Ex-assessora de Lira atuava como braço operacional em esquema de desvio de emendas, diz decisão do STF

A decisão do ministro Flávio Dino que autorizou busca e apreensão na Câmara dos Deputados, nesta sexta 12, descreve de forma detalhada como a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República enxergam o papel de Arthur Lira (PP-AL) no esquema de manipulação de emendas parlamentares. 

Embora o deputado não seja alvo direto das medidas cautelares, seu nome aparece ao longo de toda a decisão (24 vezes) como figura central que teria utilizado a estrutura interna da Câmara para direcionar recursos públicos.

Segundo o documento, a assessora Mariângela Fialek, conhecida como Tuca, seria a responsável por operacionalizar, em nome do então presidente da Câmara, o repasse de emendas segundo critérios definidos pelo próprio Lira. Congressistas ouvidos pela PF relataram que Mariângela atuava como intermediária exclusiva da Presidência, enviando listas de beneficiários, valores e planilhas de distribuição. O deputado José Rocha (União-BA) declarou que todas as remessas recebidas pela Comissão que presidia “vinham da Presidência, enviadas pela Tuca”, inclusive uma remessa de 320 milhões de reais para Alagoas.

A decisão destaca ainda que a assessora continuou exercendo esse controle mesmo após o fim do mandato de Lira como presidente da Câmara, o que indicaria a permanência de uma “estrutura organizada” criada durante sua gestão. Dino ressalta que Tuca ocupava essa função por determinação direta da antiga Presidência, sem aprovação formal dos presidentes das comissões.

Mariangela Fialek, ex-chefe da assessoria especial de Arthur Lira na Câmara dos Deputados. Foto: Reprodução LinkedIn

O documento também reúne depoimentos de congressistas que apontam para pressões políticas associadas ao ex-presidente da Câmara. Glauber Braga (PSOL-RJ) narrou episódios em que Lira teria cobrado a execução de listas que favoreciam Alagoas e até ameaçado substituir integrantes de comissões quando orientações não eram seguidas. Em outro trecho, o ministro do STF registra que o estado de Alagoas e o município de Rio Largo aparecem reiteradamente entre os mais beneficiados, mesmo em comissões sem representantes do estado – o que, segundo Dino, sugere interferência externa.

As anotações feitas à mão ocupam um papel central na decisão e são tratadas como um dos elementos mais contundentes do material apreendido. Segundo Dino, a PF identificou, entre os dados telemáticos de Mariângela Fialek, uma folha manuscrita que registrava o redirecionamento de recursos de emendas parlamentares entre municípios — no caso citado, a transferência de verba originalmente destinada a Nova Russas para Reriutaba, no Ceará, a pedido do deputado Júnior Mano (PSB-CE). Para o ministro, o documento expõe um “desapego incomum à formalidade” e revela que milhões de reais eram realocados a partir de orientações verbais e anotações, comparadas pela própria investigação a uma “conta de padaria”. Essas anotações, afirma a decisão, reforçam o indício de que Mariângela exercia um papel de controle operacional do esquema, com autonomia para ajustar a destinação de recursos conforme diretrizes internas, sem qualquer procedimento oficial ou transparência.

Planilhas e mensagens obtidas com a assessora indicam que ela centralizava reservas de emendas para diversos deputados, e que esses mecanismos eram “rigidamente reportados internamente”. O esquema coincide com o período em que Lira comandava a Câmara.

Apesar de não imputar crimes diretamente ao deputado, a decisão descreve um ambiente no qual a atuação de Mariângela Fialek estaria alinhada a diretrizes que, segundo a investigação, partiam da Presidência da Câmara ocupada por Arthur Lira. Dino afirma que esses elementos permitem avançar sobre a função da assessora e sobre a “estrutura hierárquica” que viabilizava os redirecionamentos.

O ministro autorizou buscas contra Tuca, quebra de sigilos e seu afastamento de qualquer atividade envolvendo emendas. Medidas que, segundo ele, são necessárias para esclarecer a extensão da participação dela e de “outros agentes” ainda sob apuração.

CartaCapital procurou o gabinete do Lira para comentários sobre a operação, mas não obteve retorno até a publicação desta reportagem.

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