Série Piauí Cultura Regional (23)

Floresta do Piauí revive Cultura de sua geração avó

por Eduardo Pontin

Lezeira, Reis e Aboio são alguns modos de vida que vêm sendo retomados

No último dia 04, a cidade de Floresta do Piauí realizou a Sexta-Feira Cultural, evento que contou com a presença em massa da população e foi um grande sucesso. Graças a Política Nacional de Fomento à Cultura Aldir Blanc, a previsão é que esta festa ocorra todos os anos daqui pra frente. O município de Floresta do Piauí está retomando a cultura de sua geração avó, através de manifestações culturais como a Lezeira, o Reis, o Aboio e o Forró Pé de Serra. Essa retomada vem acontecendo desde 2021, quando foi criada a Academia Florestense de Cultura Popular, entidade que diplomou 20 mestres e mestras, como Gabiru, Dona Brancosa, Zé de Anísia, Tia Helena, Chiquim Ferreira, Nêga de Chico de Joana entre outros.

Academia Florestense de Cultura Popular | Foto: Francisca Sousa

Aboio

Na Sexta-Feira Cultural de Floresta do Piauí se apresentaram os aboiadores Zé de Anísia, Ju de Oscar, Adãozinho Aboiador e Gabiru. Aliás, Adãozinho é o único mestre de cultura de todo o Piauí certificado pelo Governo do Estado como Patrimônio Vivo da Cultura do Piauí por ser aboiador de gado.

Adãozinho Aboiador: Patrimônio Vivo do Piauí | Foto: Francisca Sousa

O Aboio é originalmente um canto de trabalho no qual o vaqueiro se comunica e se conecta com o gado, numa linguagem especial entre eles. Em muitas regiões do Brasil este tipo de canto já é considerado ultrapassado e sem quem saiba realizá-lo, porém, no município de Floresta do Piauí ele prossegue existindo de forma muito viva. Juntamente com a cultura do vaqueiro, nasce o Aboio como gênero musical. Os vaqueiros dizem versos campeiros de uma pujança digna do sertão do Nordeste. Ao término de cada conjunto de versos, o aboiador solta um aboio campesino, para não deixar de lembrar a origem de seu canto. O aboiador segue no anonimato para o grande público brasileiro, mas é admirado pelo povo nordestino como um artista inigualável.

Dona Helena e Zé de Anísia: casal símbolo da cultura de Floresta | Foto: Francisca Sousa

Reis

Em Floresta, o mestre detentor dos saberes do Reisado é Gabiru, que tira Reis desde menino, quando acompanhava seu pai, Chiquim de Margarida (1906-1965), de casa em casa nas primeiras noites de janeiro. Compõe o Reisado de Mestre Gabiru o grande Careta Zé de Anísia e Adãozinho, além de Seba dançando o boi. No Reis do sertão piauiense predomina o rebuliço, a trapaiada, o movimento, tudo para se rir. Esse é o Reis que ainda é desconhecido dos brasileiros, um verdadeiro universo de carnaval, no qual momentaneamente as regras sociais são suspensas e uma inversão social impera. Nas noites de Reis, por bons minutos todas as dificuldades da vida são esquecidas e o simples agricultor do sertão brasileiro tem acesso a uma apresentação particular do que há de mais popular e mais autêntico na cultura de seu torrão.

Reisado de Gabiru de Floresta | Foto: Francisca Sousa

Lezeira de Floresta

O grupo Lezeira de Floresta existe há ao menos um século e suas práticas e fundamentos vêm sendo repassadas de geração em geração. Hoje liderada por Mestre Gabiru, a Lezeira de Floresta tem se apresentado em outras cidades, como Teresina e Santo Inácio do Piauí, demonstrando a sua força ancestral, encantando a todos com a beleza de sua dança. As cantigas da Lezeira falam da relação do ser humano com a natureza e entre as preferidas dos brincantes de Floresta estão “Juazeiro”, Cajueiro”, “Boi do Mariá”, “Baboleta”, “Gato do Mato”, “Pilão Café”, “Canaviá”, “Meu Besouro” e “Lagoa do Capim”.

Lezeira de par: passo de Floresta | Foto: Larissa Lima

Cultura de Floresta

A força da cultura de Floresta está em sua ancestralidade, já que uma boa parcela de sua população é descendente de indígena. Por isso, a cultura de Floresta do Piauí é muito rica e inclui além do Aboio, da Lezeira, do Reis e do Forró Pé de Serra, diversas outras expressões culturais.

Forró Pé de Serra: João de Evêncio e Bateria | Foto: Francisca Sousa

No mapeamento realizado por ocasião da fundação da Academia Florestense de Cultura Popular, foram identificadas as seguintes manifestações culturais:

1. Lezeira/ 2. Batuque/ 3. Reisado/ 4. Aboio/ 5. São Gonçalo/ 6. Visita de Cova/ 7. Terço Popular/ 8. Bendito/ 9. Benzedor/ 10. Sentinela/ 11. Garrafada/ 12. Cantiga Tradicional/ 13. Adivinhação/ 14. Contos/ 15. Lendas/ 16. Literatura de Cordel/ 17. Composição Popular Tradicional/ 18. Sanfoneiro Forró Pé de Serra/ 19. Artesanato de Palha de Carnaúba/ 20. Artesanato de Barro/ 21. Parteira/ 22. Vaqueiro/ 23. Causos/ 24. Novenas/ 25. Festejos Religiosos/ 26. Afro-religiosidade/ 27. Expressões, Ditos populares, Brasileirismos e Arcaísmos linguísticos/ 28. Costumes/ 29. Baterista Forró Pé de Serra/ 30. Cantador de Viola/ 31. Casa de Farinha/ 32. Culinária/ 33. Costura/ 34. Tocador de pife/ 35. Vaquejada (esporte) / 36. Quadrilha/ 37. Artesanato de madeira

A ideia é que nos próximos eventos custeados pela Lei Aldir Blanc, boa parte dessas expressões também sejam contempladas, fortalecendo os mestres e mestras de cultura de Floresta do Piauí, cidade que mais do que nunca está revivendo a cultura de sua geração avó.

Gabiru de Floresta, Zé de Anísia e Adãozinho Aboiador | Foto: Francisca Sousa

Eduardo Pontin é filósofo e há mais de 10 anos desenvolve estudos e pesquisas de campo no universo do samba e da cultura popular brasileira. Produtor Cultural, vem trabalhando no processo de patrimonialização imaterial da Dança da Lezeira do Piauí, tendo atuado junto ao IPHAN para que esta expressão seja considerada Patrimônio Cultural Brasileiro. Recebeu 1ª Menção Honrosa no Prêmio Nacional Sílvio Romero de Monografias sobre Folclore e Cultura Popular 2022, com o livro “Lezô, Lezá, Vamô Vadiá, Nesta Lezeira – Ancestralidade e Simbolismo na Dança da Lezeira do Sertão do Piauí”.

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Last Update: 07/07/2025