Fugindo do “canto” das redes sociais

por Carlos Gustavo Maio

Haveria possibilidade de cogitar-se de alguém que é parte da humanidade contemporânea ficar indiferente, passar incólume sem deixar-se arrebatar, ainda que por um brevíssimo período de sua vida, pelas redes sociais?

Eu mesmo que vivi minha adolescência no início dos anos noventa numa época na qual a internet e o telefone celular (cuja única função era fazer ligações) eram coisa de ficção científica, pude acompanhar essa revolução e evolução tecnológica em cada passo desde sua origem.

Amante que sempre fui (até porque fui criado imerso nessa cultura) dos materiais impressos, dos cadernos, da caneta, do lápis, do estojo, posso dizer que resisti com tranquilidade ao antigo Orkut enquanto ele funcionou no Brasil por cerca de dez anos e venho também passando ao largo do Facebook desde sua chegada em terras brasileiras por volta do ano de 2008.

Então, mais de duas décadas depois da chegada ao Brasil da primeira rede social, assim como a sereia na beira da praia que seduz com seu canto os marinheiros incautos que dela se aproximam, chegou finalmente a minha vez de ser arrebatado pelo “canto” das redes sociais.

Daí tomei a iniciativa de sair da posição de mero espectador e ouvinte para ingressar efetivamente no terreno da rede social como participante ativo. O primeiro passo dado foi procurar inteirar-me de informações básicas da estrutura e da dinâmica de cada rede social até que eu chegasse a definição de uma (ou quem sabe mais de uma) que ao menos fosse minimamente compatível com minha personalidade.

E foi assim que eu escolhi ter uma conta no Instagram atraído que fui, em primeiro lugar, pela possibilidade de dar vazão aos meus pensamentos sob a forma de textos e tudo que fosse de mais interessante para mim além disso seria mero bônus.

Sendo assim, uma vez dentro do Instagram, não demorei muito para constatar empiricamente aquilo que minha intuição já havia me alertado: as redes sociais são, como o ator Pedro Cardoso certa feita disse ao ser entrevistado pelo jornalista Chico Pinheiro em seu podcast no ICL, verdadeiras “máquinas de explosão de opiniões individuais”.

Repare que o entrevistado foi de uma precisão cirúrgica na sua afirmação, afinal de contas, a “explosão” resulta de algo previamente reprimido, exposto de forma irrefletida, violenta. 

A sociedade transformou a rede social num mero veículo de divulgação de posicionamentos autoritários tomados sem reflexão mínima, de propagação de fatos irreais, em arena de ataques pessoais direcionados, em palanque para vociferação de discursos eivados de pretensas verdades absolutas, em tribunais inquisidores nos quais a sentença proferida é invariavelmente condenatória e a pena aplicada é a exposição do usuário da rede à execração pública ou, ainda, serve a rede social de terreno para simples ode ao hedonismo, a superficialidade e a ostentação pura e simples. 

Baseado nesta constatação fática sou levado a afirmar que a rede social é uma máquina que não foi construída para o convívio, tampouco dali se têm condições de produção de simples entendimentos.

Em um diálogo, dois indivíduos concordam, discordam, aproximam-se e distanciam-se. Isto é normal no exercício dialético através do qual há o aprimoramento recíproco daquilo que ambos afirmam e a rede social acaba por minar por completo a possibilidade de haver entendimentos e reflexões mais sofisticados entre os indivíduos.

Como fiz referência no início do texto, todo envolvimento resultante de arrebatamento – como se caracteriza a minha relação particular com as redes sociais – é precário, desprovido de base sólida, fugaz e está fadado ao término por falta de identificação e pertencimento.

Diante do exposto estou encerrando minha conta no Instagram e saindo desta malfadada arena de combate sofisticado chamada rede social carregando comigo a certeza de que é melhor viver do que ter opinião.

Carlos Gustavo Maio – Advogado. Professor. Pós-graduado pela Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro.

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Last Update: 27/01/2025