Et veritas vos liberabit

por Felipe Bueno

Do alto de séculos de lugar de fala, o novo papa se reuniu com representantes da imprensa e, segundo os mesmos, pediu o fim da guerra de palavras e de imagens e defendeu o fim da polarização e a importância do jornalismo para a promoção da paz e a divulgação da “verdade”.

Não estando lá como testemunhas oculares da história, nunca poderemos saber quais foram exatamente as reações – especialmente as internas – de quem ouviu esse blend de ingenuidade – especialmente de quem absorve e reproduz, superficialidade e, no limite, absoluta falta de sentido.

Porque se os tempos hoje são de pós-verdade, significando etimologicamente que essa foi ultrapassada e caiu em descrédito/desuso, sem erro podemos enumerar a instituição que o papa representa como uma das artífices das batalhas de palavras e de imagens que têm consumido a humanidade desde sempre.

Em palavras e hoje, a tal guerra de narrativas.

E isso podemos observar na história da Igreja Católica inclusive internamente, desde as mais profundas discussões dogmáticas até as mais prosaicas desavenças terrenas.

Para piorar a história, o novo pontífice, líder supremo de sua instituição, recorreu a outra que anda com baixíssimos índices de confiabilidade, muito por (de)méritos próprios.

Porque faz bastante tempo, aqui e lá fora – quem começou isso, provavelmente nunca saberemos – que o jornalismo deixou de lado sua vocação essencial, a pergunta, e sua consequência natural, a reportagem, para inundar o mundo com sua auto-indulgência e suas pretensões civilizatórias, que até determinado momento estiveram domesticadas nas páginas e colunas de opinião, mas há décadas transbordaram dos seus cercadinhos para contaminar não apenas as mensagens mas também os procedimentos segundo os quais elas são elaboradas.

De certo modo, Sócrates, com a sua mania de ignorância e de fazer perguntas, deve ser considerado o primeiro jornalista. Acusado de corrupção de mentes e desrespeito às divindades, virou pó.

Poucos entenderam o recado.

Levemente menos antiga que Sócrates era a Acta Diurna, considerada por historiadores como a mãe de todos os jornais. Era, digamos, o Diário Oficial do Império Romano, feito em pedra ou metal, num tempo em que literalmente poderia se dizer que as palavras tinham peso – mas certamente menos que hoje.

De volta a nosso modesto mundo moderno, os atos de perguntar e reportar transformaram-se em afirmar, acusar, julgar e influenciar.

Seriam duas religiões conversando uma com a outra um eterno diálogo de surdos?

Felipe Bueno é jornalista desde 1995 com experiência em rádio, TV, jornal, agência de notícias, digital e podcast. Tem graduação em Jornalismo e História, com especializações em Política Contemporânea, Ética na Administração Pública, Introdução ao Orçamento Público, LAI, Marketing Digital, Relações Internacionais e História da Arte.

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Last Update: 12/05/2025