Em nova rodada de ataques a soberania do Brasil, o governo dos Estados Unidos anunciou nesta quarta-feira (13) a revogação de vistos e a imposição de restrições de entrada a dois integrantes do Executivo brasileiro e ex-dirigentes da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS) por terem atuado na implementação do programa Mais Médicos. 

O alvo da medida são Mozart Júlio Tabosa Sales, secretário de Atenção Especializada à Saúde, e Alberto Kleiman, coordenador-geral para a COP30 na Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA). 

A decisão atinge também familiares dos sancionados e impede a entrada deles em território norte-americano.

A iniciativa integra a escalada de ataques de Donald Trump contra o Brasil, articulada por figuras da extrema direita brasileira como o deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) e o ex-apresentador Paulo Figueiredo. 

Foi o secretário de Estado Marco Rubio quem tornou pública a medida, afirmando que “o programa Mais Médicos foi uma fraude diplomática inconcebível de missões médicas estrangeiras” e acusando Brasil e OPAS de agirem como intermediários para viabilizar o envio de médicos cubanos, driblando sanções impostas a Havana.

Segundo a declaração oficial, “esses funcionários foram responsáveis por, ou envolvidos em, facilitar o esquema coercitivo de exportação de trabalho do regime cubano, que explora trabalhadores médicos cubanos por meio de trabalho forçado” e “esse esquema enriquece o corrupto regime cubano e priva o povo cubano de cuidados médicos essenciais”. 

As declarações se inserem em uma longa série de ataques da extrema direita norte-americana a Cuba. Não é de hoje que Marco Rubio, senador de origem cubana e atual secretário de Estado, usa o aparato diplomático de Washington para ampliar sanções e pressionar politicamente a Ilha. 

A narrativa que ele repete contra o Mais Médicos ecoa campanhas anteriores de isolamento e criminalização de programas de cooperação internacional mantidos por Havana, ignorando seu histórico de envio de profissionais de saúde para dezenas de países.

Ao incluir o Brasil nesse alvo, a gestão Trump reforça o alinhamento com uma agenda hostil à integração latino-americana e tenta atingir políticas públicas que simbolizam a presença do Estado em áreas vulneráveis. 

O ataque ao Mais Médicos, nesse contexto, não se limita a uma disputa diplomática, mas integra uma estratégia de enfraquecimento de projetos que contrariam a lógica privatista defendida por setores conservadores nos Estados Unidos.

Mais Médicos: política pública alvo da retaliação norte-americana

Criado em 2013 no governo Dilma Rousseff, o Mais Médicos nasceu para suprir a carência de profissionais de saúde em áreas remotas, comunidades indígenas e municípios do interior onde médicos brasileiros não costumavam trabalhar. 

Por meio de um convênio com a OPAS, o programa trouxe ao país milhares de médicos cubanos até 2018, quando a parceria foi encerrada pelo governo de Jair Bolsonaro após ataques à cooperação com Cuba.

No auge, em 2016, havia 18 mil médicos atendendo quase 63 milhões de pessoas em quatro mil municípios. 

Retomado no terceiro governo Lula, o programa voltou a ampliar a cobertura, mas sem a participação de cubanos. Segundo Alexandre Padilha, “nesse governo atual, em dois anos, dobramos a quantidade de médicos no Mais Médicos” e “temos muito orgulho de todo esse legado que leva atendimento médico para milhões de brasileiros que antes não tinham acesso à saúde”.

Além do impacto social, o programa tornou-se um símbolo da cooperação Sul-Sul e da capacidade do Brasil de implementar políticas universais de saúde. 

Sua interrupção no governo Bolsonaro e a retirada dos médicos cubanos em 2018 tiveram forte repercussão internacional e interna, com prejuízos no atendimento de comunidades vulneráveis. A nova ofensiva de Trump é vista no Planalto como um ataque não apenas a um programa, mas à concepção de saúde como direito de todos.

Reações no Brasil reforçam defesa da soberania e do SUS

O ministro da Saúde, Alexandre Padilha, reagiu afirmando que “o Mais Médicos, assim como o PIX, sobreviverá a ataques injustificáveis de quem quer que seja” e que o programa “salva vidas e é aprovado por quem mais importa: a população brasileira”. 

Ele declarou que “não nos curvaremos a quem persegue as vacinas, os pesquisadores, a ciência e, agora, duas das pessoas fundamentais para o Mais Médicos na minha primeira gestão como ministro”.

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) afirmou que o Mais Médicos “salvou vidas, levou assistência a quem nunca tinha visto um médico e fortaleceu o maior sistema de saúde pública do mundo: o SUS”, defendendo que ataques estrangeiros e da extrema direita “não desmontarão conquistas que pertencem ao Brasil”.

O senador Humberto Costa (PT-PE) disse que os EUA atacam a própria ideia de saúde pública gratuita e universal. Já o deputado Guilherme Boulos (PSOL-SP) afirmou que “a ousadia do complô bolsonarista contra o Brasil não tem limites” e que Trump está punindo servidores que ajudaram milhões de brasileiros a ter atendimento médico. 

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante evento no Planalto, criticou a postura de Trump em medidas anteriores contra autoridades brasileiras, chamando a cassação de vistos de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) de “mau exemplo para a humanidade” e comportamento “inaceitável e totalmente inexplicável”.

Sanções se somam a ataques anteriores de Trump ao Brasil

A medida contra Mozart Sales e Alberto Kleiman é mais um capítulo na ofensiva iniciada em julho, quando os EUA cancelaram vistos de oito ministros do Supremo Tribunal Federal, impuseram sanção financeira contra Alexandre de Moraes com base na Lei Magnitsky e aplicaram tarifa de 50% sobre produtos brasileiros. 

Essas ações foram justificadas por Washington como resposta a suposta censura a empresas e cidadãos americanos, além de perseguição a Jair Bolsonaro.

As decisões foram influenciadas por uma campanha organizada por Eduardo Bolsonaro e Paulo Figueiredo desde a posse de Trump. O Departamento de Estado já acusou o governo brasileiro de reprimir “o debate democrático” e restringir a expressão de apoiadores de Bolsonaro, enquanto relatório anual enviado ao Congresso dos EUA afirma que a situação dos direitos humanos no Brasil se deteriorou em 2024.

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Last Update: 14/08/2025