar até 30 anos de prisão, segundo informação do ministro de Governo, Eduardo del Castillo.
Os efeitos imediatos à tentativa de golpe
De acordo com a Agência Boliviana de Informação, a rede de mercados populares EMAPA estaria sofrendo com a demanda exagerada após a tentativa de golpe. O porta-voz dos mercados de preços acessíveis com apoio do governo, Franklin Flores, denunciou o aumento dos preços por alguns comerciantes de forma irregular.
Outro comportamento de pânico de muitos bolivianos a partir da intentona militar foi sacar dinheiro em caixas eletrônicos, resultando em um impacto de 1% no total de depósitos no sistema financeiro nacional. A retomada da normalidade foi registrada nesta quinta-feira (27), como informou a Autoridade de Supervisão do Sistema Financeiro (ASFI).
Mobilizações em defesa do governo tomam o país
Ainda mesmo com os blindados nas ruas de La Paz, diversas manifestações deram inicío em diversas partes do território boliviano. Uma multidão se aglomerou pela Plaza Murillo em apoio ao atual presidente e em defesa do regime democrático.
A Confederação sindical da Bolívia anunciou uma greve geral indefinida contra o golpe. A Central Obrera Boliviana (COB), que abarca todos os sindicatos de trabalhadores do campo e camponeses, também aderir à mobilização. Em El Alto, a Central Obrera Regional (COR) encerrou o bloqueio de vias esta quinta-feira (27) contra a tentativa fracassada de golpe, ainda que permaneça em estado de emergência.