O procurador-geral da República, Paulo Gonet, afirmou na manhã desta terça (2/9), que a “organização criminosa” liderada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro “fez questão de documentar a empreitada” golpista que culminou nos atos violentos do 8 de Janeiro em Brasília — quando as sedes dos Três Poderes foram invadidas e depredadas pela horda bolsonarista que buscava intervenção militar contra o então governo eleito.
A manifestação de Gonet ocorreu durante o julgamento de Jair Bolsonaro e mais sete réus por tentativa de golpe de Estado, no Supremo Tribunal Federal. Antes de Gonet, o relator da ação penal, ministro Alexandre de Moraes, fez um resumo do processo, repudiou a pressão dos Estados Unidos sobre o caso e afirmou que o apaziguamento da Nação não virá por meio da impunidade, afastando os argumentos em torno da possível anistia dos réus [leia mais abaixo].
Gonet fez um esforço para explicar que a acusação é fundamentada em dispositivos do Código Penal, que estabelecem que a tentativa de golpe basta para gerar o processo, não sendo exigido que o plano tenha alcançado êxito.
O chefe do Ministério Público Federal afirmou que a “a denúncia revela com riqueza de detalhes” o planejamento da organização criminosa, criada entre 2021 até 2023, para dar um golpe de Estado, incluindo Bolsonaro e membros do alto escalão de seu governo, com a finalidade de minar a alternância de poder e o livre exercício do poder Judiciário. “Os próprios membros da organização criminosa fizeram questão de documentar todas as fases da empreitada”, disparou Gonet.
“As testemunhas ouvidas em juízo confirmaram que lhes foram apresentadas minutas com medidas de exceção, cujos fundamentos não se ajustavam às hipóteses constitucionais e eram de consequências impensáveis”, complementou. Os comandantes das Forças confirmaram, em depoimento, “que foram constantemente pressionados a aderirem” ao plano de golpe, entre outras inúmeras provas.
“Não foram meros atos de cogitação, mas atos colocados em marcha contra a democracia”, pontuou Gonet.
Punir tentativa de golpe é “imperativo”, diz Gonet
Na abertura de sua fala, Gonet comentou que “é chegada a hora em que a democracia assume defesa ativa contra tentativa de golpe praticada com violência e ameaça.” Para ele, “se a intentona vence pela ameaça do poderia armado ou tem sua efetiva concretização, não há o que a ordem ruída possa efetivamente contrapor”.
Gonet frisou que o Código Penal “promete castigos a atos de tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, à tentativa de abolição do estado democrático de direito”. “Punir a tentativa frustrada de ruptura com a ordem democrática estabelecida é imperativo, como alimento dissuasório de aventuras golpistas.”
Assim como Moraes, Gonet invocou o histórico brasileiro para afastar a possibilidade de anistiar ou tratar a tentativa de golpe como “crime menor”. “Os golpes podem vir de fora da estrutura existente de poder, como pode ser engendrado pela perversão dela própria. Nosso passado oferece ilustrações dessa ultima espécie. (…) Não reprimir criminalmente tentativas dessa ordem (…) recrudesce ímpetos de autoritarismo e põe em risco o modelo civilizatório”, pontuou.
“Os atos que compõem o panorama espantoso e tenebroso da denuncia (…) não podem ser tratados como atos de importância menor, como devaneios utópicos”, disse Gonet. “O que está em julgamento são atos que hão de ser considerados graves enquanto quisermos manter a vigência do Estado democrático de Direito.”
Ele ainda frisou que “tentativas de insurreição dependem de inteligência de eventos que, desligadas entre si, nem sempre impressionam, mas vistas em conjunto, destacam a unidade com o propósito do arbítrio.”
“Os fatos de que a denúncia trata nem sempre tiveram os mesmos atores. Mas todos convergiram, dentro de seu espaço de atuação, para o objetivo comum de assegurar a presidência do presidente da época no cargo, independente do resultado das eleições.”
O procurador-geral prosseguiu explicando o papel de cada réu na empreitada golpista.