Após as eleições francesas extraordinárias ocorridas no dia 7 de julho, as três maiores bancadas da Assembleia Nacional, dissolvida pelo presidente Emmanuel Macron, chegaram à seguinte votação:
- Nova Frente Popular: 182 assentos;
- Juntos: 168 assentos;
- Reagrupamento Nacional: 143 assentos.
O resultado, que é muito mais complexo do que parece à primeira vista, despertou as mais diversas reações. Para Marine Le Pen, principal liderança da extrema direita francesa, agrupada na Reagrupamento Nacional, a votação teria sido vitoriosa. Disse ela:
“A maré está subindo. Desta vez não subiu o suficiente, mas continua subindo e, consequentemente, nossa vitória apenas foi adiada.”
Curiosamente, Jean-Luc Mélenchon, o líder da Nova Frente Popular, também comemorou o resultado. Disse ele:
“A maioria fez uma escolha diferente para o país, afastando-se da extrema direita.”
Quem, teria, então, sido o grande vencedor?
Que o Reagrupamento Nacional cresceu, é algo incontestável. A sigla comandada por Le Pen se tornou, de longe, o maior partido de toda a França. Obteve apenas 25 assentos a menos que o Juntos, sendo que esse, por sua vez, é uma coalizão de oito partidos. A Nova Frente Popular, por sua vez, que teve 39 votos a mais que o Reagrupamento Nacional, é composta ou apoiada por um total de 43 organizações:
Partidos que integram a coalizão:
- Les Écologistes (LÉ)
- La France insoumise (LFI)
- Parti communiste français (PCF)
- Parti socialiste (PS)
- Génération.s (G·s)
- Gauche écosocialiste (GES)
- Gauche républicaine et socialiste (GRS)
- Génération écologie (GE)
- Nouveau Parti anticapitaliste – L’Anticapitaliste (NPA-B)
- Nouvelle Donne (ND)
- Parti de gauche (PG)
- Parti ouvrier indépendant (POI)
- Place publique (PP)
- Pour une écologie populaire et sociale (PEPS)
- Révolution écologique pour le vivant (REV)
- Euskal Herria Bai (EHB)
- Picardie debout ! (PD)
- Rézistan’s Égalité 974 (RÉ974)
- Union pour la sécurité de Mayotte (USM)
- Tavini huiraatira
- Pour La Réunion (PLR)
- Le Progrès (LP)
- Mouvement de décolonisation et d’émancipation sociale (MDES)
- Pou Lagwiyann Dékolé (PLD)
- Péyi-A
Partidos que apoiam a coalizão:
- Paris en Commun
- Mouvement républicain et citoyen (MRC)
- Les Radicaux de Gauche (LRDG)
- L’Engagement (LE)
- Union démocratique bretonne (UDB)
- Alternative Alsacienne – ‘s Linke Elsass
- Gauche démocratique et sociale (GDS)
- Allons enfants ! (AE)
- Ensemble ! (E!)
- Mouvement des progressistes (MDP)
- Parti radical de gauche (PRG)
- Humains et dignes (HD)
- Parti pirate (PP)
- Association Démocratie Écologie Solidarité (ADÉS)
- Ensemble sur nos Territoires (ESNT)
- Parti progressiste démocratique guadeloupéen (PPDG)
- Inseme a Manca (IaM)
- Ghjuventù di Manca (GdM)
- A Manca (AM)
- Ecologia Sulidaria (ES)
- Révolution
O fato de que os 182 votos da Nova Frente Popular estão diluídos entre um conjunto de organizações, no entanto, não é o único aspecto que demonstra que Mélenchon não tem tanto motivo assim para comemorar. E preciso levar em consideração que o partido com maior votação dentro da Nova Frente Popular não foi o França Insubmissa, que seria a ala esquerda da coligação. O partido de Mélenchon conquistou 78 assentos. No entanto, os demais partidos, que já são profundamente integrados ao regime, obtiveram um total de 108 assentos: Partido Socialista (65), Verdes (33) e Partido Comunista (9).
A vitória da Nova Frente Popular, portanto, não é uma vitória da esquerda, mas sim dos partidos falidos do regime francês. Partidos que, ainda que completamente desmoralizados diante da população francesa, conseguiram se reabilitar parcialmente graças ao estímulo da burguesia à coalizão formada por Mélenchon e graças ao apoio da esquerda a essa coalizão. Merece destaque, neste caso, a votação do Partido Socialista, que havia conquistado apenas 27 cadeiras em 2022.
O Partido Socialista nada tem de esquerda. Ele governou o país entre 2012 e 2017, em circunstâncias parecidas. Na época, François Hollande se tornou presidente após a crise de seu antecessor, Nicolas Sarkozy. Hollande foi responsável por uma política bastante agressiva no Oriente Médio, tendo participado ativamente dos bombardeios de Iraque e Síria.
Os partidos pró-imperialistas da Nova Frente Popular possuem outra vantagem em relação à França Insubmissa. Eles podem entrar facilmente em um acordo com a Juntos, que é a coalizão governista, comandada por Emmanuel Macron. Podem, inclusive, desta forma, formar um governo sem a participação da França Insubmissa. A maior votação desse partido no bloco da Nova Frente Popular, portanto, não indica que este será o partido a comandar o país europeu. Muito pelo contrário: Mélenchon apenas serviu de trampolim para que os antigos partidos do regime se reerguessem.
Essa manobra já havia sido anunciada pelos grandes jornais da burguesia francesa. Em editorial recente, o conservador Le Figaro já havia deixado claro que, para os capitalistas europeus, era preferível um acordo com Le Pen que um acordo com Mélenchon. Curiosamente, a mesma burguesia que não queria a vitória de Mélenchon manipulou as eleições para que a Nova Frente Popular vencesse, valendo-se do chamado voto distrital, o que mostra que, para a burguesia, a vitória da Frente Popular nunca foi cogitada como uma vitória da esquerda. Tudo ficaria ainda mais claro após as eleições, quando um articulista declarou, ao jornal Libération, que a Frente Popular deveria se ver livre de Mélenchon.
