A edição de 2024 do relatório anual de direitos humanos do Departamento de Estado dos Estados Unidos, publicada nesta terça-feira (12), marca uma inflexão em relação aos anos Joe Biden. O texto, produzido sob a gestão de Donald Trump, aponta que a “situação dos direitos humanos no Brasil piorou” e, ao mesmo tempo, adota linguagem mais branda para aliados de Washington, como Israel.

A mudança de tom reacende a tensão entre Brasília e Washington e levanta questionamentos sobre interferência política em um documento que costuma servir de referência global. Fontes internas relataram à Reuters que a publicação foi adiada enquanto indicados por Trump “alteraram drasticamente” um rascunho para espelhar prioridades do novo governo.

O contraste é explícito. Em relação a Israel, por exemplo, a seção deste ano ficou mais curta e não menciona a dimensão da crise humanitária decorrente das operações do Exército Israelense ou o número de mortos na Faixa de Gaza: cerca de 61 mil, segundo o Ministério da Saúde de Gaza, número considerado confiável pela Organização das Nações Unidas (ONU).

Vale citar ainda o caso de El Salvador, também aliado do governo Trump. “Não houve relatos confiáveis de abusos significativos de direitos humanos”, afirma a versão de 2024 sobre o país, em nítido contraste com 2023, que listava “questões significativas de direitos humanos”.

Brasil no alvo: expressão, internet e tensão institucional

Para o Brasil, o documento crava deterioração com foco em liberdade de expressão, decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e medidas sobre plataformas digitais. O texto sustenta que tribunais teriam adotado ações “amplas e desproporcionais”, citando bloqueio do X (antigo Twitter) e ordens sigilosas.

A situação dos direitos humanos no Brasil piorou ao longo do ano. Os tribunais tomaram medidas amplas e desproporcionais para minar a liberdade de expressão e a liberdade na internet, bloqueando o acesso de milhões de usuários a informações”, diz trecho do documento.

O relatório também critica diretamente a atuação do ministro do STF, Alexandre de Moraes: “Registros judiciais revelam que o ministro Alexandre de Moraes ordenou pessoalmente a suspensão de mais de 100 perfis de usuários na plataforma de mídia social X (antigo Twitter), suprimindo de forma desproporcional a fala de defensores do ex-presidente Jair Bolsonaro“.

Letalidade policial e “polícia de Tarcísio”

A seção sobre execuções extrajudiciais realça a letalidade em operações de segurança pública em Estados governados por aliados do bolsonarismo, com destaque para São Paulo, de Tarcísio de Freitas (Republicanos).

A Operação Escudo, deflagrada na Baixada Santista após a morte de um policial, é citada como exemplo de assassinatos arbitrários ou ilegais atribuídos à ação policial. Estudos acadêmicos e da Defensoria Pública apontaram abuso de força e viés de vingança contra jovens negros e pobres.

O texto também registra suspeita de milícias formadas por policiais em Roraima e a investigação de mais de 100 policiais militares.

Tarifaço, sanções e o efeito cascata na relação bilateral

O relatório chega em terreno já minado. Em julho, Trump impôs tarifas de 50% a diversos produtos brasileiros e, em 30 de julho, sancionou Moraes sob a Lei Magnitsky. Em reação, o governo brasileiro classificou as medidas como “interferência indevida”.

Nos anos anteriores, sob Joe Biden, o relatório classificou as eleições brasileiras como justas e livres, registrando apenas pontos de atenção. A guinada de 2024 sinaliza uma redefinição de aliados e antagonistas na narrativa oficial de Washington.

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Last Update: 13/08/2025