A crise entre Estados Unidos e Venezuela atingiu um novo patamar nesta sexta-feira (5), após a ordem do presidente Donald Trump para deslocar dez caças F-35 para Porto Rico, território norte-americano no Caribe. 

A movimentação, confirmada pelo Pentágono e pelo Departamento de Estado, ocorre sob a justificativa de combate ao narcotráfico, mas reforça temores de confronto direto com Caracas.

O envio das aeronaves representa uma escalada qualitativa na presença militar dos EUA na região, que já contava com sete navios de guerra e 4.500 fuzileiros. Trata-se de jatos de quinta geração, especializados em ataques terrestres, cuja utilização sugere a possibilidade de operações ofensivas contra alvos em solo venezuelano. 

Até aqui, a atuação norte-americana contra o tráfico de drogas se dava em cooperação com forças nacionais, não de forma isolada e com poder bélico desse porte.

Na terça-feira (2), Trump anunciou a destruição de uma embarcação que, segundo Washington, transportava drogas da Venezuela para os EUA. 

O ataque deixou 11 mortos e gerou questionamentos sobre sua legalidade, já que não houve abordagem policial antes da explosão do barco. O governo Maduro contestou o episódio e classificou como falsa a gravação divulgada pela Casa Branca.

O ambiente tornou-se ainda mais instável na noite de quinta-feira (4), quando dois caças F-16 venezuelanos sobrevoaram o destróier americano Jason Dunham, estacionado próximo ao litoral.

O gesto foi interpretado como provocação, mas também revelou a saturação militar na região, com alto risco de incidentes capazes de deflagrar um conflito aberto.

Venezuela denuncia pretexto e exibe dados antidrogas

Apesar da retórica de Trump, que classifica Nicolás Maduro como “chefão de um narco-Estado”, o governo venezuelano tem utilizado números oficiais e verificáveis para rebater a acusação. 

O ministro da Defesa, Vladimir Padrino López, afirma que o país neutralizou 402 aeronaves vinculadas ao tráfico de drogas em operações militares realizadas em zonas de fronteira.

Segundo dados do Ministério Público venezuelano, entre 2017 e 2025 foram processadas 131.893 pessoas por delitos relacionados a drogas. Desse total, 61.690 foram denunciadas, 49.947 acusadas e 20.256 condenadas. 

No mesmo período, foram apreendidos mais de 365 mil quilos de entorpecentes, incluindo 280 mil quilos de cocaína, 83 mil de maconha e 793 de heroína. “A Venezuela não foi nem será rota para o tráfico ilícito de drogas”, declarou Padrino.

O presidente Nicolás Maduro afirmou que apenas 5% da droga produzida na Colômbia tenta cruzar o território venezuelano, e que 70% desse volume é interceptado pelas autoridades. 

“Estou seguro de que vamos chegar a 100%, livres da passagem de qualquer tipo de drogas”, disse. 

Relatórios recentes da ONU corroboram a versão oficial, ao apontar que a Venezuela está livre de cultivos ilícitos há 15 anos.

O procurador-geral Tarek William Saab acrescentou que até a DEA, agência antidrogas norte-americana, reconhece que o país não é produtor, mas apenas rota marginal de uma fração do narcotráfico colombiano. 

Para Caracas, a insistência dos EUA em acusar a Venezuela de ser um “narco-Estado” não passa de pretexto político para justificar a escalada militar no Caribe.

Conflito sem declaração de guerra e pressões internas nos EUA

A decisão de Trump tem gerado debates sobre a legalidade das ações militares. Ao atacar uma embarcação sem autorização do Congresso, os EUA realizaram um ato de guerra contra um país com o qual não há conflito declarado. 

Organizações como a Human Rights Watch e lideranças democratas já indicaram que irão questionar a Casa Branca.

Trump sustenta que o barco afundado pertencia ao cartel Tren de Aragua, classificado como organização terrorista por Washington, e que, portanto, a ação teria amparo em precedentes da “guerra ao terror”. 

O secretário de Defesa, Pete Hegseth, já anunciou inclusive que o Departamento de Defesa será rebatizado como Departamento da Guerra, reforçando a retórica de confronto.

O republicano afirmou ainda que o objetivo central é Maduro, a quem chamou de “chefão de um narco-Estado”. A linguagem de ataque direto ao presidente venezuelano acentua os temores de que a escalada vá além da narrativa antidrogas e se converta em uma tentativa de mudança de regime.

A crise tem impactos diretos na América Latina. O México já declarou que não aceitará ataques norte-americanos em seu território. 

Em agosto, a CELAC aprovou uma resolução exigindo a retirada das tropas dos EUA do Caribe e reafirmando a região como Zona de Paz. Cuba e o PCdoB, no Brasil, também manifestaram solidariedade à Venezuela e condenaram a ingerência de Washington.

Analistas militares alertam que o desequilíbrio de forças é evidente. Os EUA dispõem de uma frota mais poderosa do que todo o arsenal venezuelano, mas Caracas aposta em estratégias assimétricas, como o uso de mísseis antinavio de tecnologia chinesa e iraniana. 

O risco maior está em um disparo acidental ou ação mal calculada, capaz de transformar a atual escalada em confronto aberto.

O histórico recente indica que essa não é a primeira tentativa de Trump de pressionar o governo bolivariano. Em seu primeiro mandato, ele chegou a ensaiar uma operação militar com apoio dos então governos do Brasil e da Colômbia, mas sem êxito. 

Mais tarde, tentou apoiar a oposição venezuelana, também sem sucesso. Agora, retorna com uma estratégia de força que ameaça desestabilizar todo o Caribe.

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Last Update: 05/09/2025