O município de Caucaia, na Região Metropolitana de Fortaleza (CE), foi escolhido para abrigar um novo data center do TikTok, empreendimento estimado em R$ 55 bilhões.
A iniciativa é parte de uma ofensiva do governo federal para atrair investimentos de grandes empresas de tecnologia, mas levanta questionamentos sobre impactos ambientais e a disponibilidade hídrica na região.
Segundo reportagem do site Intercept Brasil, o projeto será conduzido pela Casa dos Ventos, empresa especializada em energia eólica, que já obteve licença prévia para dar início à construção.
A cidade de Caucaia foi selecionada por sua posição geográfica estratégica, próxima a cabos submarinos de comunicação que garantem maior velocidade no tráfego de dados, além de integrar uma Zona de Processamento de Exportações (ZPE), com benefícios fiscais e desburocratização para empresas.
Durante as negociações que culminaram na escolha da cidade, o governo federal não teria consultado órgãos reguladores ambientais nem incluído o Ministério do Meio Ambiente nas reuniões, conforme apuração do Intercept. O encontro entre representantes do TikTok e o governo ocorreu em dezembro de 2024, durante a interinidade de Geraldo Alckmin na Presidência da República.
A escolha do local reacende o debate sobre o uso de recursos hídricos por data centers. Embora vistos como estruturas tecnológicas, esses complexos demandam elevado consumo de água e energia para manter os servidores refrigerados, funcionando em regime contínuo. Essa exigência operacional contrasta com o histórico climático de Caucaia.
Dados do Atlas Digital de Desastres no Brasil e do Sistema Integrado de Informações sobre Desastres apontam que o município esteve sob situação de emergência por estiagem ou seca em 16 dos últimos 21 anos.
Em 2019, aproximadamente 10 mil moradores foram afetados pela escassez de água. A convivência prolongada com a seca torna a região vulnerável a desequilíbrios no abastecimento, especialmente diante da instalação de empreendimentos com alta demanda hídrica.
A ausência de avaliação ambiental detalhada sobre o impacto do novo centro de dados agrava a preocupação de especialistas. A reportagem também identificou que outros três grandes projetos de data center estão em vias de receber autorização para operar em municípios com registros recorrentes de seca: Campo Redondo, no Rio Grande do Norte, e Igaporã, na Bahia, estão entre os destinos mapeados.
Apesar das repercussões, o TikTok não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem. A Casa dos Ventos, por sua vez, afirmou estar “empenhada em transformar o Porto do Pecém em um complexo de inovação em tecnologia e transição energética”.
A empresa também informou que o projeto inclui “o maior projeto de datacenter e hidrogênio verde do país” e que está “analisando oportunidades de parceria com companhias que possam ser complementares na viabilização dos empreendimentos”.
A disputa pelo projeto envolveu também outras empresas do setor de tecnologia, como Google, Amazon, Facebook e Apple, que demonstraram interesse na instalação do data center. O TikTok foi a companhia selecionada para integrar o projeto inicial em Caucaia.
A ausência de instâncias ambientais nas tratativas e a escolha de áreas com histórico de escassez hídrica trazem à tona questionamentos sobre a política de atração de investimentos tecnológicos no país.
Especialistas alertam que, embora promissores do ponto de vista econômico, projetos desse porte precisam ser precedidos por estudos aprofundados de viabilidade hídrica e energética, especialmente em regiões que enfrentam vulnerabilidades climáticas recorrentes.
Até o momento, não há previsão de audiências públicas nem divulgação de estudos de impacto ambiental relacionados ao data center de Caucaia. A licença prévia já concedida à Casa dos Ventos sinaliza o avanço da construção, ainda que sem ampla divulgação dos critérios técnicos que embasaram a decisão.
O governo federal não se manifestou sobre os critérios utilizados na escolha dos locais para os empreendimentos. Também não há confirmação sobre eventuais medidas compensatórias ou de mitigação dos efeitos do consumo de água e energia previstos no projeto.
O caso de Caucaia se insere em um contexto mais amplo de expansão de infraestrutura digital no Brasil, impulsionada pelo aumento do tráfego de dados e pelo interesse de grandes empresas globais em operar a partir do território nacional.
A busca por atratividade econômica, no entanto, abre espaço para controvérsias quando decisões estratégicas colidem com fragilidades socioambientais de longo prazo.