Na última terça-feira (26), a filial brasileira da rede varejista Carrefour emitiu um pedido de desculpas ao governo brasileiro pelo boicote à carne do Mercosul na matriz da rede de supermercados, na França. A medida, vista como um ataque aos produtores brasileiros, ocorre em meio às negociações de um possível acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia.
A carta de Bompard
O anúncio do embargo foi feito na quarta-feira passada (20) por meio de uma carta assinada pelo presidente do Carrefour, Alexandre Bompard, e enviada ao presidente da Federação Nacional dos Sindicatos dos Agricultores da França, Arnaud Rousseau.
Rousseau lidera um movimento de fazendeiros franceses que acusam os produtores do Mercosul de utilizar substâncias químicas e antibióticos proibidos na Europa. Esses agricultores temem que o acordo comercial aumente a importação, na França, de carne bovina, frango, açúcar e milho do Brasil e da Argentina.
Após protestos contra o acordo entre a União Europeia e o Mercosul, Bompard publicou o texto nas redes sociais. Na carta, ele prometeu que o Carrefour não venderia carnes produzidas no Mercosul:
“Em toda a França, ouvimos o desânimo e a raiva dos agricultores diante do risco de o mercado francês ser inundado com carne que não atende às suas exigências e normas”, afirmou Bompard. “O Carrefour se compromete hoje a não vender carne do Mercosul.”
Ele ainda reforçou o apelo ao protecionismo agrícola:
“Esperamos inspirar outros atores do setor agroalimentar e impulsionar um movimento de solidariedade, garantindo aos criadores franceses que não haverá qualquer possibilidade de evasão. Estamos prontos para isso, quaisquer que sejam os preços e as quantidades de carne que o Mercosul venha a nos oferecer.”
Reação dos produtores brasileiros
A medida foi vista como uma ingerência de um monopólio estrangeiro na economia brasileira. Os produtores de proteína animal reagiram prontamente. Apesar do silêncio inicial de grandes frigoríficos, como JBS e Marfrig, pressionados por seus acionistas, estes suspenderam o fornecimento à rede Carrefour.
Em nota, o Carrefour lamentou os impactos da decisão:
“Infelizmente, a suspensão do fornecimento de carne impacta nossos clientes, especialmente aqueles que confiam em nós para abastecer suas casas com produtos de qualidade e responsabilidade.”
No sábado (23), 44 entidades empresariais, incluindo a Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carne (ABIEC) e a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), repudiaram as declarações de Bompard. Em nota conjunta, denunciaram o protecionismo:
“A decisão do Carrefour demonstra uma abordagem que contradiz o papel de uma empresa global. Além de desvalorizar a qualidade das carnes do Mercosul, prejudica o diálogo necessário para enfrentar desafios globais como a segurança alimentar.”
Resposta do governo
Autoridades brasileiras criticaram o boicote. O ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, declarou:
“A França compra carne brasileira há 40 anos. Só agora detectaram problemas? É absurdo. Se o Carrefour considera inadequada a carne brasileira para os franceses, que também não a venda em suas lojas no Brasil.”
Pedido de desculpas e demagogia
O Carrefour tentou minimizar os danos com um pedido de desculpas ao Ministério da Agricultura, afirmando que sua intenção era apenas apoiar os agricultores franceses. Em nota, declarou:
“Na França, somos o principal parceiro da agricultura local, comprando quase toda a carne necessária para nossas atividades. No Brasil, mantemos uma relação de parceria há 50 anos, baseada em valores de profissionalismo e cuidado à terra.”
“Operação Carne Fraca”: uma estratégia recorrente
O setor de carnes brasileiro já foi alvo de outras ofensivas, como a Operação Carne Fraca (2017), promovida sob o pretexto de combater fraudes sanitárias. Essa ação afetou gigantes como JBS e BRF – líderes globais no setor -, sendo acompanhada de intensa campanha por órgãos estrangeiros, como o New York Times e o Financial Times, que questionaram a credibilidade da carne brasileira.
O ataque atual ao Mercosul segue a mesma lógica: desestabilizar um setor estratégico da economia brasileira para favorecer os interesses protecionistas de países imperialistas.