O presidente nacional do PSD, Gilberto Kassab (divulgação)

Está aberto em São Paulo desde 2021 e corre sob segredo de Justiça o Inquérito Policial (IP) 1509075-04.2021.8.26.0050. Nele, o ex-prefeito da capital Gilberto Kassab (PSD) é investigado pelo recebimento de uma propina de R$ 1 milhão da empreiteira OAS, em troca da liberação de um crédito de R$ 9,5 milhões para a construtora.

A Polícia Civil do Estado de São Paulo (PC-SP) instaurou o inquérito sigiloso – ao qual o DCM teve acesso – no dia 25 de março de 2021, conforme mostra reprodução de documento abaixo.

Polícia de SP investiga Gilberto Kassab desde março de 2021 (crédito: Polícia Civil de SP)

Na portaria que abre a investigação, a delegada de polícia Isa Lea Abramavicus informa que a PC-SP tomou conhecimento da denúncia por meio de provas obtidas pela força-tarefa da Operação Lava Jato, que, conhecedora dos fatos, decidiu não investigar Gilberto Kassab.

Coube, então, ao Ministério Público de São Paulo (MP-SP) a iniciativa de levar o caso a investigação e eventual julgamento:

“(A Polícia resolve) INSTAURAR Inquérito Policial para a cabal apuração dos fatos, em função de REQUISIÇÃO MINISTERIAL, caracterizados, em tese, como LAVAGEM DE DINHEIRO (artigo 1º da Lei 9613/98), sem prejuízo de caracterização de outras infrações penais subsidiárias, correlatadas, ou mesmo cometidas em concurso.

Constadas informações encaminhados pelo Grupo Especial de Delitos Econômicos – GEDEC do Ministério Público do Estado de são Paulo (NF-GEDEC 38.0004.80/2021), em síntese, que em sede de acordo de delação premiada firmada entre o Ministério Público Federal e JOSÉ ALDEMÁRIO PINHEIRO FILHO – conhecido como LÉO PINHEIRO –, ex-presidente da CONSTRUTORA OAS, revelou ter pago R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) para as despesas de campanha do recém empossado Prefeito de São Paulo GILBERTO KASSAB, recebendo como contrapartida à liberação de crédito existente junto ao Departamento de Águas e Energia Elétrica – DAEE, em favor da construtora.

O expediente ministerial relaciona ainda como suspeitos: AUGUSTO CESÁR FERREIRA E UZEDA e CESAR DE ARAUJOMATA PIRES FILHO, da Construtora OAS e FLÁVIO CASTELLI CHUERY, ex-tesoureiro do PSD – Partido Social Democrático.”

Em um inquérito com oito pedidos de dilação de prazo por parte da polícia, a investigação se arrasta até hoje, enquanto o MP-SP e a Justiça, por sua vez, não conseguem entrar em acordo sobre qual vara da promotoria paulista deve ser a responsável por ofertar denúncia judicial contra Kassab e Léo Pinheiro.

A demora já levou à prescrição dos eventuais crimes eleitorais cometidos, restando apenas os ilícitos previstos no Código Penal, conforme aponta a ordem do MP-SP de instauração de inquérito policial, de 28 de janeiro de 2021.

Requisição do MP-SP à Polícia Civil para abertura de investigação de suposto pagamento de propina a Gilberto Kassab (crédito: MP-SP)

Assim passou o ex-prefeito a ser investigado por crimes que teria cometido em 2006, 15 anos antes da abertura da investigação, e já com parte dos delitos prescritos.

Léo Pinheiro confirmou à Polícia o pagamento de R$ 1 milhão em propina a Kassab

No dia 3 de agosto de 2022 – um ano e meio após a abertura das investigações – Léo Pinheiro prestou depoimento à Polícia Civil.

Léo Pinheiro prestou depoimento à polícia no dia 3 de agosto de 2022 (crédito: Polícia Civil de SP)

Na delegacia, o empresário afirmou que sua empresa pagou R$ 1 milhão a Kassab em 2006. As negociações com o ex-prefeito teriam sido executadas pelo então diretor da OAS César de Araújo Mata Pires Filho (César Filho).

Léo Pinheiro disse também que estranhou que Kassab, então na condição de prefeito da capital, estivesse cobrando propina para liberar um crédito da empreiteira junto ao Departamento de Águas e Energia Elétrica (DAEE), entidade do Estado de São Paulo, então governado por Cláudio Lembo (União).

Trecho de depoimento de Léo Pinheiro à Polícia Civil de SP (crédito: Polícia Civil de SP)

De uma maneira ou de outra, fato é que a demanda da empreiteira foi atendida, e o crédito de R$ 9,5 milhões, liberado. Dois anos depois, ao fim de seu mandato no governo de São Paulo, Cláudio Lembo viria a ser nomeado por Kassab como secretário de Negócios Jurídicos da cidade de São Paulo.

O caminho da impunidade: crimes podem prescrever enquanto MP-SP não sabe quem deve denunciar Kassab

Kassab é acusado pela polícia, após quatro anos de investigação, de ter cometido os crimes de lavagem de dinheiro, corrupção passiva e organização criminosa. Entre as provas apresentadas pelas PC-SP está uma série de reuniões agendas por mensagens de Whatsapp trocadas entre os executivos da OAS e o ex-prefeito.

A denúncia porém, ainda não foi instaurada na Justiça, posto que as autoridades responsáveis não conseguem concordar sobre quem deve fazê-lo.

A última movimentação processual acerca do caso foi publicada no Diário Oficial da Justiça de São Paulo no dia 30 de setembro do ano passado, encaminhando os autos para “o Setor de Competência Originária do MP-SP”, como se vê abaixo.

Última movimentação processual de ação contra Gilberto Kassab; crimes se aproximam da prescrição enquanto Justiça tenta decidir quem deve denunciá-los (crédito: Diário Oficial da Justiça de SP)

Não foi a primeira nem a segunda vez que MP-SP e Justiça alteraram a competência para a denúncia. Em uma das idas e vindas, inclusive, os promotores solicitaram que a competência fosse alterada, só para meses depois solicitar nova mudança, afirmando que tinham se equivocado no primeiro pedido. É isso mesmo.

Veja, abaixo, alguns dos pedidos e decisões conflitantes do MP-SP e do Poder Judiciário sobre quem deve denunciar Gilberto Kassab antes que seus supostos crimes prescrevam. Só de janeiro a junho de 2023, foram três decisões diferentes, um recuo e a admissão de um erro de envio dos autos.

Em janeiro de 2023, a Justiça enviava o caso para o mesmo setor que, em setembro de 2024, o caso devolvido (crédito: TJ-SP)
Em abril de 2023, a Procuradoria-Geral de Justiça declinou da competência de denunciar Gilberto Kassab (crédito: MP-SP)
Em junho de 2023, a Procuradoria-Geral de Justiça volta atrás em pedido que havia feito para alterar a competência e admite ainda que tinha enviado o caso para uma promotoria errada (crédito: MP-SP)

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Last Update: 07/02/2025