A Europa está em declínio e pode se tornar irrelevante em poucos anos. A preocupação é da própria Comissão Europeia, órgão executivo da União Europeia (UE).
Mario Draghi, ex-presidente do Banco Central europeu e ex-primeiro-ministro da Itália, foi convocado em 2023 pela Comissão Europeia para elaborar um relatório estratégico com recomendações de como manter a Europa relevante.
O documento, com mais de 400 páginas, foi divulgado em setembro do ano passado. Segundo o diagnóstico, a Europa precisa de um projeto de investimentos ainda mais ambicioso do que o Plano Marshall, que reergueu o continente no final da Segunda Guerra Mundial.
Draghi destacou que é necessário investir 800 bilhões de euros (R$ 5 trilhões) por ano — uma quantia que representa aproximadamente 5% do Produto Interno Bruto (PIB) do bloco europeu — para que o continente consiga manter sua economia dinâmica e alinhada com suas metas de sustentabilidade. Durante o Plano Marshall, foram gastos entre 1% e 2% do PIB europeu.
Mais da metade desse valor seria apenas para transação energética. Ao contrário do Plano Marshall, que foi financiado pelos Estados Unidos, esse dinheiro todo teria de partir dos próprios governos e empresas europeias.
A ação é necessária, segundo Draghi, devido aos “desafios existenciais” que a Europa enfrenta. “[A escolha que temos] é ‘vamos agir’ ou encaramos a lenta agonia do declínio”, afirmou.
O documento aponta que é preciso:
- Acelerar a inovação tecnológica para reduzir o atraso em relação aos Estados Unidos e à China;
- Aproveitar oportunidades do processo global de descarbonização em andamento
- Fortalecer cadeias de suprimentos, reduzindo a dependência geopolítica de países externos.
Desde sua publicação, o relatório tem gerado intensos debates entre políticos e líderes europeus. Especialistas afirmaram à BBC News Brasil que uma das questões centrais nesse debate são os rumos políticos da Alemanha.
A Alemanha, maior economia do bloco europeu, vem tendo dificuldades para se recuperar da crise provocada durante a pandemia de Covid-19. Além disso, o país enfrenta uma crise política que derrubou a coalizão do governo do chanceler Olaf Scholz e desencadeou novas eleições, marcadas para o próximo mês.
Em 2000, os países da zona do euro (nações que integram a União Europeia) representavam quase 20% da economia mundial, enquanto a China detinha menos de 4%.
Em 2023, a participação chinesa na economia mundial saltou para 17%, enquanto a dos países da zona do euro caiu para menos de 15%.
Além disso, entre 2000 e 2023, a economia da zona do euro cresceu em média 1,27% ao ano, bem abaixo do crescimento global, de 2,97%. Em comparação, os Estados Unidos cresceram 2,17% no mesmo período, enquanto a China registrou 8,24% e o Brasil, 2,29%.
Em 2023, a economia global cresceu 10%. Ou seja, em quatro anos, a economia mundial se recuperou da queda registrada e já está 10% maior do que antes da pandemia. Já entre os países da zona do euro, esse índice é de 3%.
A China e os EUA viram suas economias crescerem 9% e 20% entre o fim de 2019 e o fim de 2023. A economia brasileira, por sua vez, já está 7% maior do que antes da pandemia.
“Eu me lembro de 30 anos atrás, que a Europa era considerada o futuro para os jovens. Havia o programa, Erasmus, para jovens descobrirem outras pessoas, culturas e países. Nesse tempo, os jovens ainda viviam um entusiasmo com a Europa, após a queda da União Soviética”, disse em entrevista à BBC News Brasil Emmanuel Sales, diretor do centro de pesquisas Fondation Robert Schuman, dedicado a estudar a União Europeia.
“Mas acho que hoje, a Europa, é sinônimo de regulamentação, altas taxas de juros, restrições e baixo crescimento. E isso é um problema. Os jovens estão decepcionados”.