Há uma crise sem precedentes na Europa e isso inclui, certamente, o Reino Unido. O imperialismo, versão Trump, concretizou o abandono da Europa. No processo de reuniões destinadas a terminar com a guerra na Ucrânia, a Europa ficou de fora. Numa manobra diplomática espetacular, Trump articulou a Federação Russa para elaborar um acordo sobre o fim da guerra. Há controvérsias se Zelensky foi convidado, mas Trump acusou-o de ladrão dos recursos entregues pelos EUA ao país. Trump também acusa a Ucrânia de ter desencadeado a guerra e até de tê-la prolongado. Zelensky poderia ter iniciado as negociações muito antes e “chegado a um acordo” antes. Ele chamou Zelensky de “ditador sem eleições” e o aconselhou a reagir rapidamente, “caso contrário, ele não terá país”. Zelensky alegou que foi convidado e não compareceu para não reconhecer os acordos que poderiam ser feitos lá. 

Os líderes europeus responderam com uma patética reunião paralela em Paris onde Macron declarou: ”estamos ao lado da Ucrânia e assumiremos total responsabilidade por garantir a paz e a segurança na Europa. Este é o interesse fundamental da França e eu sou o fiador disso”. A maioria dos membros da União Europeia não foi convidada, mas participaram Ursula von der Layen, chefe da Comissão Europeia e Mark Rutte, o secretário-geral da OTAN. 

Neste quadro de contradições Inter imperialistas acirradas, o principal país da União realizou uma eleição antecipada em 23/02/2025 cujos resultados já eram previsíveis há algum tempo. O candidato Friedrich Merz, da União Democrática Cristã (CDU), partido conservador tradicional, se declarou vencedor das eleições legislativas da Alemanha. A legenda teve 28,5% dos votos, seguida pelo partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AfD), liderado por Alice Weidel, que ficou com 20,5% . É o melhor resultado para a extrema direita alemã desde a Segunda Guerra Mundial. O Partido Social-Democrata (SPD), do atual chanceler Olaf Scholz, ficou em terceiro lugar, com 16,5%. Tradicionalmente, o candidato do partido que obtém o maior número de votos se torna o novo chanceler, mas essa definição só ocorrerá após as negociações para a formação de uma coalizão, que devem acontecer nas próximas semanas. O Partido Verde teve 11,8% dos votos e ficou em quarto lugar, também conforme previsto. Em quinto lugar, o bloco de siglas da esquerda obteve 8,7% dos votos. O índice de participação foi de 83%, índice considerado alto para a média da Alemanha.

O resultado acrescenta mais um elemento à crise do regime político alemão, na medida que praticamente afasta o partido até agora no poder do quadro político e dá realce ao avanço do partido nazista Alternativa para a Alemanha (AfD). Há dois partidos de esquerda – o tradicional Die Linke, apoiado principalmente na antiga Alemanha Oriental e o separatista Bündnis Sahra Wagenknecht (BSW), nomeado em homenagem ao seu líder. São dois partidos formalmente de esquerda pois o Die Linke teve lideres defendendo a Guerra na Ucrânia e Israel contra os palestinos, enquanto o BSW, que não pontuou nas pesquisas para esta eleição, é ferrenho defensor de políticas anti- imigrantes. 

O novo governo enfrenta um grande desafio porque a economia da Alemanha, como em toda Europa, está naufragando. A grande potência industrial da Europa, a Alemanha, parou desde a pandemia. O PIB real alemão estagnou nos últimos cinco anos. O investimento empresarial real na Alemanha está severamente deprimido, mais do que na Zona do Euro em geral. O consumo real das famílias na Alemanha foi atingido com força. O governo alemão seguiu servilmente as políticas da aliança ocidental da OTAN e interrompeu o abastecimento de gás e petróleo da Rússia. Como resultado, os custos de energia dispararam para as famílias alemãs.

Os altos preços de energia também afetam as atividades de investimento das empresas e, portanto, sua capacidade de inovar. Mais de um terço das empresas industriais dizem que atualmente conseguem investir menos em processos operacionais essenciais devido aos altos preços de energia.

A lucratividade começou a cair durante a Longa Depressão da década de 2010. A maior queda ocorreu na pandemia e a lucratividade está agora em uma baixa histórica. Pior, a massa de lucros também começou a cair, pois os crescentes custos de produção (energia, transporte, componentes) corroem as receitas. A formação bruta de capital fixo está se contraindo. As falências corporativas alemãs saltaram para 2.000, o maior número em dez anos. Isso é o dobro nos últimos três anos, chegando a 4.215 no final de 2024.Os salários reais na Alemanha permanecem abaixo dos níveis Pré-pandêmicos. Um quarto dos alemães tem rendas insuficientes para sobreviver, de acordo com o Instituto Econômico Alemão em seu “Distribution Report 2024”, citando dados de pesquisas domiciliares. Não é de se admirar que os gastos do consumidor tenham despencado.

É apenas uma questão de meses até que o número de desempregados na Alemanha chegue a 3 milhões pela primeira vez em uma década, já que as empresas vão à falência ou desistem de esperar por uma reviravolta que simplesmente se recusa a chegar. Após uma onda de fechamentos de fábricas em indústrias intensivas em energia, como produtos químicos, em 2022, o principal setor automotivo sucumbiu no ano passado, com a Volkswagen e outras anunciando milhares de cortes de empregos. A taxa de desemprego está agora em seu nível mais alto em mais de quatro anos, apenas um pouco abaixo de onde atingiu o pico durante a pandemia. 

Existe uma mão de obra barata, concentrada na parte oriental da Alemanha, que entra em competição direta com o grande número de refugiados que chegaram nos últimos dois anos. Muitos eleitores na Alemanha oriental acham que seus problemas são devidos à imigração, fornecendo munição para o AfD. Mas enquanto a imigração sai no topo nas questões mais importantes dos eleitores, a situação econômica, energia e inflação também recebem um total de 58%.

O líder eleito da CDU, Friedrich Merz, propõe as políticas neoliberais usuais: reduções nos gastos do governo (cortes de benefícios) e fim da “burocracia” empresarial. O atual governo do SPD promoveu cortes pesados nos gastos sociais para pagar mais compras militares, o “Projeto Ucrânia” e o aumento dos custos de energia. Merz afirma que ainda deve haver espaço para aumentar os gastos com defesa e sugeriu que a Alemanha deveria obter armas nucleares. Ele promete atrair mais investimentos privados para a economia. 

Enquanto isso, os gastos com infraestrutura da Alemanha estão em seu nível mais baixo de todos os tempos. Os trens não funcionam no horário, a cobertura de internet e telefonia móvel é irregular, e estradas e pontes estão em um estado de abandono, com pelo menos 4.000 delas precisando de modernização. Apenas 11% das conexões de banda larga fixa da Alemanha são da variedade de fibra óptica mais rápida, uma das taxas mais baixas entre os países da OCDE.

O fracasso da Alemanha em aumentar o investimento do setor público se deve em parte ao chamado “freio da dívida”, um limite constitucional para os gastos do governo. Acordado em 2009, isso exige que o déficit orçamentário do país não exceda 0,35% do PIB. Essa regra reduziu a capacidade do governo de investir, mas é apoiada por dois em cada três eleitores da CDU/CSU e três quartos dos eleitores da AfD.

A AfD alega que a resposta para o fim da Alemanha é acabar com a imigração, abandonar o euro completamente e reduzir seus pagamentos à UE. As contribuições de € 115 bilhões da UE para a defesa ucraniana são superadas apenas pelos € 119 bilhões dos EUA. O BSW quer o fim do apoio à Ucrânia e o fim das sanções contra a Rússia.

O que tudo isso mostra é que mesmo o capitalismo alemão, a economia capitalista avançada mais bem-sucedida da Europa, não conseguiu escapar das políticas do imperialismo “democrata” dos EUA sobre a Ucrânia e Israel. Isso destruiu a hegemonia do capital alemão na Europa e os padrões de vida de seus cidadãos mais pobres. Não é de se admirar que as vozes do nacionalismo e da reação tenham ganhado força. 

Fuck the Europe Union!

Por que as classes dominantes dos países da UE se tornaram atores entusiastas e fervorosos de uma estratégia político-militar que prejudicou seriamente sua economia, tornando-a comercial e tecnologicamente mais dependente? A resposta só pode ser a de que a guerra foi extremamente lucrativa para um setor das classes dominantes e serviu também de um poderoso instrumento contra a classe trabalhadora impondo uma verdadeira ditadura nos seus países e possibilitou criminalizar qualquer atividade política dessa classe. 

Além disso é evidente que com todos os recursos de inteligência militar e civil à disposição, o Estado capitalista desses países não foi capaz de perceber que uma derrota da Ucrânia seria o resultado mais provável desta guerra. Não percebeu que a ideia de que Putin seria um ditador sanguinário facilmente derrubado pelo povo russo não passava de uma fantasia. Mas, como em outras situações, esqueceram da famosa frase: é a economia estúpido!

Na verdade, a economia russa está crescendo acima da média europeia com sua política de substituição de importações totalmente bem-sucedida. O seu complexo militar, científico e industrial está se desenvolvendo de forma eficaz e a produção de matérias-primas vegetais e minerais tem um dinamismo difícil de negar. Além disso, a Europa hoje continua a depender do gás e do petróleo russos, porque nunca houve alternativa.

A derrota na guerra não foi da Ucrânia, mas do imperialismo norte americano e o subimperialismo europeu. O Pentágono não é mais um organismo que lidera forças armadas imbatíveis do império. É uma burocracia ciosa de seus privilégios e mordomias, mas altamente ineficaz em traçar estratégias militares vitoriosas. A tecnologia militar russa supera enormemente a tecnologia “ocidental” com seus misseis hipersônicos e ultrassônicos. A falência ideológica e moral dos EUA atinge em cheio os militares na frente de batalha, e o resultado é a derrota no Vietnã, no Afeganistão, no Iraque etc. 

O grande êxito norte americano é a articulação de ações encobertas e a realização de revoluções coloridas, capazes em muitos casos de reverter processos políticos “normais” e criar aliados nos próprios movimentos de massas. Tudo, é claro, recheados de muitos milhões de dólares não apenas para comprar novas tecnologias, mas para ganhar corações e mentes em regiões estratégicas. O desmantelamento da USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional) promovido por Trump dá pistas sobre os dispositivos usados pelas agências de inteligência e outras organizações especializadas em desinformação, com ajuda das oposições nacionalistas e pró-UE. Tudo isso é generosamente financiado por ONGs criadas para esse fim.

O ápice deste processo foi o golpe de Estado na Síria, que derrubou um governo eleito com a utilização de bandos terroristas muçulmanos que até então eram perseguidos pela CIA e congêneres. O “ocidente” é agora representado na Síria por uma ditadura bárbara multinacional, da qual fazem parte até lideres  uigures  chineses. Em uma reunião da organização criminosa que governa a Síria foram dissolvidos o Congresso, o partido mais popular no país , Baath, e o próprio governo anterior. É um exemplo de que, na verdade, quem não acredita em nenhum princípio democrático são os países imperialistas “Ocidentais”.

Nesses países a soberania popular perdeu o poder real, a democracia como deliberação/escolha entre diferentes modelos socioeconômicos foi estruturalmente limitada, a diferenciação direita/esquerda foi diluída como definição entre classes opostas e interesses sociais e o que restou é um espaço político-cultural cada vez mais colonizado pela ideologia neoliberal dominante, com a direita tradicional dando lugar à extrema direita e a esquerda, fraca e sem projeto, se posicionando de acordo com ela e nas margens particularistas e identitárias permitidas pelos que estão no poder.

As elites políticas tornaram-se “funcionários do capital”, agentes das grandes empresas financeiras, dos grandes fundos de investimento; dedicadas à velha tarefa de comandar. Especializada na arte de legitimar e fazer passar por boas as políticas que prejudicam as maiorias sociais, os jovens, os idosos, é claro, sempre com a ajuda direta da indústria da manipulação das consciências, nas mãos de uma estreita coalizão de grandes bancos e empresas.

Essas classes dominantes construíram uma União Europeia funcional e conscientemente dependente dos interesses estratégicos americanos. Não são capazes de conceber uma outra Europa soberana, dotada da capacidade de definir as suas prioridades de forma autônoma.

Há alguns dias, o Presidente da Conferência de Segurança de Munique, Christoph Heusgen, queixou-se amargamente e chorou – sim, chorou em público – por causa da mudança de prioridades da nova Administração dos EUA. É mais do que servidão voluntária, é um cooptação clara do poder imperialista.

A manobra tem sido de grandes dimensões: desviar a atenção dos problemas sociais, económicos e culturais criados pelas políticas neoliberais promovidas, precisamente, pela União Europeia para o inimigo externo; transformar as demandas de ordem, justiça, segurança das populações em medo organizado e direcionado, concretizado em um mal absoluto (Rússia) que põe em risco os direitos, as liberdades, e as vidas. O discurso é disciplinar: demoniza o crítico e criminaliza o dissidente. Não há debate possível: ou você está com o bem (o Ocidente) ou está com o mal (a Rússia de Putin). 

Há uma pergunta que não quer calar: os interesses estratégicos da Europa coincidem com os dos Estados Unidos? Para esclarecer ainda mais esta questão, uma segunda pergunta deve ser feita: qual será o papel da Europa na Nova Ordem Internacional Multipolar? Trata-se aqui da Europa, não da União Europeia. A UE é um fracasso, pois tentou construir a Europa a partir dos interesses das grandes potências económicas europeias e subordinada aos EUA. Pensar em construir uma Europa soberana exigiria uma mudança fundamental de orientação, outras prioridades económicas, políticas, sociais e, fundamentalmente, novas classes dirigentes empenhadas na justiça social, na democracia substancial, na paz e na solidariedade internacional.

Para onde vai a esquerda europeia?

Por toda a Europa, os partidos centristas tendem cada vez mais a retratar até mesmo a social-democracia moderada como uma ameaça de “esquerda radical”. A retórica desenfreada sobre o perigo da esquerda tem como objetivo justificar alianças com os outrora malvistos partidos de extrema direita.

Há alguns dias, os Democratas Cristãos (CDU) e a AfD nazista de Weidel votaram juntos no Bundestag alemão para aprovar uma moção pedindo medidas drásticas contra a imigração. Hoje, o chamado cordão sanitário está sendo construído ativamente contra a esquerda.

Esta esquerda não se reduz aos partidos com algum tipo luta social, como tem ocorrido com a demonização da Nova Frente Popular na França por Macron e a exclusão dos sociais-democratas das negociações governamentais na Áustria. Esse silenciamento também se estende aos movimentos sociais, ativistas climáticos, ONGs, sindicatos e, de forma mais geral, a uma sociedade civil capaz de reagir contra a aliança inescrupulosa de neoliberais e populistas de direita.

Os efeitos dessa tendência são particularmente evidentes na Áustria, onde nunca houve um cordão sanitário eficaz contra a extrema direita. Em 2000 já existiu um governo foi liderado pelo conservador Partido Popular (ÖVP), que incluiu o Partido da Liberdade pós-nazista (FPÖ). Mas as posições relativas dessas forças mudaram. Hoje, o líder do FPÖ, Herbert Kickl, está negociando para liderar um governo no qual o partido de extrema direita seria o líder e o tradicional partido de centro-direita ÖVP o parceiro menor.

O ÖVP já havia rejeitado esse cenário, iniciando negociações com o Partido Social Democrata (SPÖ) antes de interrompê-las abruptamente no início deste ano. O ex-líder do ÖVP e chanceler Karl Nehammer explicou o ponto de ruptura da seguinte forma: “Em algum momento, o líder social-democrata Andreas Babler mudou para a retórica da luta de classes e da tradicional social-democracia.” Assim, até mesmo a centro-esquerda dominante é mais demonizada que os pós-nazistas. A chamada centro-direita agora busca um acordo com a extrema direita em nome de uma agenda pró-negócios sem elementos disruptivos, e é assim que as propostas do SPÖ para justiça fiscal e social são apresentadas.

Quando as negociações com os sociais-democratas ainda estavam em andamento, Harald Mahrer, presidente da Câmara Federal de Economia da Áustria e membro da equipe de negociação do ÖVP, admitiu que “algumas pessoas estão flertando com o programa econômico do FPÖ porque ele foi parcialmente copiado do nosso e do da Federação das Indústrias Austríacas”, referindo-se ao principal grupo empresarial do país. A retirada da Nova Áustria e do Fórum Liberal (NEOS) dessas primeiras negociações – o gatilho, se não a causa absoluta de seu fracasso – e a ruptura definitiva anunciada pelo ÖVP imediatamente depois, foram motivadas pelos interesses e pressões do mundo empresarial. Ou seja, a burguesia austríaca e provavelmente toda burguesia europeia quer a extrema direita no governo. 

“O que importa para nós é que o orçamento seja reformado apenas no lado dos gastos públicos”, disse Georg Knill, presidente da Federação das Indústrias Austríacas. Junto com a extrema direita, o ÖVP está rapidamente adotando essa perspectiva. “Com os sociais-democratas, teria sido impossível”, concluiu Knill. Em nome da defesa dos mais ricos, o ÖVP está abraçando o que sabe ser um partido pró-AfD, pró-Viktor Orban com raízes nazistas — ele próprio usando esse partido como uma ameaça sempre que isso convém aos seus próprios interesses — e agora está se abrindo para a ideia de ter seu líder, Kickl, como chanceler.

Uma tendência semelhante também é evidente há algum tempo na França. Forças neoliberais como o partido Renascença de Emmanuel Macron estão dispostas a chegar a um acordo com a extrema direita enquanto tentam demonizar e excluir a esquerda do poder. Aqui, a dinâmica política se combina com uma mudança perturbadora no discurso público, tornando a tendência ainda mais alarmante.

Como começou a demonização

Apesar da Nova Frente Popular ter sido a força com maior votação, ela não existe para Emmanuel Macron. Ele não hesitou em confiar o governo a forças ultraminoritárias como Michel Barnier, do Les Républicains, e chegou a conceber governos dependentes do apoio externo de Marine Le Pen. Em suma, Macron fez todo o possível para excluir a esquerda de qualquer possibilidade de chegar ao poder. Ele até negou que a Nova Frente Popular tenha ficado em primeiro lugar nas eleições. É uma operação de “desmantelamento” da esquerda.

O termo “extrema esquerda” se consolidou no discurso público, onde tem as mesmas (ou até piores) conotações negativas que a extrema direita, que está se tornando normalizada. No verão de 2022, o Rassemblement National de Le Pen conseguiu eleger dois membros como vice-presidentes da Assembleia Nacional, com o apoio dos deputados de Macron.

Após as eleições de 2024, a estratégia de demonização de Macron teve como objetivo principal sabotar a união da esquerda, tentando excluir a França Insubmissa do que o presidente francês interpreta como a “frente republicana”. A dinâmica política de exclusão do poder está intimamente relacionada a esse ataque semântico. 

Uma tendência europeia

A projeção do cordão sanitário contra a esquerda, somada ao colapso da barreira de proteção contra a extrema direita, corresponde a uma tendência europeia. Isto também pode ser observado ao nível das próprias instituições da UE. “Os liberais também aplicarão um cordão sanitário contra a extrema esquerda”, disse a ex-primeira-ministra belga e atual vice-presidente do Parlamento Europeu, Sophie Wilmès, em uma entrevista recente. A tendência em si não é nova, e o primeiro a lançá-la foi o principal grupo democrata-cristão, o Partido Popular Europeu (PPE).

Se os socialistas de centro-esquerda esperavam escapar dos ataques do PPE, agora eles podem ver pela estratégia agressiva de Weber que deixar a direita dividir as forças progressistas acaba tornando todos mais vulneráveis, tanto em Bruxelas quanto em Paris. À aliança entre as forças neoliberais e a extrema direita também traz consigo uma tendência cada vez mais acentuada de reprimir a dissidência. Nesse sentido, o cordão sanitário se projeta não apenas contra partidos de esquerda, mas também contra sindicatos, ONGs, movimentos ambientalistas e a sociedade civil em geral quando essas forças tentam expressar e organizar a dissidência.

Vale lembrar que o ex-ministro do Interior francês, Gérald Darmanin, chegou a tentar criminalizar a ONG de direitos humanos Ligue des droits de l’homme, bem como associações ambientais. E é impossível não mencionar a dura repressão aos protestos sociais, ambientais e contra a reforma da previdência na França. A criminalização dos movimentos ambientalistas é uma tendência que também preocupa toda a Europa. Nos últimos anos, vários governos (Itália, Hungria, Reino Unido, França) tentaram repetidamente limitar o direito dos trabalhadores à greve.

Governos que toleram desvios antiliberais, como vemos na Itália com Giorgia Meloni e como vimos na Hungria com Orbán, também tendem a reprimir a dissidência. Combinadas, a remoção de barreiras contra a extrema direita e a imposição de uma lógica excludente contra a esquerda estão se amplificando mutuamente, com resultados devastadores. 

É preciso construir uma alternativa genuinamente revolucionária!

Nesta situação, os líderes da esquerda reformista e parlamentar e os sindicatos oferecem à classe trabalhadora apenas desculpas e derrotas. Os exemplos na Alemanha são muito claros. Os acordos salariais são miseráveis como o da Volkswagen (VW), em que se aceitam cortes e encerramentos de fábricas. O problema, portanto, não é apenas a ameaça da extrema-direita, que é muito grave, mas também a crise capitalista e a constante deterioração das condições de vida e de trabalho da classe trabalhadora. Tudo isto exige uma resposta consequente da esquerda, uma resposta internacionalista, antifascista e socialista, que confronte a reação e os capitalistas.

Perante este vazio, é necessário reconstruir, a partir de baixo, uma alternativa revolucionária para a classe trabalhadora. Toda esta situação está também despertando uma crescente consciência antifascista e indignação entre a juventude e os sectores militantes da classe trabalhadora. As mobilizações contra o congresso da AfD ou os protestos ou mesmo bloqueios contra eventos da AfD nas grandes cidades, todos eles duramente reprimidos pela polícia sob o governo do SPD, são um exemplo. Um movimento que tem de se construir e crescer a partir de baixo, através da ação direta, de ações de classe e greves, e levantando a bandeira do anticapitalismo, do internacionalismo e do socialismo.

Não há saída sob o capitalismo, mas a Europa tem enormes recursos, um setor industrial muito poderoso, setores tecnológicos muito avançados, mas que estão nas mãos dos grandes monopólios, dos cartéis financeiros e dos bancos! É preciso expropriar toda esta riqueza e colocá-la nas mãos da classe trabalhadora, europeia e imigrante, e utilizá-la para construir um mundo melhor, um mundo socialista. 

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Last Update: 25/02/2025