Exportar não pode ser só um negócio da China

por Rafael Cervone*

A divulgação recente dos resultados da balança comercial de 2024 evidencia um contraste marcante entre as economias da China e do Brasil. Enquanto o superávit do país asiático alcançou o impressionante recorde de US$ 992 bilhões, com um crescimento de 21% em relação ao ano anterior, o nosso foi de US$ 74,6 bilhões, representando o segundo maior saldo da história, mas com uma queda significativa de 24,6% em comparação a 2023. Nossos números, embora positivos, revelam desafios estruturais que demandam atenção e ações estratégicas.

Fica muito claro que a China vem conseguindo capitalizar sua posição como “fábrica do mundo”, utilizando-se de fatores como baixos custos operacionais, subsídios, juros reduzidos e um aparato regulatório muito menos restritivo. Em contraste, o Brasil apresentou queda nas divisas geradas pelas vendas externas, mesmo com um aumento de 3% no volume embarcado.

Esse descompasso reflete um problema crônico a ser enfrentado: a necessidade de incluir mais produtos com maior valor agregado na nossa pauta de exportações. Ou seja, é premente fortalecer a indústria nacional e favorecer sua inserção no comércio exterior. Programas como o Novo Marco da Indústria Brasileira (NIB) e a Depreciação Acelerada são fundamentais, mas precisam ser agilizados e ampliados para criar um ambiente mais favorável ao crescimento do setor. Também cabe desburocratizar ao máximo a elegibilidade das empresas ao regime de drawback, que considero um importante instrumento, ao desonerar a importação de insumos destinados à produção de bens exportáveis.

Em outra vertente, é fundamental lembrar os problemas estruturais que seguem conspirando contra os produtos brasileiros. Juros altos, dificuldade de acesso ao crédito, custos trabalhistas muito elevados, insegurança jurídica, pesadas despesas com logística e burocracia excessiva continuam inibindo nosso potencial competitivo. É imprescindível, ainda, reduzir os ônus dos impostos. Apesar da aprovação e regulamentação da reforma tributária, seus efeitos plenos só serão sentidos em 2033, e o Brasil não pode esperar até lá para tornar as exportações mais competitivas.

Os problemas internos do País agravam a desigualdade nas condições concorrenciais. Nações como a China oferecem subsídios robustos e têm custos muito menores em termos de legislação laboral e arcabouço regulatório, forjando uma vantagem difícil de superar. Por isso, respeitando de modo intransigente a dignidade do trabalho e os preceitos da sustentabilidade ambiental, precisamos atenuar todos os fatores que estejam ao nosso alcance, como abordei anteriormente, para potencializar nossa competitividade. Isso significa buscar soluções que minimizem os custos internos, incentivem a inovação e garantam que o produto brasileiro seja cada vez mais atraente e acessível no mercado global.

Os resultados de nossa balança comercial em 2024 são, sem dúvida, dignos de reconhecimento. No entanto, a queda no valor das exportações associada ao aumento do volume comercializado acende um sinal alerta. Enquanto a China avança a passos largos no comércio internacional, o Brasil precisa responder com medidas estruturantes que fortaleçam sua inserção global.

O desafio é grande, mas a oportunidade de transformar o potencial econômico em resultados concretos é ainda maior. O futuro do nosso comércio exterior dependerá diretamente das ações que adotarmos já. É preciso cuidar muito bem dessa pauta para que a exportação não se consolide apenas como um “negócio da China”, mas também como fator de crescimento sustentado, geração de empregos e bem-estar social no Brasil.

*Rafael Cervone – Presidente do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Ciesp) e primeiro vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp)

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Last Update: 18/01/2025