A sessão de julgamento do núcleo crucial da trama golpista, pela Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), foi retomada na manhã desta quarta-feira (10) com o voto do ministro Luiz Fux. Já nas análise das preliminares, o ministro causou surpresa ao defender a “incompetência absoluta” da Corte para julgar essa ação e pedir a anulação de todo o processo.
Na avaliação de Fux, pelo fato de os acusados — o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e sete outros réus que ocuparam ministérios e cargos importantes da República — não estarem mais exercendo essas funções, não poderiam ser julgados pelo STF por não terem mais prerrogativa de foro privilegiado.
“Compete ao STF precipuamente a guarda da Constituição, cabendo-lhe processar e julgar originariamente nas infrações penais comuns o presidente da República, o vice-presidente, a membros do Congresso Nacional, seus próprios ministro e o procurador-geral da República. O primeiro pressuposto que o ministro deve analisar antes de ingressar na denúncia ou petição inicial é verificar se ele é competente”, disse Fux.
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O ministro prosseguiu dizendo: “Meu voto é no sentido de reafirmar a jurisprudência dessa corte. Concluo, assim, pela incompetência absoluta do STF para o julgamento desse processo, na medida que os denunciados já havia perdidos seus cargos”. Além disso, argumentou que no caso de ação ser julgada no Supremo, deveria ser no plenário e não em uma das turmas.
Perplexidade
Luiz Fux já vinha indicando opinião dissonante dos demais membros da turma e havia expectativa de que seu voto pudesse destoar em pontos específicos do processo. Porém, ao questionar a competência do STF — e da primeira turma — para esse julgamento, o magistrado foi muito além.
Conforme apontado no blog da jornalista Andréia Sadi, no G1, a tese de Fux causou perplexidade entre demais ministros que, reservadamente, apontaram incongruência em sua posição, uma vez que ele votou pela aceitação, pelo STF, da denúncia contra os réus, apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
Além desse ponto, Fux também acolheu argumentos das defesas dos bolsonaristas em relação à suposta dificuldade de os advogados acessarem o material colhido pelas investigações, o que foi desmentido no voto de Moraes. Ainda assim, apontou Fux, “em razão da disponibilização tardia de um tsunami de dados, sem identificação com antecedência dos dados, eu acolho a preliminar de violação constitucional de ampla defesa e declaro cercamento de defesa”.
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Uma análise da jornalista Malu Gaspar, em O Globo, aponta que a posição do ministro pode ajudar futuramente os réus (e possivelmente condenados) do núcleo crucial da trama golpista. O objetivo das defesas, cumprido por Fux, seria ter uma base argumentativa que, mais adiante, conforme o clima político, possibilite reverter a condenação de Bolsonaro e outros.
Cid e Ramagem
Ainda na primeira parte de seu voto, Fux acompanhou o ministro-relator, Alexandre de Moraes e o ministro Flávio Dino quanto à validade da delação do ex-ajudante-de-ordens de Bolsonaro, Mauro Cid, mantendo, assim, os benefícios concedidos a delatores. A validade da colaboração de Cid era outro ponto que vinha sendo questionado pelas defesas dos réus.
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No caso do deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Abin — que, por ser parlamentar, deixa de responder por dois crimes ocorridos após sua diplomação, conforme resolução da Câmara —, Fux entendeu que toda a ação penal relativa ao réu deveria ser suspensa.
Após analisar as preliminares, Fux continuou a sessão dedicando-se ao mérito do processo.
Próximos passos
Os dois ministros que votaram até o momento — o relator Alexandre de Moraes e Flávio Dino — concordaram em pedir a condenação da organização criminosa acusada de praticar delitos visando um golpe de Estado. Dino, no entanto, defendeu penas menores para Alexandre Ramagem, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira.
Ainda faltam os votos de Fux, Carmen Lúcia e do presidente da turma, Cristiano Zanin, que votarão nesta quinta-feira (11). Na sexta (12), deverá ser proferida a sentença e feita a dosimetria das penas.
O núcleo crucial da trama golpista que está sendo julgado é formado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), apontado como o líder da organização, e pelos ex-ministros e generais Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira e Walter Braga Netto; pelo ex-ministro da Justiça, Anderson Torres, o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier; o ex-diretor da Abin (Agência Brasileira de Inteligência), Alexandre Ramagem e o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, Mauro Cid.
Eles são acusados pelos crimes de organização criminosa armada, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, tentativa de golpe de Estado, dano qualificado contra o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado — a exceção é Ramagem, que não responde por estes dois últimos ilícitos.