O governo federal decidiu antecipar para janeiro de 2027 a retomada da alíquota cheia de 35% do imposto de importação sobre kits CKD e SKD usados na montagem de veículos eletrificados no país. A medida, anunciada nesta quarta-feira (31) pelo Comitê Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Gecex-Camex), antecipa em um ano e meio a aplicação da tarifa, que antes estava prevista para julho de 2028.
A decisão representa um atendimento parcial à demanda de fabricantes de veículos com fábricas instaladas no Brasil, que vinham pressionando por maior proteção à produção nacional. Atualmente, a alíquota de importação para esses kits é de 14%, segundo informações do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC).
Apesar da antecipação do aumento da tarifa, o governo concedeu um volume adicional de cotas de importação com alíquota zero para kits CKD e SKD de veículos eletrificados. A isenção será válida por seis meses e somará um total de US$ 463 milhões em autorizações de entrada de componentes no país sem incidência do imposto.
Os kits CKD (Completely Knocked Down) e SKD (Semi Knocked Down) são conjuntos de peças desmontadas importadas que, após chegada ao Brasil, são montadas localmente em veículos híbridos, híbridos plug-in ou elétricos. O formato é adotado por diversas empresas para reduzir custos de fabricação e acessar benefícios tributários e logísticos.
No início do ano, a fabricante chinesa BYD apresentou um pedido formal ao governo brasileiro solicitando a redução temporária do imposto sobre kits CKD e SKD. A solicitação gerou reação de montadoras tradicionais como Toyota, Volkswagen, General Motors e Stellantis, que manifestaram oposição à medida.
Em carta enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, essas montadoras alegaram que uma eventual redução da tributação sobre importação de veículos desmontados poderia comprometer os investimentos planejados no setor automotivo nacional. O grupo defendeu que eventuais incentivos às montadoras deveriam ser direcionados a projetos produtivos com maior índice de nacionalização.
O Gecex-Camex, responsável por coordenar a política de comércio exterior do governo, afirmou que a antecipação da alíquota máxima para janeiro de 2027 busca estabelecer um cronograma de previsibilidade para o setor, ao mesmo tempo em que reconhece as necessidades de adaptação das cadeias produtivas.
Com a nova decisão, o setor terá até o fim de 2026 para se ajustar à elevação da tarifa, ao mesmo tempo em que poderá utilizar as cotas adicionais sem imposto durante o segundo semestre de 2025. A medida foi aprovada em reunião do colegiado com representantes de diversos ministérios, incluindo o MDIC e a Fazenda.
Segundo fontes do setor automotivo, a concessão das cotas de US$ 463 milhões com isenção tarifária atende parcialmente ao pedido da BYD e de outras empresas com projetos em fase de instalação no país. Ao mesmo tempo, a decisão do governo foi considerada positiva pelas montadoras já estabelecidas, que defendiam um prazo mais curto para o retorno da alíquota cheia.
A questão dos kits desmontados vem sendo tratada com atenção no âmbito da nova política industrial voltada à eletromobilidade. O governo tem buscado equilibrar o incentivo à eletrificação da frota com a proteção da cadeia produtiva nacional, evitando a substituição da produção local por simples montagem de veículos com peças importadas.
As discussões ocorrem em meio ao avanço de projetos de fábricas de veículos eletrificados em estados como Bahia, São Paulo e Paraná. Além da BYD, outras montadoras anunciaram novos investimentos na produção de modelos híbridos e elétricos, ampliando a disputa por incentivos e acesso a benefícios tributários.
A antecipação do imposto de importação também pode influenciar a estratégia de fornecimento e desenvolvimento de fornecedores nacionais. A expectativa do governo é que, com a sinalização de aumento da tarifa, as empresas invistam em linhas de produção localizadas no Brasil e ampliem a integração da cadeia.
O mercado de veículos eletrificados tem crescido no país, ainda que em ritmo inferior ao de mercados asiáticos e europeus. O setor aguarda a definição de regras mais amplas do Programa Mobilidade Verde e Inovação (Mover), que deve incluir metas de eficiência energética, exigência de conteúdo local e linhas de financiamento.
A decisão do Gecex-Camex encerra, por ora, a disputa envolvendo a importação de kits desmontados, mas o tema deve permanecer na agenda das políticas industriais e comerciais do governo. Com a aplicação plena da tarifa a partir de 2027, o mercado automotivo deve acelerar a definição de estratégias de produção e nacionalização para os próximos ciclos de investimento.