Muito já se escreveu sobre o papel da militância de esquerda que, em pouco tempo, saiu às ruas e conseguiu que a Nova Frente Popular conquistasse a maioria das cadeiras do Parlamento francês e impusesse uma derrota à extrema-direita. É claro que este não foi o único fator da virada nos resultados do segundo turno, mas teve um papel relevante.
Desse processo, temos lições a tirar. A primeira, que não traz novidade, é que a militância do PT e dos partidos de esquerda tem de retomar seu espaço nas ruas, mostrar a sua cara e manter uma atuação onde a militância virtual, nas redes, é combinada, em igual medida, com a militância nas ruas. A segunda é que o combate à extrema-direita e ao neofascismo tem que ser permanente.
É urgente que, passadas as eleições municipais, o PT e os partidos de esquerda iniciem uma campanha para convencer a sociedade de que tão importante quanto eleger o próximo presidente é eleger conjuntamente uma bancada de deputados federais e senadores que deem suporte ao governo.
Tenho dito, com frequência, que se trata de uma missão quase impossível, que só pode ser levada à frente pelo fato de nosso presidente ser um gênio da política, mas obrigado, nessas circunstâncias, a concessões que comprometem, em alguma medida, os objetivos do governo.
Quando me refiro a Lula como gênio da política, estou falando de sua capacidade de articulação, e não de sua liderança, experiência, força eleitoral e apoio internacional.
É preciso ter visão de médio e longo prazo e insistir na reforma política.
O convencimento da sociedade brasileira sobre eleger o próximo presidente juntamente com uma base parlamentar que garanta suas propostas de governo será vital para o país avançar em políticas que garantam o seu crescimento nos próximos anos.
Sem crescimento, torna-se muito difícil desconcentrar a renda que, por sua vez, é fundamental para acionar o motor do crescimento continuado do país. Caso contrário, vamos viver a situação de outros países da América Latina, que têm registrado crescimento continuado nos últimos anos, como Chile e Peru. Só que é um crescimento para cima, que não distribui renda.
Paralelamente à missão de fazer a sociedade entender que um presidente eleito precisa da maioria parlamentar, temos que colocar na agenda permanente de discussão a necessidade de uma reforma política, que inclui a reforma eleitoral.
Os partidos de direita mudaram de qualidade ao se organizarem e assumirem, publicamente, seus programas conservadores e liberais. É urgente, portanto, ao lado da luta pela reforma política, fazer uma renovação de nossos partidos.
Não será tarefa fácil fazer a reforma política, pois quem terá de aprová-la são os mesmos parlamentares que se beneficiam do cenário atual de emendas impositivas que consomem parte relevante da execução orçamentária, antes atribuição quase exclusiva do Executivo. Mas também não é uma missão impossível.
É preciso ter visão de médio e longo prazo e insistir na reforma política. Não é possível o Brasil continuar a ser um dos únicos países com voto unipessoal – o eleitor voto no candidato, não vota no partido ou na lista partidária ou no distrito –, o que encarece demasiadamente as eleições, torna o parlamentar eleito mais sujeito a pressões do poder econômico e enfraquece o sistema partidário.
O voto uninominal é incompatível com o voto de legenda e com a exigência de filiação partidária para ser candidato, próprios do voto em lista partidária. Quando se vota em lista partidária, é feita uma consulta aos filiados que definem quem deve constar da lista.
Não é possível também ter uma composição da Câmara dos Deputados que não é proporcional ao número de eleitores de cada estado (a composição atual estabelece um mínimo de oito representantes por estado e um máximo de 70, independente do tamanho da população de cada estado e do Distrito Federal); isto, em um cenário onde não se exige fidelidade partidária.
Para piorar a legitimidade do nosso sistema político, o Senado, que possui poder revisor, também tem iniciativa legislativa. Isso faz com que o Senado, em muitas situações, tenha mais poder do que a Câmara dos Deputados. Além disso, o Senado tem uma representação popular ainda mais distorcida do que a da Câmara: 25% dos eleitores de 14 estados, por meio dos senadores que elegeram, têm maioria na Casa, já que o número de senadores é igual para cada estado, independentemente da quantidade de eleitores de cada unidade da federação.
Por tudo isso, nossa palavra de ordem tem de ser levantar a bandeira de ampliar a bancada progressista de deputados e senadores, em 2026, para garantir a governabilidade ao futuro presidente. É uma tarefa que só será cumprida pela atuação permanente e combativa da liderança progressista.